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Marcelo Coelho
Nouvelle cuisine
COMO EX-PRESIDENTE, Fernando Henrique Cardoso andava tendo nos últimos anos um desempenho entre regular e razoável, embora isso não passe
de impressão puramente
subjetiva. Os institutos de
pesquisa estão atarefados
demais para fazer esse tipo de levantamento.
Mas FHC está deixando
de ser ex-presidente para
se tornar uma espécie de
vice-candidato, e vão de
mal a pior as suas atitudes
nesse papel. À medida que
a candidatura Alckmin
foi-se encolhendo, Fernando Henrique entra em
cena, com veemências
constrangedoras.
Começou lamentando a
falta de um "Carlos Lacerda" na atual conjuntura.
Para alguém com o passado de esquerda de Fernando Henrique, a frase é um
verdadeiro escândalo; um
passo a mais, e ele estaria
manifestando saudades
de Castelo Branco e do regime militar.
Não estamos mais no plano do "esqueçam o que escrevi"; é do "esqueçam
quem eu fui" de que se trata. Talvez fosse boa idéia.
O problema é que ele próprio não deixa. Agora, lança uma extensa carta, endereçada aos simpatizantes do PSDB.
Críticas aos presídios de
Alckmin, defesa das privatizações, autocríticas no
plano ético... Várias camadas, com ingredientes diversos, compõem esse
"bolo chiffon" retirado às
pressas do sofisticado forno de nosso experiente
mestre-cuca. Cerejas vermelhas enfeitam, por
exemplo, o final do texto,
onde o recente acesso de
lacerdismo de FHC é corrigido com curiosos apelos
à radicalização da democracia e ao diálogo com
sindicatos e movimentos
populares.
Claro que sem pensar em
revolução socialista ou
"revolução salvadora", como diz o texto-, pois isso
não está "em nosso horizonte histórico". Nunca é
demais reiterar esse ponto: caso contrário, Bornhausen e ACM encontrariam sem dúvida um bom
pretexto para abandonar o
barco do tucanos.
Vai naufragar, provavelmente. O objetivo da carta
seria incentivar o voto em
Geraldo Alckmin, mas seu
conteúdo é tão disperso,
que permite mais de uma
interpretação. Seria uma
tentativa de "refundar" o
PSDB? Do mesmo modo
que os petistas fiéis, o momento é de reconhecer "os
erros". Tivemos o caso
Eduardo Azeredo, diz
FHC, e "calamos muito
tempo". De modo que,
"para nos diferenciarmos
da podridão moral reinante, temos a obrigação moral de não calar".
Já não era sem tempo.
Talvez tenha passado um
pouquinho da hora. "Somos diferentes deles",
martela FHC.
O Bolsa-Família, por
exemplo, seria, nas mãos
dos tucanos, um compromisso com "os direitos dos
cidadãos". Nas mãos de
Lula, resume-se às "benesses de um papai-presidente". O "vovô ex-presidente" reclama da podridão dos dias atuais. Mas
estamos todos em família.
MARCELO COELHO é colunista da Folha
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