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CELSO PINTO
Uma revolução fiscal
A moratória de Itamar Franco e
a pressão de outros governadores
para renegociar as dívidas seriam
inúteis se já estivesse em vigor a
Lei de Responsabilidade Fiscal,
que o governo quer aprovar ainda
neste ano.
O artigo 99 do anteprojeto da nova lei proíbe a União de conceder
qualquer crédito a Estados, municípios, Distrito Federal ou entidades de administração indireta,
"ainda que na forma de refinanciamento ou postergação de dívidas contraídas anteriormente". A
exceção é a concessão de garantias
e repasse de recursos originados de
operações externas.
A renegociação das dívidas estaduais foi baseada numa resolução
do Senado. Com a nova lei, o Senado poderia até aprovar renegociações, mas o Tesouro estaria impedido de cumpri-las.
Esse é apenas um dos muitos aspectos que tornam a Lei de Responsabilidade Fiscal uma revolução na história das finanças públicas do país. Em rigor, com a lei em
vigor, seria praticamente impossível chegar a uma situação fiscal de
penúria nos Estados. A lei cria instrumentos que impedem um descontrole, obriga a correções automáticas e responsabiliza os administradores irresponsáveis.
O secretário-executivo do Ministério de Orçamento e Gestão, Martus Tavares, diz que a moratória
de Itamar "reforça ainda mais a
necessidade de ter instrumentos
prévios de controle". A moratória,
a seu ver, obrigará o governo a ser
"ainda mais duro" na questão da
dívida estadual.
Ele não acha que comprometer
13% da receita líquida com o pagamento da dívida represente um
esforço exagerado. "Significa um
esforço, mas é preciso, de fato, fazer o ajuste fiscal nos Estados."
A Lei de Responsabilidade Fiscal
inova em vários aspectos cruciais.
Fixa limites para o endividamento
dos vários níveis de governo. A
Constituição dá ao Senado poderes na área de endividamento dos
Estados. O artigo 52, contudo, diz
que cabe ao Senado "fixar, por
proposta do presidente, limites
globais" para as dívidas dos vários
níveis de governo.
Por essa razão, os limites previstos com base na nova lei só poderão ser alterados por meio de nova
proposta presidencial. Acaba, portanto, com a brecha que permitia
ao Senado ampliar o endividamento dos Estados à revelia do
Executivo.
A lei foi discutida com o mercado
financeiro e, nesta quinta-feira,
com a Associação Brasileira das
Secretarias da Fazenda das Capitais, a Abrasf. A receptividade foi
boa.
José Roberto Afonso, chefe da Secretaria de Assuntos Fiscais do
BNDES, presente na discussão, diz
que, de forma geral, os secretários,
tanto em nível estadual quanto
municipal, vêem as regras e limites
da nova lei como uma forma de
defesa contra pressões políticas indevidas. Haverá punições penais
para quem não cumprir as regras.
Os secretários municipais levantaram uma sugestão interessante:
que a lei regule os gastos com pessoal não só por nível de governo,
mas por esferas de Poder. O Executivo não controla gastos do Judiciário e do Legislativo, mas tem
que cumprir a regra geral da Lei
Camata que limita os gastos com
pessoal a 60% da receita líquida.
A sugestão é que se diga, por
exemplo, que, dos 60%, digamos
que 10% caberiam ao Legislativo,
e 5%, ao Judiciário. Apenas o Poder, ou os Poderes, que se desviassem da meta teriam que se ajustar.
O governo gostou da idéia.
Como se sabe, uma outra lei em
tramitação dá prazo até o final do
próximo ano para o ajuste completo ao limite da Lei Camata, dois
terços dos quais até o final deste
ano.
Outra idéia interessante dos municípios é transformar os Adiantamentos de Receita Orçamentária
(AROs) numa espécie de cheque
especial. Os AROs deveriam ser
empréstimos de curtíssimo prazo
para cobrir desequilíbrios temporários de caixa, mas muitos abusaram de seu uso. A sugestão é permitir o uso de um cheque especial
pelos municípios, mais flexível do
que um empréstimo, mas com limites estritos e que teriam que ser
zerados 15 dias antes do fim de cada ano.
Depois das discussões públicas, o
governo vai consolidar um novo
anteprojeto e enviá-lo ao Congresso em fevereiro. Tavares espera
que a tramitação comece em março e se complete no segundo semestre. Como lei complementar, ela
exige maioria qualificada (50%
mais um) para ser aprovada mas,
em compensação, é mais difícil de
ser mexida.
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