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Há exagero no uso da política, diz analista
Suposto favorecimento de entidades no Ministério do Trabalho constitui clientelismo, aponta estudioso
FERNANDO BARROS DE MELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
O cientista político Leôncio
Martins Rodrigues, um dos
maiores especialistas em sindicalismo no país, diz que a acusação de que o ministro Carlos
Lupi (Trabalho) teria beneficiado entidades ligadas ao PDT,
seu partido, "enquadra-se na
prática clientelística de usar a
administração pública para beneficiar parentes e seguidores".
Para Leôncio, o método de
preencher cargos com pessoas
do partido "não é uma singularidade do PDT e do Brasil".
FOLHA - Que análise o sr. faz do caso do ministro Carlos Lupi, que acumulou as funções de presidente do
PDT e ministro do Trabalho? Houve
também acusações de favorecimento de entidades ligadas ao PDT.
LEÔNCIO MARTINS RODRIGUES - Enquadra-se na prática clientelística brasileira de utilizar a administração pública para beneficiar parentes e seguidores. A
conseqüência é um enfraquecimento da representação política e da democracia representativa. Essa prática é tanto maior
quanto os partidos carecem de
um perfil ideológico capaz de
atrair adeptos e mobilizar militantes, os quais também não
são desatentos a vantagens e
benefícios materiais.
Convém lembrar que a atividade política, para chefes e seguidores, é um modo de obtenção de vantagens pessoais,
mesmo quando parecem movidos só pelo "interesse público".
FOLHA - É "natural" preencher cargos com gente do próprio partido?
LEÔNCIO - Não é uma singularidade do PDT e do Brasil, deve-se dizer. É utilizado também
em outros partidos e em legendas de outros países, mesmos
nas democracias mais sólidas.
Quando um partido, ou uma
coligação deles, chega ao poder,
os postos estratégicos são distribuídos aos amigos, aos partidários, aos parentes, aos financiadores de campanha.
Ninguém distribui cargos para os adversários. Mas, entre
nós, parece haver um certo exagero na utilização da política e
do Estado para subir na vida.
Vem daí a ausência de uma administração pública mais profissionalizada, mais "republicana", como está na moda dizer.
Mas convém observar que as
acusações ao ministro não se
referiam apenas a uma política
de clientelismo, mas à distribuição irregular de benefícios
para entidades privadas.
FOLHA - Ele deveria continuar no
governo, mesmo após as acusações
dos recursos para as ONGs?
LEÔNCIO - Em países em que há
mais controle dos eleitores sobre os políticos, uma situação
como essa levaria votos para os
adversários. Assim, provavelmente, o ministro teria que
abandonar o cargo. Mas o presidente Lula manteve, até
quanto pôde, outros integrantes do governo acusados de
conduta ilícita, então...
FOLHA - Lupi se queixou de ser
"bombardeado" por pessoas que
"odeiam o trabalhismo"...
LEÔNCIO - Faz parte de uma tática política um pouco rústica
de, em vez de provar inocência,
acusar o interesse dos adversários em denegri-lo. Nisso, os
acusados geralmente têm razão. É difícil que aliados fizessem as acusações.
Outra técnica de defesa consiste em dizer que todo mundo
faz a mesma coisa. Mas isso não
significa, necessariamente, que
não exista o ato ilícito.
FOLHA - Os repasses seriam
uma forma de cooptação?
LEÔNCIO - Sim. A atividade política exige, sempre, recompensar os vários tipos de adeptos.
Mas há um dos aspectos do
atual governo que eu aprecio. O
fato de ter feito com que, como
nunca nesse país, se tornasse
tão visível a ação política como
uma disputa pela distribuição
de cargos, ascensão social e
enriquecimento.
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