São Paulo, quarta-feira, 10 de outubro de 2001

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MATO GROSSO DO SUL

Governador gastou R$ 911 mil para viajar pelo país em 2000

Zeca do PT usa verba secreta com viagens e informantes

RUBENS VALENTE
DO PAINEL

FABIANO MAISONNAVE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE

O governador de Mato Grosso do Sul, José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT, usou um fundo de natureza secreta em dez viagens que fez no país no ano passado, gastando em média R$ 26 mil em cada uma, segundo documentos obtidos pela Folha.
Com outro fundo confidencial, o governo construiu uma rede de informantes pelo Estado, remunerando líderes comunitários e presidentes de associações de bairros, sob o argumento de combater a violência e o narcotráfico.
O valor médio de cada viagem de Zeca corresponde a 45 passagens aéreas de Campo Grande para o Rio de Janeiro na tarifa mais cara da Varig. Ou a 17 viagens de ida e volta para o Rio com dois dias de estadia num hotel quatro estrelas, segundo cálculo de uma das três maiores operadoras de turismo do país. Das dez viagens, seis foram para cidades que ficam a 271 km da capital, em média.
Por meio de um Suprimento de Fundos de Caráter Secreto e Reservado, Zeca do PT desembolsou R$ 911 mil nas viagens -R$ 575 mil em transporte, hospedagem e alimentação, R$ 295 mil em despesas com cerimonial no decorrer dos deslocamentos e R$ 40 mil em gastos com sua residência- no ano passado.
Segundo o governo, o suprimento, previsto em lei, é reservado por envolver a segurança do governador. Diferentemente dos outros, a prestação de contas é assinada diretamente pelo secretário de Governo e os comprovantes dos gastos não são públicos.

Informantes
Documentos das outras despesas confidenciais, obtidos pela CPI da Segurança Pública da Assembléia Legislativa do MS, mostram que a rede de informantes não é identificada nominalmente, mas apenas por números. A CPI contabilizou um gasto de R$ 435 mil com informantes, que recebem em média R$ 3.000 por ano.
Questionada por deputados da oposição, a Secretaria de Estado de Segurança Pública disse, por meio de ofício assinado pelo superintendente de Administração e Finanças, Francisco José Soares Barroso, que os informantes podem ser marginais e ex-marginais, como seria comum em outros Estados, mas também líderes comunitários "ou que presidam uma associação de moradores e, sem dúvida, alguém que auxilia a segurança pública motivado por um elevado sentimento cívico".
Segundo o representante do governo, os informantes repassam dados "de interesse da segurança pública" e relativos "a um determinado assunto específico".
Francisco Barroso afirmou no ofício que o governo passou a "cooptar cidadãos no meio da comunidade das mais diversas localidades" numa estratégia de combate à violência e ao narcotráfico.
O coordenador de comunicação do governo, Ronaldo Franco, disse ontem que uma das principais tarefas dos informantes é "passar informações sobre a situação dos sem-terra, para evitar problemas" em operações de desocupação de áreas invadidas.

Sobrinho
As despesas com viagens e residenciais do governador foram ordenadas pelo sobrinho e braço direito de Zeca, Vander Loubet, à época secretário de Governo e hoje presidente estadual do PT e secretário de Habitação e Infra-estrutura, e pelo deputado federal licenciado Ben-Hur Ferreira (PT), atual secretário de Governo.
Do total, o governo detalhou as despesas referentes a R$ 400 mil, em dois relatórios encaminhados ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). O governo desembolsou, por exemplo, R$ 132,4 mil para Zeca ir a cinco cidades. Em Brasília, encontrou-se com os ministros da Agricultura, Pratini de Moraes, e dos Transportes, Eliseu Padilha. No Rio de Janeiro, teve uma audiência com a vice-governadora, Benedita da Silva. Participou em Porto Alegre (RS) do Fórum Social Mundial. Em Dourados (a 228 km de Campo Grande), lançou um programa de recuperação de estradas. E foi a Ponta Porã (338 km de Campo Grande), por motivo não explicado.

Recepções
Em outro período do ano passado, Zeca gastou R$ 128 mil para ir a São Paulo "dar entrevistas" e receber o Prêmio Top 2000, promovido pela ADVB (Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil), e a Dourados, Rio Verde (195 km da capital), Bataguassu (341 km) e Chapadão do Sul (300 km), para lançar programas.
As despesas com a residência incluem almoços e jantares oferecidos a autoridades. Zeca gastou R$ 10 mil em recepções ao presidente da CEF (Caixa Econômica Federal), Emílio Carazzai, ao presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Hamilton Casara, e à secretária de Estado de Assistência Social do governo federal, Wanda Engel.
Segundo o governo, as recepções são feitas na própria casa do governador porque o Estado não tem residência oficial. Zeca é o principal aliado do presidente Fernando Henrique Cardoso entre os governadores de oposição.


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