São Paulo, domingo, 11 de novembro de 2001

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CASO PATAXÓ

Sentença foi anunciada às 4h15 de ontem; defesa anunciou que vai recorrer e índios comemoraram a decisão

Jovens são condenados a 14 anos de prisão

SILVANA DE FREITAS
LEILA SUWWAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A juíza Sandra de Santis anunciou às 4h15 de ontem a condenação dos quatro responsáveis pela morte do índio pataxó Galdino Jesus dos Santos a 14 anos de prisão por homicídio doloso (com intenção) triplamente qualificado.
Os quatro -Max Rogério Alves, Antônio Novely Vilanova, Eron Chaves de Oliveira e Tomás Oliveira de Almeida- ouviram a sentença de mãos dadas e cabeça baixa. Seus parentes choravam.
Vilanova é filho de um juiz federal e Alves teve como advogado seu padrasto, ex-ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Os acusados acompanharam os quatro dias de júri cabisbaixos e com as mesmas roupas, benzidas pelas famílias. A defesa defendeu a tese de lesão corporal seguida de morte, cuja pena máxima é de 12 anos. No caso do homicídio doloso triplamente qualificado, a pena máxima é de 30 anos.
Os advogados da defesa anunciaram que irão entrar com recurso para que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal reveja a decisão. Os índios consideraram justa a punição. "Fiquei satisfeita", disse Carmélia, viúva de Galdino.
Os jurados consideraram, por cinco votos contra dois, que os rapazes assumiram o risco de provocar a morte do índio quando jogaram álcool e atearam fogo nele, em 20 de abril de 1997.
Tecnicamente, isso significa que, para o júri, eles tiveram a intenção, ainda que eventual, de praticar o crime (dolo).
Com base na decisão do júri, coube à juíza arbitrar a pena. Na sentença, ela criticou o "desprezo com os semelhantes" e disse que eles tiveram várias oportunidades de interromper o plano de queimar Galdino desde o momento em que compraram o álcool.
Raul Livino, advogado de dois dos réus, afirmou que os quatro choraram ao ouvir a sentença. Eles estavam de costas para a platéia. No momento em que a juíza lia a decisão, a mãe de Novely estava em pranto convulsivo. Ao final, outras 12 pessoas choraram.
A platéia, de cerca de 350 pessoas, dividiu-se entre palmas e vaias. Os aplausos partiram de índios, mas foram seguidos por vaias de estudantes de direito, curiosos e familiares dos rapazes.
Pesou no veredicto a exaustiva exploração, pela acusação, de contradições da tese da defesa e dos depoimentos dos réus e a exibição de imagens do corpo de Galdino, que teve 95% de queimaduras graves: 85% de terceiro grau e 10% de segundo grau.
As contradições mais destacadas foram o suposto uso de cobertor pelo índio e a quantidade de álcool derramada sobre seu corpo. A defesa sustentou que havia cobertor e que o álcool tinha sido apenas gotejado, o que reforçaria o argumento de que os réus só queriam dar um susto no homem que dormia na parada de ônibus.
Os depoimentos de testemunhas da acusação contrariaram essa versão, particularmente o relato da médica Maria Célia Bispo, que socorreu o pataxó. Ela relatou conversa em que Galdino teria afirmado não dispor de cobertor.
Se a sentença for mantida, os quatro rapazes terão de ficar aproximadamente mais três anos na prisão. Isso porque eles estão detidos há quatro anos e meio, desde o dia do crime, e poderão solicitar liberdade provisória após o cumprimento de pelo menos dois terços da pena.
Como a condenação foi de 14 anos de prisão, isso significa que terão de cumprir nove anos e quatro meses antes de solicitar o benefício, mas poderão descontar um dia a cada três trabalhados.
Eles estão há três anos trabalhando no Núcleo de Custódia. Por isso, os quatro anos e meio de prisão foram convertidos em cinco anos e dois meses. Em três anos, ganhariam um ano adicional pelos dias trabalhados.
O homicídio qualificado é crime hediondo e não permite benefícios como o regime semi-aberto.
A pena foi arbitrada pela juíza uma hora depois de os sete jurados decidirem as questões técnicas por meio de resposta a dez quesitos apresentados.
Depois de aprovar o homicídio doloso, o júri considerou que houve três qualificadores que tornaram o crime mais grave: o motivo torpe (brincadeira), a crueldade (uso de fogo) e a impossibilidade de defesa por parte da vítima (que estava dormindo).
Foram considerados atenuantes a confissão após a prisão, no dia do crime, e o fato de eles terem entre 18 e 21 anos na época.
O quinto jovem que ateou fogo em Galdino foi processado separadamente porque era menor. Ele já está em liberdade.




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