São Paulo, segunda, 9 de março de 1998

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"Pelo amor de Deus, tirem o menino'

No lugar de política, mais importante encontro do PMDB tem cenas impróprias para menores do enviado especial a Brasília

No gabinete do senador Pedro Simon (RS), um grupo de peemedebistas gaúchos acompanha o desenrolar da convenção partidária.
Entre eles, Martim Fogaça, 9, filho do senador José Fogaça. A certa altura da gigantesca baderna armada no plenário, alguém grita: "Pelo amor de Deus, tirem esse menino da sala".
Foi assim, literalmente indecente para menores, que se desenvolveu o mais importante encontro do partido que, desde a redemocratização do país, em 1983, elegeu sistematicamente as maiores bancadas federais, o único partido a que pertencem ou pertenceram todos os presidentes civis da República ainda vivos (José Sarney e Itamar Franco, ainda peemedebistas, e Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, ex-peemedebistas).
No plenário da Câmara tomado pela claque (paga) dos governistas do PMDB e pela tropa de choque do MR-8, o movimento que transitou da luta armada para o quercismo, houve de tudo, de sangue a palavrões, de socos a pontapés. Só faltou política.

Política confinada
A política, a velha política peemedebista, estava, a rigor, confinada às imagens de três dos grandes ícones do partido (Ulysses Guimarães, Teotonio Vilela e Tancredo Neves), que pendiam de um cartaz pendurado quase no teto do plenário da Câmara dos Deputados.
"Queira Deus que nenhum deles tenha olhado para baixo", ironiza o governador Antônio Britto (RS), veterano de convenções partidárias, primeiro como jornalista, depois como político.
É verdade que o PMDB, que Fernando Henrique certa vez definiu como "partido-ônibus", porque nele cabiam todos, raramente fez convenções pacíficas. Mas a de ontem superou todas os recordes de guerra interna e de contradições insanáveis.
Como a de Itamar Franco, que, em seu discurso, lamentou a falta de "sentido de pátria" de parte dos homens que comandam, hoje, a política econômica brasileira.
Esqueceu-se de que quem manda na política econômica, hoje, são os mesmos Pedro Malan, presidente do Banco Central com Itamar Franco, e Gustavo Franco, diretor de Assuntos Internacionais do banco e, como tal, o homem que mandava no câmbio quando Itamar era presidente da República.

Crítico
Ou como a do senador Roberto Requião (PR), que foi o mais violento crítico de seu colega paulista Orestes Quércia, mas, ontem, minimizava as divergências, enquanto a claque governista, paga a R$ 40 per capita (ver reportagem à pág. 1-8), gritava: "Disque Quércia/Disque Quércia".
Era uma alusão a uma antiga proposta de Requião de se criar um telefone do tipo 0800 para centralizar denúncias de corrupção contra o ex-governador paulista.
A claque também gritava "Ferreirinha/Ferreirinha" para o senador, em alusão a um pistoleiro inventado por Requião, na campanha para o governo do Paraná, em 1990, para desmoralizar seu adversário, José Carlos Martinez.
O PMDB governista tampouco deixou de dar sua contribuição para o ambiente proibido para menores.

Cara-de-pau
O líder do partido no Senado, Jader Barbalho (PA), chamado de "ladrão" pelo coro do MR-8 quercista, devolveu:
"Tem muito cara-de-pau querendo posar de oposição, mas com cargos no governo".
Se o menino Martim Fogaça ficou até o fim vendo o espetáculo, a única coisa de política que terá aprendido é que sobrevive, no PMDB, um difuso nacionalismo, ou o que Itamar Franco caracterizou como "sentido de pátria".
Ainda assim, o "sentido de pátria" varia de peemedebista para peemedebista, porque alguns querem exercitá-lo sob o comando de Fernando Henrique e, outros, com Itamar Franco, que, no entanto, afirmou: "Se não fosse por nosso apoio, Fernando Henrique Cardoso não seria presidente da República".
(CLÓVIS ROSSI)



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