São Paulo, sexta-feira, 10 de janeiro de 2003

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JANIO DE FREITAS

Os viajantes

É muito original a idéia de Luiz Inácio Lula da Silva de, em pessoa, apresentar a miséria a um punhado de integrantes do seu governo, embora alguns deles já tenham arriscado até a vida para combatê-la e, como ficou dito aqui, mais lógico seria o governo composto de conhecedores, ao menos testemunhais, da miséria.
A visita olímpica, bate na borda e volta depressa, nada instruirá a quem ainda hoje, vivendo em país com 54 milhões de pobres -número oficial deixado pelo governo Fernando Henrique-, ainda precise ser forçado para um primeiro olhar a um núcleo de pobreza.
Esse tipo de viagem só tem resultado propagandístico. E Lula não precisa de mais exposição propagandística do que vem tendo, motivada pela emoção popular autêntica e pura e pela autenticidade de sua resposta a essa manifestação.
Anuncia-se que decidiu ir à reunião dos donos da riqueza espalhada pelo mundo, o mal denominado Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, e à reunião do Fórum Social Mundial em Porto Alegre, no qual se representam as idéias críticas à situação do mundo.
Davos é um convescote promovido a ouro, do qual jamais saiu alguma coisa útil para um país e muito menos para o mundo, nem mesmo uma ideiazinha aproveitável. É uma farsante troca de informações, análises e previsões que nunca precisam de mais tempo para desmoralizar-se, seja logo pela obviedade, seja pelo bestialógico charlatão, como é próprio das grandes previsões econômicas ou políticas.
O que Lula tenha a dizer aos de Davos, se é que possa ter, caberia muito bem uma mensagem: nada há que não posso, ou deva, dizer daqui. Em pessoa, será uma curiosidade: para alguns, o operário-presidente, que coisa inacreditável; para outros, até mesmo como simples operário, que nunca viram de perto, como certos ministros que, dizem, só agora vêem a pobreza.
No PT e nas "esquerdas" há reações aborrecidas à ida de Lula a Davos, louvada, porém, sua ida ao Fórum Social. Mas não há razão, também, para sua ida a esse fórum. Vai prestigiar os adversários da situação mundial? É inimaginável que precise mostrar por palavras sua posição a respeito, quando bem estará em Brasília para transformá-la em atos que estão sendo esperados. O Fórum Social ainda é uma grande feira de esquerdismos, neohippismos e protestismos que, ou encontra modos de se tornar instrumento de consequências, ou tenderá a ser um evento de folclore político.
Fórum de Davos e Fórum de Porto Alegre: duas viagens cujos únicos propósitos perceptíveis são propagandísticos. Ao fim de oito anos de viagens inúteis, aquelas só para turismo e relações de promoção pessoal, acabar com todas as viagens dispensáveis é também introduzir mudança -com sentido moral, administrativo e econômico.


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