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MEMÓRIA
Ex-guerrilheira é homenageada pela FAB
Piloto da 2ª Guerra reencontra salvadora
RICARDO BONALUME NETO
especial para a Folha
Levou mais de meio século para a italiana Franca Decima, 75,
rever o piloto brasileiro Joel Miranda, 87, que ela ajudou a salvar
de ser capturado pelos alemães
durante a Segunda Guerra Mundial. Mas, 54 anos depois, ela não
só voltou a ver o então capitão-aviador, como também recebeu
a medalha Mérito Santos-Dumont, concedida pela Força Aérea, em cerimônia ontem no 4º
Comar (Comando Aéreo Regional), em São Paulo.
Sem ela, é provável que o ex-piloto do 1º Grupo de Caça -a
mais tradicional unidade da FAB
(Força Aérea Brasileira)- tivesse sido morto ou capturado pelos alemães.
Franca e outros guerrilheiros
-"partigiani"- esconderam
Joel desde que ele foi abatido pela artilharia antiaérea em Castelfranco, em 4 de fevereiro de 1945,
até o final da guerra, em maio.
Joel Miranda era o comandante da esquadrilha "amarela",
composta por quatro aviões. Estavam atacando uma estação ferroviária quando dois dos caças
P-47 Thunderbolt foram abatidos -Joel e Danilo Moura, irmão do comandante do grupo,
major Nero Moura.
Os aviões estavam em altitude
baixa, entre 300 e 400 metros,
quando foram atingidos.
Tiveram que tentar subir o que
ainda fosse possível para poderem usar o pára-quedas. Mesmo
assim, ficaram feridos na queda.
Danilo também conseguiu escapar de ser feito prisioneiro.
"Eu não fiz nada de especial,
naqueles anos eu trabalhava pelo
meu país, era uma combatente
antifascista", disse ela, emocionada, ao agradecer a medalha e a
sua inclusão na seleta lista de
membros honorários do Grupo
de Caça e da própria FAB.
Franca e seus companheiros da
"brigata" de guerrilheiros seriam
sumariamente mortos pelos alemães se fosse descoberto que escondiam um oficial aliado.
Apesar desse perigo constante,
eles chegaram a levar Joel a um
hospital controlado pelos alemães, pois ele tinha fraturado
um braço e luxado um pé.
"Era perigoso, mas ele parecia
italiano, ao contrário dos outros
aliados", disse ela. Mas para permitir o uso do raio X para checar
a fratura de Joel foi preciso que as
freiras do hospital inventassem
um chá da tarde para distrair os
médicos alemães.
A semelhança física e o fato de
falar um pouco de italiano fizeram Joel escapar de ser aprisionado mesmo quando sargentos
alemães o encontraram de noite
sem documentos. Ele conseguiu
convencê-los de que tinha esquecido os papéis em casa.
Episódios rocambolescos não
faltaram na história. Quase no final da guerra, a casa de Franca
foi ocupada por um destacamento de operadores de rádio
alemães, que ali instalaram uma
antena mais alta que o telhado.
"O Joel me disse: "Se os aviões
aliados enxergarem isso, vão
querer nos bombardear'", lembra ela hoje, rindo.
Os dois escaparam de serem alvo das forças aéreas aliadas, mas
a casa acabou sendo atacada pelos guerrilheiros, que aprisionaram os alemães depois de um
curto combate.
Joel e Franca voltaram a se ver
depois de mais de meio século
graças às pesquisas da italiana
Maria Antonieta Michieletto,
empenhada em registrar declarações de ex-guerrilheiros antifascistas. Ela colocou os dois em
contato no ano passado, e Franca veio agora ao Brasil rever o
amigo de 54 anos atrás.
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