São Paulo, quinta-feira, 09 de novembro de 2000

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RUMO A 2002
Senador afirma que informou Lula da sua decisão na segunda-feira e comenta o que mudou na sua relação com Marta
Sou candidato a presidente, diz Suplicy


SANDRA BRASIL
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

O senador Eduardo Matarazzo Suplicy (PT-SP), 59, lançou sua pré-candidatura à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso. Na segunda-feira passada, Suplicy foi à casa do líder petista Luiz Inácio Lula da Silva, em São Paulo, para colocar o seu nome à disposição do partido para concorrer em 2002.
"Quero ser presidente da República", disse o senador em quatro horas de entrevista à Folha.
Suplicy, que foi um dos fundadores do PT em 1980, afirmou que o seu casamento de 36 anos com a prefeita eleita de São Paulo, Marta Suplicy (PT), está em um dos "melhores momentos". Ele admitiu, no entanto, que chegou a se sentir "preterido" quando Marta foi convidada para ser a candidata do partido ao governo de São Paulo, em 1998.
A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha.

Folha - O sr. quer ser candidato à Presidência?
Eduardo Suplicy -
Eu me disponho a ser candidato à Presidência da República. Quero ser presidente da República. Acho muito saudável para o PT que haja muitas pessoas que se disponham a ser presidente. E feliz é o PT por ter um número tão grande de pessoas hoje, a começar pelo próprio Lula, que é sem dúvida alguma a maior liderança popular das últimas décadas no Brasil. O partido tem ainda nomes como o do ex-governador Cristovam Buarque, os três governadores do PT (Olívio Dutra, Zeca do PT e Jorge Viana), o presidente nacional do PT, José Dirceu, o deputado federal José Genoino, o líder do PT na Câmara, deputado Aloizio Mercadante, o prefeito recém-eleito Tarso Genro e, obviamente, porque está se constituindo numa das principais lideranças nacionais, a prefeita eleita Marta Suplicy.

Folha - Mas não há um compromisso dos prefeitos eleitos do PT de cumprirem os quatros anos de mandato?
Suplicy -
Se eu não tivesse citado o Tarso Genro e a Marta Suplicy, estaria cometendo uma injustiça com eles. Eles são valores hoje considerados pela base do PT e pela opinião pública como presidenciáveis desde agora.

Folha - Por que o senhor quer ser presidente?
Suplicy -
Mais importante do que eu ser presidente é que o próximo presidente da República realize o que acredito seja necessário: a realização da justiça de forma compatível com a liberdade e a democracia no sentido mais amplo da palavra.

Folha - O senhor seria o presidente da renda mínima?
Suplicy -
Muito mais do que isso. Eu, se eleito presidente, colocaria a realização da prática da justiça num país que, infelizmente, tornou-se um dos campeões mundiais da desigualdade socioeconômica. Faria da erradicação da pobreza e da construção da equidade o objetivo principal. E, assim como, por exemplo, Juscelino Kubitschek disse que construiria Brasília em cinco anos e mudaria a capital para o Planalto e o fez, acho que o grande desafio de um governo do PT seja erradicar a pobreza absoluta, a fome e promover os instrumentos de maior igualdade no Brasil.

Folha - O senhor já informou ao partido de que tem a intenção de se candidatar?
Suplicy -
Sim. Muitas pessoas têm transmitido a mim em todos os lugares onde vou, tanto dentro como fora do partido, que eu deveria me colocar à disposição de ser candidato a presidente.

Folha - Inclusive a prefeita eleita Marta Suplicy?
Suplicy -
Eu conversei muito com ela nesses dias (sobre esse assunto). Eu recordei que há uma dificuldade. A Constituição diz que o cônjuge não pode ser sucessor na eleição seguinte ao do seu mandato. Por exemplo, eu não posso ser candidato à sucessão da Marta como prefeito. A Marta, na hipótese de eu ser escolhido candidato a presidente pelo PT e ser eleito, não poderá me suceder.

Folha - E ela, o que falou?
Suplicy -
Ela me disse: Eduardo, se for por essa razão, se você acha que quer ser, não se limite por isso, porque eu acho justo que você possa ser.

Folha - Por que o senhor ainda não havia lançado publicamente a sua candidatura?
Suplicy -
No primeiro trimestre deste ano, recebi centenas de mensagens sugerindo que eu me candidatasse à Presidência. Recebi também um manifesto por escrito de alguns amigos e diversos professores. Eles disseram: "Eduardo, você já deveria dizer que está disponível para o partido para ser candidato à Presidência". Foi então que, em tomando conhecimento disso, a coordenação da campanha da Marta pediu uma reunião comigo. Umas dez pessoas que escreveram o manifesto participaram do encontro. Eles ouviram comigo as ponderações feitas pelos coordenadores da campanha. A Marta estava em casa, mas não participou dessa reflexão. Eles ponderaram que, se eu viesse a declarar que era candidato à Presidência desde o primeiro trimestre de 2000, isso poderia prejudicar a campanha da Marta e colocaram diversas razões com as quais eu concordei inteiramente.

Folha - E por que eles não queriam que o sr. se lançasse naquele momento?
Suplicy -
Porque poderia criar uma reação de certas pessoas, dentro e fora do partido, que poderiam prejudicar a própria imagem da Marta. "Ah, imagine, marido e mulher! Esse casal já está querendo demais! A mulher quer ser prefeita, o marido, presidente!". O outro argumento é que poderia causar dentro de certos segmentos do partido um espírito de não colaboração com a própria campanha da Marta.

Folha - Agora o senhor está liberado...
Suplicy -
Estou. Há ainda dois outros episódios importantes. Um ocorrido há um ano, aproximadamente, e o outro ocorrido ontem (segunda-feira) à noite. O Lula sugeriu ao presidente José Dirceu que convidasse para um jantar Cristovam Buarque, Tarso Genro, Mercadante, Genoino e eu para um diálogo sobre a questão da sucessão presidencial e o PT. Nessa reunião, o Lula nos transmitiu que ele estava considerando a hipótese de ser candidato à Presidência, que uma pessoa que tem cerca de 30% nas pesquisas de opinião deveria considerar isso com responsabilidade. Não poderia facilmente abrir mão disto. Entretanto, queria transmitir a nós que poderia também decidir por não ser candidato. Que ele estava perfeitamente aberto para esta possibilidade tanto de ser quanto de não ser. O Lula nos disse: "Vocês são as pessoas que a base do partido considera que poderiam ser também candidatos à Presidência. Quero transmitir essa minha ponderação porque quero que vocês estejam preparados para a eventualidade de eu decidir não ser". Eu me senti bem e honrado com as palavras dele e levei a sério. Eu sempre atendi a apelos do partido.

Folha - E o que aconteceu ontem (na última segunda-feira)?
Suplicy -
Foi uma conversa com o Lula. Eu fui visitá-lo ontem à noite na casa dele. Cheguei lá por volta das 21h30. Saí de lá por volta das 23h30. Eu disse ao Lula que será muito saudável para o PT ter diversos candidatos à Presidência, que obviamente inclui a pessoa dele, que é a lideranças das oposições mais forte no Brasil. Disse ao Lula o que eu transmiti à Marta: mais importante do que eu ser presidente do Brasil, é que as minhas idéias possam ser levadas adiante, porque eu acredito nelas.
Agora, considero legítimo e bom para o partido que eu defenda as minhas proposições. Se o partido quiser que eu seja candidato à Presidência, eu me disponho. E eu também disse ao Lula que só faria isso na medida em que eu percebesse que, com essa atitude, eu não o estaria prejudicando ou magoando ou perturbando a pessoa dele e o PT. E aí, ele se mostrou extremamente responsável, generoso e aberto dizendo que achava perfeitamente razoável, legítimo e que eu me sentisse inteiramente livre para começar a dizer isso publicamente. Ele disse que conversaria com as outras pessoas que participaram do jantar.

Folha - O senhor acha que a sua candidatura é viável?
Suplicy -
Sim.Eu acho perfeitamente viável. Ainda ontem, estava viajando de Curitiba para São Paulo. Estava ao meu lado uma psicanalista amiga da Marta e um empresário. Ele iniciou o diálogo perguntando quem é que vai ser candidato do PT? E disse que gostava do José Dirceu. Não passou um minuto e as três pessoas que estavam no banco da frente ao meu se levantaram e disseram: "Nós queremos que você seja candidato a presidente".

Folha - E como é a convivência, na mesma casa, de dois possíveis presidenciáveis do PT?
Suplicy -
Tem sido de um aprendizado mútuo extraordinário, de muito respeito um pelo outro e de muito carinho e amizade. Tem havido poucos momentos de tensão, mas sobretudo há um respeito muito grande e com situações novas que surgiram a partir da eleição dela para prefeita. Combinei com ela e acho que teve muita razão em ponderar isso, que eu não deva ser um porta-voz.

Folha - O que significou essa ascensão política da Marta para o casamento de vocês?
Suplicy -
Eu posso dizer que estou num estágio do nosso casamento de 36 anos de muita profundidade no amor, na compreensão mútua, na percepção. Em poder sempre dizer a ela todos os meus sentimentos. Então, as pessoas procuram construir uma vida em comum e, felizmente, o meu casamento com a Marta tem uma compreensão formidável neste período de convivência política, em que ambos disputamos eleições e temos projetos que são apresentados.

Folha - O casamento melhorou?
Suplicy -
Muito. O meu casamento com a Marta hoje tem uma qualidade que posso afirmar como uma das melhores que houve em toda nossa vida.

Folha - O senhor levou a Marta para o PT. Ela já era uma psicanalista e sexóloga bem-sucedida, mas a vida política dela começou em função da sua atuação política. Nesse momento em que os holofotes estão voltados para ela, o que mais incomoda o senhor?
Suplicy -
Depois da reunião em que a Marta foi escolhida candidata a governadora (de São Paulo, pelo PT, em 1998), houve um período em que eu fiquei assim com um possível sentimento de estar sendo preterido e tal. Daí, eu li o livro "Despertar da Águia", do Leonardo Boff. Ele coloca com muita propriedade que, se nós quisermos uma boa sociedade, saudável, civilizada, é muito importante que nós homens compreendamos o quão bom pode ser alternar no comando do poder ora o homem, ora a mulher. Porque a mulher tem algumas qualidades e sensibilidades e um olhar diferente de nós, homens. E, desde que eu li isso, eu me senti muito bem, não apenas passei a dizer como a sentir que era muito justo que ela fosse candidata.

Folha - Em geral, as primeiras-damas do municípios são responsáveis pela área social do governo. Mesmo sendo senador, o senhor pretende ajudar na área social do governo da Marta diretamente?
Suplicy -
Vou continuar senador. Vou estar acompanhando de perto a aplicação de todos programas de natureza social, sobretudo aqueles voltados para garantir renda, emprego e trabalho.

Folha - Qual é o segredo para um casamento de 36 anos?
Suplicy -
Todo casamento para dar certo envolve muita compreensão, enorme respeito, muita vontade de amar, isso inclui a atração sexual que um tem pelo outro, a vontade de compartilhar sentimentos, de estar juntos nas horas difíceis, a atenção para com as pequenas coisas. E isto é algo que tem que ser permanente.

Folha - Das atitudes de Paulo Maluf durante a campanha em São Paulo, o que mais incomodou?
Suplicy -
Felizmente, o Maluf foi um obstáculo ultrapassado e eu não preciso mais me referir a ele nem quero. Se tiver mais perguntas sobre isso, está encerrada a entrevista. Eu não tenho nenhum prazer de estar falando sobre ele. Ele não procedeu com respeito à minha família e aos meus filhos.

Folha - A prefeita eleita ajuda ao senhor, por exemplo, a escolher roupa?
Suplicy -
Se eu descuido um pouco, ela chama atenção. Se eu vestir uma camisa que não combina com a gravata e o terno, ela diz: "Isso não! Imagina! Tá horrível isso!". Manda voltar para trocar, e eu volto. Na maior parte das vezes, escolho bem. Ela me fez ficar mais atento a escolher bem.

Folha - E a plástica que o senhor fez na região dos olhos, ela teve alguma influência nisso?
Suplicy -
Fiz porque eu estava com excesso de gordura e o médico me disse que isso acabava me cansando mais. Eu tive muita resistência, desde que a Marta tinha me recomendado. Fiz em 97 e foi tranquilo.

Folha - E o que o senhor achou da plástica que a prefeita eleita fez?
Suplicy -
Disse a ela que não precisava ter feito porque ela era bonita do jeito que era. Não precisava! Mas ela avaliou que era muito significativo fazer e, quando fez, eu dei a maior força. E realmente, para ela, ficou melhor. Cumprimentei muito o doutor Pitanguy.


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