São Paulo, sexta-feira, 09 de agosto de 2002

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TRANSIÇÃO

Vaga em diretoria do BC espera representante do vencedor em outubro

Armínio abre o governo para sucessor "agir rápido"

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro da Fazenda, Pedro Malan, convidou o futuro presidente, seja quem for, a destacar uma equipe depois das eleições para integrar o atual governo durante novembro e dezembro e assim garantir uma "transição tranquila, com serenidade e confiança". O convite foi feito em entrevista coletiva.
Em telefonema à Folha, o presidente do Banco Central, Armínio Fraga, explicou: "Todo governo começa com uma lua-de-mel com o Congresso e com os agentes econômicos, os financeiros e a sociedade. Queremos ajudar o futuro presidente a não perder tempo, a agir rápido".
"Ele não precisa esperar até janeiro [data da posse" para adquirir um pouco de "know-how", descobrir onde estão as cascas de banana, saber onde estão as coisas, abrir as gavetas, mexer na papelada, saber quem é quem", acrescentou o presidente do BC.
Objetivamente, Armínio reafirmou que uma das nove diretorias do BC está vaga justamente aguardando um representante do novo governo a partir das eleições de outubro.
"As duas equipes vão poder ficar juntas um tempinho", disse.
O presidente do BC conversou mais de uma vez com o candidato do PPS à Presidência, Ciro Gomes, durante as negociações com o FMI (Fundo Monetário Internacional). Na quarta-feira, dia do anúncio do acordo, ele voltou a telefonar ao candidato, enquanto FHC e Malan conversavam com as demais campanhas, e relatou parte da conversa à Folha.
Avisou que faltavam apenas alguns detalhes e o acordo estava prestes a sair. Um acordo, descreveu, "bom para o país, sem criar ônus", e também "limpinho, sequinho, sem penduricalhos, flexível". Pediu, então, "confiança".
Indagado sobre a resposta de Ciro Gomes, Armínio riu e falou em tese: "O Brasil está dando uma demonstração de maturidade política para o mundo. Isso é importantíssimo".
Ele não disse, mas o presidente do BC também ligou ontem de manhã para avisar ao deputado federal Aloizio Mercadante (PT-SP) que participaria em seguida de uma entrevista coletiva sobre o acordo. Conforme a Folha apurou, Armínio disse ao petista para ficar tranquilo: "Não há nenhuma pegadinha [no acordo]", brincou.

"Minimalista"
Na coletiva da manhã, no Ministério da Fazenda, Malan, Armínio e o ministro do Planejamento, Guilherme Dias, insistiram no tom político e na necessidade de os candidatos à Presidência "expressarem formalmente o compromisso com o acordo", como disse Malan.
Indagado se o cronograma de liberações dos US$ 24 bilhões de 2003 (já no próximo governo, portanto) dependia de um compromisso formal já do novo presidente, respondeu que em nenhum minuto se pensou em pedir uma carta assinada dos candidatos, mas sim a ratificação de manifestações públicas que eles já vêm dando.
Malan leu trechos da "Carta ao Povo Brasileiro", na qual o PT se compromete inclusive com um superávit primário alto, e citou Mercadante e o também petista Guido Mantega. Depois, com a Folha, Armínio brincou: "O Malan anda com uma pasta com uns 30 a 40 recortes de jornais com o compromisso dos candidatos com a estabilidade".
"E do Garotinho [Anthony Garotinho, candidato do PSB]?, perguntou-lhe a Folha. Armínio respondeu: "Bem. Eu tentei falar com ele [Garotinho], e ele respondeu que não queria falar comigo. Então, encerrei o assunto".
O acordo com o FMI é "minimalista", classificou Armínio pela manhã. Disse que o acordo se concentra nas questões principais, "mas não significa nenhuma restrição aos rumos que o futuro presidente queira dar ao país". Malan acrescentou: "Rejeitamos categoricamente a interpretação de que o acordo engessa o próximo governo".

Uma ponte
Na conversa com a Folha, Armínio explicou por que a coletiva havia sido centrada na parte política: "Daqui em diante o foco vai aumentar em cima dos candidatos. Nós demos munição e uma ponte fortíssima para consolidar o eventual governo de cada um".
"Sucesso garantido?", perguntou-lhe a Folha.
Resposta: "Bem. Pode não ser uma garantia suficiente para a felicidade econômica-financeira, mas com certeza já é um caminho, uma ponte. Há um grau de conscientização muito forte de que as medidas são boas para o país, sem ônus".
Depois, enviou uma espécie de recado indireto para os candidatos: "Lidar com crise após crise não tem graça nenhuma".
Sempre considerado bem-humorado, quase uma esfinge, Armínio atravessou os piores momentos do pico do dólar praticamente sem alterar a expressão, sem mexer um músculo do rosto nas suas aparições públicas.
Ontem, porém, respondeu rispidamente a uma pergunta na coletiva sobre a queda dos juros como efeito do acordo.
"Você está perdendo tempo", disse ao jornalista. À tarde, se disse "mortificado": "Eu nunca poderia ter feito isso".
Passada a negociação com o FMI, Armínio acha que ainda há muito o que fazer até dezembro. Segundo ele, não dá para parar a partir de agora: "Seria um tiro no pé". Ontem mesmo, disse que "trabalhou sem parar": "Falei com bancos e agências de rating da Europa, fiquei horas com a imprensa, conferi o dólar".
Agora, aliás, é hora de continuar de olho no dólar porque, como ensinou, "falta de liquidez e medo [do mercado] não param do dia para a noite". Além disso, "se o câmbio for bem, o resto também vai bem".
Para encerrar, o presidente do BC disse que, se for chamado pelo governo eleito em outubro para colaborar com a transição, não se negará: "Não serei tímido. Darei minha contribuição".


Colaborou WLADIMIR GRAMACHO, da Sucursal de Brasília



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