São Paulo, quarta, 9 de setembro de 1998

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O MUNDO
Nações ricas abrigam 100 milhões de pessoas com rendimentos abaixo do nível de pobreza, diz relatório da ONU
EUA têm mais pobres entre os países ricos

CLÓVIS ROSSI
do Conselho Editorial

Os Estados Unidos, o país mais rico do mundo, são também o país desenvolvido com maior porcentagem de pobres: 16,5% de sua população vive na pobreza, de acordo com o IPH (Índice da Pobreza Humana).
Trata-se de um indicador coletado pela primeira vez pelas Nações Unidas, como parte de seu caudaloso Relatório do Desenvolvimento Humano.
O IPH leva em conta não apenas a tradicional avaliação da renda das pessoas, mas também a porcentagem da população que tem expectativa de vida inferior a 60 anos, a porcentagem de analfabetos funcionais (alfabetizados que não conseguem nem sequer acompanhar uma leitura básica), os que estão desempregados há 12 meses ou mais e os que ganham menos da metade dos rendimentos pessoais médios.
É com base nesse critério que os Estados Unidos aparecem com o maior número relativo de pobres entre os países considerados ricos, seguidos da Irlanda e do Reino Unido.
Desempregados
Nos Estados Unidos, 20% da população é composta por analfabetos funcionais e 13% não passarão dos 60 anos de vida, um padrão inferior ao da Nicarágua, por exemplo.
Mas não são apenas os EUA que comportam uma grande pobreza em meio à abundância.
O relatório do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) afirma que as nações mais ricas do mundo abrigam 100 milhões de pessoas com rendimentos abaixo do nível de pobreza, mais de 37 milhões de desempregados, 100 milhões de sem-teto e 200 milhões com expectativa de vida inferior aos 60 anos.
"Os números são assustadoramente altos no seio da abundância", lamenta James Gustave Speth, administrador do PNUD.
Suécia
A Suécia é, entre os países ricos, o mais bem colocado no Índice de Pobreza Humana, com apenas 7% de sua população considerada pobre, pelos critérios do relatório.
No item educação, o relatório faz constatações, sobre os países ricos, que se equivalem às comumente feitas para países como o Brasil.
"Não obstante o fato de os países industrializados terem atingido a escolarização total, a qualidade da educação ministrada fica aquém das expectativas dos empresários", afirma o texto.
De fato, 18% dos adultos de 12 países ricos da Europa e da América do Norte revelaram tão baixos níveis de competência que "nem sequer conseguem corresponder às exigências básicas de leitura em uma sociedade moderna".
Tudo somado, o PNUD recomenda a adoção de "políticas que visem assegurar maior equidade no acesso à educação, aos serviços de saúde e a um rendimento mínimo indispensável para evitar a exclusão".

O pobre paga
Se existe esse fosso dramático entre ricos e pobres, nos países desenvolvidos, a brecha é imensamente maior entre os países ricos e os em desenvolvimento, afirma o relatório.
Um dado é impressionante: dos US$ 24 trilhões que compõem o consumo mundial de bens e serviços, 86% é feito por apenas 20% da população mundial, majoritariamente concentrada nos países desenvolvidos.
Qualquer que seja o bem escolhido para comparações, os dados são igualmente alarmantes.
Exemplos:
1 - Os 20% mais ricos do mundo consomem 45% da carne e do peixe, deixando apenas 5% para os 20% mais pobres.
2 - Os 20% mais ricos açambarcam 74% das linhas telefônicas existentes no planeta, enquanto os 20% mais pobres ficam com apenas 1,5%.
3 - Dos veículos existentes no mundo, 87% são de propriedade dos 20% mais ricos. A faixa mais pobre tem menos de 1%.
Meio ambiente
O padrão de consumo dos países ricos gera outro fenômeno perverso, assim descrito pelo relatório do PNUD:
"Uma criança que nasça hoje em Nova York, Paris ou Londres vai consumir, gastar e poluir mais durante a sua vida do que 50 crianças de um país em desenvolvimento. Mas os que consomem menos são os que suportarão o grosso dos danos ambientais".
Consequência, sempre segundo o relatório do PNUD: "Um quinto da população mundial, que vive em países de renda mais elevada, contribui com 53% das emissões de dióxido de carbono, que conduzem ao aumento do aquecimento da atmosfera. O quinto mais pobre contribui só com 3%, mas vive nas comunidades mais vulneráveis às inundações costeiras" (um dos efeitos do aquecimento global).

Canadá, o 1º
O Canadá, pelo quinto ano consecutivo, ficou em primeiro lugar no Índice de Desenvolvimento Humano, seguido por França e Noruega (o Brasil é o 62º).
Na outra ponta, existem cem países em desenvolvimento (ou em transição do comunismo para o capitalismo) em que graves crises econômicas levaram a renda per capita a cair a níveis inferiores a 10, 20 ou até 30 anos atrás.
No total, segundo o relatório, 1,3 bilhão de pessoas vivem com menos de US$ 1 por dia.



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