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Ação do Araguaia demora e 50% dos autores morreram
Processo corre há 27 anos e foi aberto por 22 parentes de militantes desaparecidos
Juíza decidiu em 2003 que
eles podem acessar dados
do conflito e já não cabem
recursos; AGU agora diz que
quer fazer cumprir ordem
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Vinte e sete anos depois de
aberta, a ação judicial que pretende obrigar a União a apresentar documentos sobre o
conflito e apontar a localização
das sepulturas dos militantes
de esquerda mortos na guerrilha do Araguaia (1972-1975)
permanece insolúvel. Nesse espaço de tempo, sem nenhuma
resposta oficial do governo,
morreu a metade dos familiares que iniciaram o processo.
Quando a ação foi proposta,
em 19 de fevereiro de 1982, o
presidente era o general João
Figueiredo (1918-1999), a moeda, o cruzeiro e a novela que fazia sucesso, "Elas por Elas".
A ação foi proposta por 22
pessoas, cujos nomes constam
até hoje dos registros judiciais
por onde a ação passeou -Justiça Federal de primeira instância no Distrito Federal, Tribunal Regional Federal e Supremo Tribunal Federal.
Segundo levantamento feito
pela Folha a partir de dados da
comissão de familiares de mortos e desaparecidos, dos 22 autores, 11 morreram. Eram mães
e pais de parte dos militantes
do Araguaia -foco guerrilheiro
criado pelo PC do B com a intenção de derrubar a ditadura
militar e implantar um governo comunista no país. Segundo
o livro "A Ditadura Escancarada", do jornalista Elio Gaspari,
morreram no conflito 59 guerrilheiros, 16 soldados do Exército e dez moradores da região.
A maioria dos pais morreu
antes mesmo de comemorar a
sentença de primeira instância
de 2003, proferida pela juíza
Solange Salgado, que reconheceu o direito de eles terem
acesso aos documentos. A vitória, porém, teve gosto passageiro, já que a União recorreu e o
caso foi parar no STJ (Superior
Tribunal de Justiça) e, de lá, no
STF (Supremo Tribunal Federal). Pelo menos cinco anos de
demora na tramitação do processo se devem a recursos protocolados pela AGU (Advocacia
Geral da União) já no governo
de Lula. No início deste ano, a
ação transitou em julgado, não
cabendo mais recurso.
Sem informação
Seis anos antes da primeira
decisão da juíza, em 1997, morreu o bancário Edwin Costa,
aos 87, de enfisema pulmonar.
Era pai de Walkíria Costa, estudante de Patos de Minas (MG),
dada como desaparecida no
Araguaia aos 26 anos.
Sua irmã, Waléria, aguarda o
desfecho da ação, mas disse não
ter recebido informações suficientes do advogado do caso, o
ex-deputado federal Luiz
Eduardo Greenhalgh (PT-SP),
reclamação que surgiu nas conversas com outros familiares.
Waléria, 55, disse não ter
muitas esperanças de ver o governo revelar seus arquivos.
"Acho que, enquanto estivermos vivos, eles vão ocultar a
verdade. Estão nos esperando
morrer primeiro", disse ela.
Os autores originais da ação
demonstram cansaço com a demora. "Não estamos sendo informados por nenhum órgão
competente", disse a costureira
aposentada Maria Leonor Pereira Marques, 80, mãe do militante do PC do B Paulo Roberto
Pereira Marques. Funcionário
do Banco de Minas Gerais,
Marques desapareceu aos 24
anos no dia de Natal de 1973,
após um ataque do Exército a
um acampamento da guerrilha.
Nos anos 90, Maria Leonor
propôs uma ação de indenização e recebeu apenas R$ 98 mil,
em uma única parcela, pelo desaparecimento do filho.
Por e-mail, o advogado Greenhalgh negou à Folha que as
famílias não estejam recebendo dados sobre a ação judicial.
Citou como exemplo a última
petição a que deu entrada, em
11 de julho, e que teria sido copiada para três dos familiares.
"Dessa iniciativa demos ciência
aos familiares. (...) Assim, não é
verdade que os parentes não
têm sido suficientemente informados do processo e sobre
isso não há que se fazer intrigas", afirmou o advogado.
A AGU informou na semana
passada que quer fazer cumprir a ordem da juíza. Peticionou na ação, contudo, para obter uma nova citação e só então
promover a abertura dos arquivos. O procurador da República
Rômulo Moreira Conrado disse no processo que a União já
teve tempo para organizar os
documentos. Pediu que os dados sejam entregues em 15
dias, sob pena de multa diária
de R$ 10 mil. O juiz substituto
da 1ª Vara Federal não havia
decidido sobre o pedido do procurador até sexta. O processo
está "concluso para despacho"
do juiz titular desde 24 de novembro de 2008.
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