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INVESTIGAÇÃO INTERNACIONAL
Ex-prefeito nega existência de dinheiro no exterior e diz que é vítima de campanha política
Paraíso fiscal bloqueia contas de Maluf
ROBERTO COSSO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
A polícia da ilha de Jersey, um
paraíso fiscal que integra o Reino
Unido, localizado no canal da
Mancha, bloqueou uma série de
contas bancárias em nome de
Paulo Maluf (PPB) e de seus familiares. Segundo a Folha apurou,
há pelo menos US$ 200 milhões
(cerca de R$ 472 milhões, pela cotação da última sexta-feira) depositados -e bloqueados- nas
contas ligadas ao ex-prefeito de
São Paulo.
Maluf negou, por intermédio de
seu assessor de imprensa e de dois
advogados, a existência das contas. O ex-prefeito alegou ainda
que estaria sendo vítima de uma
"campanha" para inviabilizar sua
candidatura ao governo paulista
em 2002 (leia texto ao lado).
As movimentações financeiras
da família Maluf estão sob investigação das autoridades de Jersey.
O Ministério Público do Estado
de São Paulo apura se Maluf recebeu, no exterior, pagamentos irregulares de empresas brasileiras.
Na declaração de bens entregue
pelo ex-prefeito à Justiça Eleitoral,
no ano passado, quando do registro de sua candidatura à Prefeitura de São Paulo, não há nenhuma
referência a depósitos no exterior.
Ele informa um patrimônio total
de R$ 74.967.594,69.
Notificação
No início do ano passado, a unidade de inteligência financeira de
Jersey informou o Coaf (Conselho
de Controle de Atividades Financeiras), órgão ligado ao Ministério
da Fazenda, sobre a existência de
vultosas movimentações financeiras em nome de pessoas da família Maluf.
A Convenção de Viena, firmada
em 1988, obriga, entre outras coisas, que as unidades de inteligência financeira de todos os seus signatários informem a existência de
grandes movimentações bancárias às autoridades dos países de
origem das pessoas que as tenham realizado.
O objetivo dessas notificações é
verificar se existe alguma possibilidade de o dinheiro ser fruto de
crime no país de origem.
O Coaf recebe entre três e quatro notificações por semana das
unidades de inteligência financeira espalhadas pelo mundo sobre
grandes movimentações financeiras feitas por brasileiros.
Quando existe investigação sobre a pessoa, o Coaf coloca as autoridades brasileiras em contato
com a unidade de inteligência financeira que identificou a operação. Foi o que aconteceu no caso
da família de Maluf.
Bloqueio
A unidade de inteligência financeira de Jersey informou o Coaf
sobre as movimentações em nome de Paulo Maluf, Sylvia Maluf
(sua mulher), Flávio Maluf, Ligia
Maluf, Lina Maluf e Octavio Maluf (seus filhos) e de Jacqueline
Maluf (mulher de Flávio Maluf).
O Coaf, sabendo que Maluf é
réu em diversas ações movidas
pelo Ministério Público do Estado
de São Paulo, colocou os promotores de Justiça em contato com a
polícia da ilha de Jersey.
Em novembro do ano passado,
o Ministério Público do Estado de
São Paulo enviou à polícia de Jersey um documento chamado "affidavit" (declaração criminal circunstanciada) sobre as investigações realizadas no Brasil a respeito de Paulo Maluf e Flávio Maluf .
O documento sugere o bloqueio
da transferência do dinheiro detectado em nome de Maluf e de
seus familiares.
Cerca de um mês depois, a polícia de Jersey confirmou às autoridades brasileiras o bloqueio das
contas das sete pessoas.
Informações oficiais
Passados quase seis meses de
negociações, iniciadas logo após o
bloqueio do dinheiro, a polícia de
Jersey ainda não mandou ao Brasil documentos oficiais sobre os
depósitos da família Maluf.
De acordo com a legislação brasileira, o simples fato de Maluf ter
no exterior, em seu nome, dinheiro não declarado seria suficiente
para a instauração de um inquérito para investigar a eventual prática de evasão de divisas.
Mas, como o Ministério Público
não tem documentos oficiais de
Jersey sobre os depósitos, não pode investigar o suposto crime.
Da mesma forma, a Promotoria
de Justiça da Cidadania da Capital
aguarda uma comunicação oficial
sobre os depósitos para investigar
a hipótese de enriquecimento ilícito, com base na Lei de Improbidade Administrativa, segundo a
qual ele teria de provar a origem
lícita do dinheiro, sob pena de ser
condenado à perda dos valores.
Por outro lado, os dados de depósitos bancários em Jersey são
sigilosos, a menos que haja suspeita de que o dinheiro seja fruto
de crime.
Assim, enquanto o Ministério
Público do Estado de São Paulo
pede os documentos oficiais sobre os depósitos, a polícia de Jersey pede que as autoridades brasileiras enviem à ilha documentos
que comprovem a remessa ilegal
do dinheiro ao exterior.
Esses documentos não existem
porque o Ministério Público ainda não identificou a origem desses depósitos. Os promotores precisariam dos papéis de Jersey para
poder apurar o trajeto do dinheiro até chegar lá.
A Folha apurou que os advogados contratados por Maluf já fizeram vários pedidos à polícia de
Jersey para que o dinheiro das
contas seja desbloqueado.
Autoridades
Procuradas pela Folha, as principais autoridades empenhadas
na investigação das contas bancárias de Maluf e de sua família não
quiseram dar declarações oficiais
sobre o assunto.
A polícia de Jersey também não
respondeu aos e-mails enviados
pela reportagem.
A presidente do Coaf, Adrienne
Senna, disse que todas as informações recebidas pelo conselho
de controle estão cobertas por sigilo, segundo os acordos internacionais firmados pelo Brasil. Ela
se recusou a falar sobre casos específicos.
O promotor Marcelo Mendroni, que cuida dos casos de lavagem de dinheiro no Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado),
confirmou que mantém contato
com a polícia de Jersey, mas informou que o conteúdo de suas negociações não pode ser revelado,
em virtude do sigilo das investigações sobre contas bancárias.
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