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CAMPANHA DE RUA
Na disputa para pregar faixas nas ruas, equipes de candidatos se enfrentam fisicamente e usam até armas na madrugada
Briga suja
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
A disputa entre políticos na televisão e no rádio é "light" perto do
que ocorre nas ruas, na madrugada, quando funcionários de candidatos saem para pregar propaganda em postes e viadutos. Por
um ponto de boa visibilidade,
equipes chegam a se enfrentar fisicamente e muitas usam armas
para intimidar os concorrentes.
Na calada da noite, não há muito pudor em colocar banners
(aquele cartaz de plástico que tomou os postes de São Paulo) em
cima da propaganda de colegas de
partido ou de rasgar e arrancar
faixas de parceiros políticos.
"Faixeiros" -como são conhecidos os rapazes que pregam faixas e banners- normalmente
saem dos comitês com uma listinha na mão: pode colocar em cima de fulano, de beltrano não, de
ciclano nem pensar. Há a turma
mais "ética", que evita danificar o
material dos concorrentes e procura espaços ainda não ocupados
nas ruas, e a do "vale-tudo", que
chega a ter um funcionário só para arrancar propaganda alheia.
As maiores confusões costumam ocorrer nos viadutos, pontos mais disputados. Os candidatos que conseguem um espaço
para pôr uma faixa numa ponte
têm de colocar funcionários para
tomar conta da propaganda. Os
políticos deixam um "guarda de
faixa" durante o dia e dois à noite.
E quando alguém tenta tirar a
faixa, é difícil evitar o confronto.
"É o nosso ganha pão. Se a faixa
for arrancada, perdemos o emprego", disse G., 18, que cuida da
propaganda de um candidato do
em uma passarela da 23 de Maio.
Na ponte das Bandeiras, na
marginal Tietê, houve até tiro em
uma briga entre guardas de faixas
e faixeiros adversários. A bala não
acertou ninguém, mas todos saíram feridos da luta. Supervisores,
chamados para resolver a situação, decidiram não registrar boletim de ocorrência. Evitar o BO,
aliás, é procedimento comum. É
uma maneira de preservar o nome do candidato. Além disso,
muitas vezes há, entre os envolvidos nas brigas, pessoas que não
têm currículo do mais "exemplar" e até policiais fazendo bico.
Nas marginas e principais avenidas de São Paulo, o clima da
noite é tenso e, mesmo com a dificuldade para arrumar emprego,
muitos seguranças de faixa acabam desistindo da função após algumas madrugadas de trabalho.
V., 25, pedreiro, sem emprego há
dois anos, conseguiu uma "vaga"
em um viaduto da 23 de Maio
porque três rapazes, desempregados como ele, haviam desistido
depois de se envolver em uma briga com três faixeiros, há um mês.
V. acabou assumindo a responsabilidade por sete faixas, de três
candidatos a deputado. Ele fica
em um local distante de qualquer
estabelecimento comercial, onde
não há nem banheiro por perto,
de segunda à segunda, das 18h às
8h. Nessas 14 horas, às vezes se levanta do banquinho de madeira
improvisado e caminha pela ponte "para ver o movimento dos carros" lá em baixo. Juntando o pagamento dos três candidatos, recebe cerca de R$ 250 por semana.
"Dá um certo medo trabalhar
por aqui. Naquela briga, todo
mundo saiu com sangue na cara.
E agora mesmo, houve um roubo
de carro aqui perto, uns policiais
passaram atrás do bandido e
acharam que fosse eu. Tomei
umas coronhadas", disse V.
Fotografou?
Muitas vezes, para resolver um
impasse criado nas ruas, é preciso
que haja negociação entre os comitês dos candidatos. Foi o que
aconteceu em uma disputa por
espaço na ponte Roberto R. Zuccolo (antiga Cidade Jardim), na
marginal Pinheiros, há um mês.
Às 3h, faixeiros de Zé Índio
(candidato a deputado federal pelo PMDB) disseram a guardas da
propaganda de Jooji Hato (candidato a estadual pelo mesmo partido) que teriam de trocar as faixas.
Colocaram a de Zé Índio no lugar
da de Jooji, que foi levada por eles.
Os seguranças do candidato a
estadual avisaram o comitê, que
entrou em contato com o de Zé
Índio. Para provar que a faixa de
Jooji já estava antes no viaduto,
sua equipe usou uma "arma" comum nessa disputa: mostrou
uma foto da publicidade no local,
com data. A faixa de Jooji foi devolvida e recolocada na ponte.
O recurso da "prova fotográfica" foi útil há duas semanas,
quando houve uma ventania em
SP. O vento arrancou faixas, que
foram substituídas por outras, de
políticos diferentes. E, quando se
trata de pontes, a regra é clara:
quem chega primeiro é dono do
pedaço. Houve muita discussão
resolvida com as fotografias.
As fotos também são utilizadas
nos pontos em que os candidatos
só deixam a faixa de dia. Quando
escurece, o guarda recolhe o material e só recoloca no dia seguinte. Se o espaço for preenchido à
noite, recorre-se à fotografia para
convencer o adversário.
Os faixeiros também usam fotografias para provar a seus fiscais
que o serviço está sendo feito. É
comum que uma equipe coloque
banners em todos os pontes de
uma avenida e, no dia seguinte,
tudo tenha sido retirado ou encoberto por qualquer outro candidato. Porque, no jogo político da
política da escuridão, os aliados
podem ser rivais. E vice-versa.
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