|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIO GASPARI
Lula 2002 toma Romanée-Conti 1997
Em tese, Lula tem três semanas para buscar os 3,5 milhões de votos que lhe faltaram para a maioria absoluta. José
Serra terá que correr atrás de 22,5
milhões de votos, algo equivalente a todo o eleitorado de São Paulo e Brasília. A próxima campanha dependerá sobretudo dos votos que Serra consiga tirar de Lula. Resta saber se Lula vai jogar o
patrimônio pela janela. A julgar
pelo seu comportamento na noite
de quinta-feira da semana passada, depois do debate da TV Globo, vai.
Terminado o espetáculo, Lula e
seus assessores foram jantar num
restaurante de Ipanema. Eram
umas 20 pessoas, entre elas Duda
Mendonça, o marqueteiro do PT.
Duda deu de presente a Lula uma
garrafa de vinho Romanée-Conti, safra de 1997, orçada em mais
de R$ 6.000. Fez o gesto de forma
pública e espetaculosa. Vazia, a
garrafa foi exposta no restaurante.
Um ex-torneiro-mecânico pode
(e talvez deva) chegar à Presidência da República, mas nenhum
candidato a presidente da República pode tomar Romanée-Conti. Um candidato francês só beberia dessa marca se ela lhe fosse
oferecida pelo dono do vinhedo,
num almoço de campanha. Governante de país rico não toma
Romanée-Conti. Esse vinho, tão
louvado, cobiçado e caro, só é coisa de político em país pobre.
Só político de país pobre toma
vinho estrangeiro (e caro). Nos
anos 60, quando o presidente
Lyndon Johnson exigiu que se
servissem marcas americanas na
Casa Branca, foi chamado de caipira. Hoje a indústria vinícola da
Califórnia é um negócio de US$
33 bilhões anuais.
O grande divulgador do Romanée-Conti em Pindorama foi
Paulo Maluf. É provável que tenha sido também o iniciador de
Duda Mendonça na devoção à
marca. Exatamente seis anos antes da hora em que Duda deu seu
mimo a Lula, Maluf comemorou
com um Romanée-Conti a vitória de Celso Pitta, de cuja campanha Duda fora marqueteiro. Naquela noite de 1996, num telefonema, Maluf disse-lhe: "Olhe,
não esqueça: hoje à noite tem vinho em casa, dos bons". Outro
destacado consumidor é o ex-senador Gilberto Miranda. Pena
que tenha servido um vinho raro
ao dono do vinhedo Romanée-Conti e ele não lhe tenha reconhecido o sabor.
O Romanée-Conti é considerado um dos melhores vinhos do
mundo. Sua produção anual é de
6.000 garrafas e em muitos casos
dá mais trabalho encomendá-lo
do que tomá-lo. Presentear amigos com esse prazer é um hábito
caro, praticado num circuito onde estiveram Frank Sinatra e o
falecido rei Hussein da Jordânia,
Barbra Streisand e Donald
Trump. Quando uma gravadora
quis agradar a Paul Mc Cartney,
um Romanée-Conti 1942 foi a solução. Um curioso, convidado a
um festim no qual foram servidas
perto de 15 garrafas de safras diferentes, jura que lá pela 12ª garrafa sua bebida estava com gosto
de banana. Os convidados eram
uns 15, e cada um tomava três dedos de cada safra. A certa altura
havia três deles escondidos no
jardim; queriam fumar em paz.
Não faz sentido que um candidato a presidente diga as coisas
que Lula diz (a história da mulher que pedia esmola com uma
criança no colo, por exemplo) e
depois vá molhar as trufas do ravióli com uma garrafa de Romanée-Conti à mesa. A cena é patética. Admitindo que Lula acredita no que diz, acabou preso numa
mesa onde lhe será difícil reconhecer-se. Nem tanto pelo preço
do vinho, mas pelo ridículo do
consumo. Quase tão ridículo
quanto a chegada de FFHH ao
Forte Copacabana no Réveillon
de 2000 levando sua garrafa de
cinco litros de champanhe Cristal
(R$ 10 mil à época).
Lula tem todo o direito de receber de presente um vinho de milionário, trazido por um amigo
numa ocasião especial. Agradece,
manda que se faça uma rifa em
benefício dos sem-Romanée e bebe o que bem entende. Degustando o mimo de Duda, tornou-se
um candidato que falou em fome
no estúdio da TV Globo em Jacarepaguá e uma hora depois bebeu
Romanée-Conti em Ipanema.
Texto Anterior: Campo Minado: Sem-terra leva tiro em fazenda no interior de SP Próximo Texto: Rombo Amazônico: Jader volta a rivalizar com ACM e diz ser alvo de "farsa" Índice
|