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CIDADÃ REVISTA
Entre os dispositivos que não foram aprovados está o que inclui as medidas provisórias no processo de legislar
Cinco artigos da Carta nunca foram votados
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Levantamento feito em arquivos, notas taquigráficas e documentos oficiais da Câmara dos
Deputados revela que parte ou a
totalidade de pelo menos cinco
artigos da Constituição, de 1988,
não passaram por nenhuma das
duas votações necessárias no plenário da Constituinte. Entre eles,
está o que inclui as medidas provisórias como uma das atividades
do processo de legislar.
A documentação da época, disponibilizada e checada pela Mesa
Diretora da Câmara dos Deputados, mostra que os artigos 2º, 14,
29, 59 e o 70 das Disposições
Transitórias passaram por alterações quando já estavam na Comissão de Redação da Constituinte, responsável pelo texto final dos
pontos aprovados no plenário.
Não caberia, na comissão, inclusões ou alterações que modificassem o mérito das matérias
aprovadas, apenas a adequação e
correção da redação. No caso das
medidas provisórias, não há nem
registro da alteração na comissão,
o que levanta a suspeita de que o
ponto tenha sido incluído entre a
aprovação da redação final e a publicação no "Diário Oficial".
O artigo 59 é o primeiro da seção que trata do processo legislativo, determinando que ele "compreende a elaboração de: emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções".
Nos textos aprovados em primeiro e segundo turno no Congresso constituinte, o item "medida provisória" não constava do
parágrafo. Nos registros das alterações feitas nas sessões da Comissão de Redação não há registro da inclusão. Vale ressaltar que
as normas e características das
MPs, bem como sua criação, estão
listadas no artigo 62 e foram votadas normalmente nos dois turnos. O que faltou foi incluir o mecanismo como uma das atribuições do legislador. A MP foi criada para substituir o decreto-lei.
O levantamento feito pela Folha
partiu da revelação feita pelo hoje
ministro do Supremo Tribunal
Federal, Nelson Jobim (então deputado), de que artigos da Constituição teriam sido incluídos por
lideranças partidárias sem terem
passado por votação em dois turnos no plenário, como determinava a emenda constitucional 26,
que convocou a Assembléia Nacional Constituinte. Ele disse que
isso ocorreu em duas ocasiões,
mas só revelou a do art. 2º, que
trata dos Poderes da União. A expressão "independentes e harmônicos entre si" foi incluída na comissão de redação por sugestão
de Michel Temer (PMDB-SP).
Em relação aos outros três casos
detectados pela Folha, um aumenta o número mínimo de vereadores, outro estabelece idade
mínima para ser juiz de paz e o
terceiro manteve a competência
dos tribunais até a promulgação
das constituições estaduais.
O primeiro (art. 29, inciso IV,
alínea c) foi uma sugestão do deputado Roberto Freire e acabou
resultando no aumento do número mínimo de vereadores nas cidades com mais de 5 milhões de
habitantes, de 33 para 42. No texto
aprovado em primeiro e segundo
turnos, a previsão era de um mínimo de 33. Como o piso previsto
para cidades entre 1 e 5 milhões
também era de 33 vereadores, o
relator, Bernardo Cabral, acatou a
sugestão na Comissão de Redação. "Não me lembro", disse ontem o deputado federal Roberto
Freire (PPS-PE). "Não sei o que
aconteceu, pode ser que tenha havido um erro evidente", disse.
A idade mínima de 21 anos para
ser juiz de Paz também entrou na
Constituição sem ter sido votada
nos dois turnos em plenário (art.
14, parágrafo 3º, inciso VI, alínea
c). A sugestão foi do deputado Ricardo Fiuza, que argumentou na
época ser necessária a medida já
que a nova constituição determinava que os juízes de paz seriam
eleitos. "Amanhã iremos ter juiz
de Paz com 18 anos", alegou.
Ontem, Fiuza (PP-PE) disse não
se lembrar do caso. Informado da
proposta, Fiuza disse que não a
considerava matéria nova: "Consistia numa emenda de redação,
um dispositivo típico de redação.
Como o juiz era para ser eleito,
não poderia ser menor de idade".
Por fim, uma emenda de Nelson
Jobim apresentada à Comissão de
Redação acrescentou às Disposições Transitórias o artigo 70, que
manteve a competência dos tribunais estaduais até a promulgação
das constituições estaduais. Ontem, Jobim não comentou o caso.
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