São Paulo, segunda-feira, 09 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

IGREJA

Ex-presidente da CNBB, cardeal chegou a ser cotado para suceder ao papa

Morre, em Roma, d. Lucas Moreira Neves, aos 76 anos

2.jul.1988/Associated Press
D. Lucas em encontro com o presidente Fernando Henrique Cardoso no Palácio do Planalto, em 1988


DA REDAÇÃO

Ex-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o cardeal d. Lucas Moreira Neves, 76, morreu ontem às 17h (12h em Brasília) na clínica Pio 11, localizada em Roma, na Itália. A causa de sua morte não foi revelada.
Representante da ala conservadora da Igreja Católica do Brasil, o nome de d. Lucas chegou a constar da lista de possíveis sucessores do papa João Paulo 2º.
Mas, há dois anos, quando liderava a Congregação para os Bispos do Vaticano e presidia a Comissão Pontifícia para a América Latina, ele apresentou sua renuncia ao papa em razão de sua idade e de seu já frágil estado de saúde.
Ele tinha diabetes e vinha sendo submetido a sessões de hemodiálise por conta de problemas renais. De acordo com d. Raymundo Damasceno de Assis, secretário-geral da CNBB, o sepultamento de d. Lucas deverá ocorrer em Salvador, na Bahia, mas a data ainda não foi definida.
D. Lucas era um dos assessores mais próximos de João Paulo 2º. Este o nomeou arcebispo de Salvador em 1987 e o transformou em cardeal em 1988, além de indicá-lo para liderar a Congregação para os Bispos do Vaticano, um dos postos mais elevados da Igreja Católica, em 1998.
Os especialistas em Vaticano costumavam salientar que, além de ser latino-americano, d. Lucas poderia atrair a simpatia dos cardeais africanos devido à sua ascendência negra.
Ainda segundo os especialistas, isso será muito importante no próximo conclave (assembléia de cardeais que elege o papa), pois o número de cardeais europeus no Colégio Cardinalício caiu e o de latino-americanos e africanos subiu nos últimos tempos.
Nascido em São João Del Rey, em Minas Gerais, d. Lucas completaria 77 anos em 16 de setembro próximo. Ele entrou para a Ordem dos Pregadores (dominicanos) e fez sua profissão de fé em março de 1948.
Foi ordenado sacerdote em julho de 1950 -após cursar teologia na França- e nomeado bispo auxiliar de São Paulo em junho de 1967. D. Lucas era arcebispo emérito da Arquidiocese de Salvador, na Bahia -para onde fora destinado em julho de 1987. Ele presidiu a CNBB de 1995 a 1998.
Ele também se destacou na sociedade brasileira por conta dos vários livros e dos artigos semanais que escrevia.
D. Lucas, que era primo distante de Tancredo Neves, era da Academia Brasileira de Letras. Esta anunciou que a posse do imortal Raymundo Faoro, prevista para amanhã, foi adiada para o dia 17 próximo por causa da morte do religioso.

Figura controversa
Quando atuava como vigário-geral para a Pastoral dos Meios de Comunicação Social da CNBB, entre 1971 e 1974, durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici e o início do mandato do general Ernesto Geisel, d. Lucas participou de reuniões secretas entre representantes da Igreja Católica e das Forças Armadas.
Esses encontros, nos quais o primeiro escalão do clero brasileiro cobrava da cúpula militar a investigação dos casos de violação aos direitos humanos e o fim do cerceamento da liberdade de expressão e das perseguições políticas, deram origem à chamada Comissão Bipartite.
Esse capítulo da vida de d. Lucas gerou controvérsia. Para seus críticos, ele não demonstrou vigor em sua atuação em favor dos presos políticos e, implicitamente, não combateu devidamente os abusos cometidos por forças oficiais durante o regime militar.
Por outro lado, de acordo com seus simpatizantes, d. Lucas teve um papel importante na defesa dos direitos humanos e de um bom tratamento dos presos políticos, fazendo a ponte entre as aspirações da sociedade civil e as diretivas da cúpula das Forças Armadas do Brasil.



Texto Anterior: Painel
Próximo Texto: D. Lucas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.