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ANÁLISE
É preciso ir além das aparências
MARCELO LEITE
EDITOR DE CIÊNCIA
Que uma das primeiras confirmações do gabinete Lula seja a de
Marina Silva para o Ministério do
Meio Ambiente (MMA) decorre
provavelmente de uma espécie de
unanimidade. Símbolo da resistência da população pobre à ocupação predatória da Amazônia,
assim como seu conterrâneo Chico Mendes, e vinda de uma atuação consistente no Senado no
campo das questões ambientais,
Marina Silva tem as credenciais e
a biografia para agradar a todos
-dentro e fora do PT e do Brasil.
Não é a primeira vez que se elege uma unanimidade para o
MMA, pasta-chave para a imagem do Brasil no exterior. Fernando Collor empossou o igualmente premiado José Lutzenberger no que então ainda era uma
secretaria ligada à Presidência.
Não deu certo. Na véspera da Eco-92, e ainda por cima em Nova
York, "Lutz" disse que era besteira os outros países darem dinheiro para nações subdesenvolvidas
como o Brasil preservarem o ambiente, porque os recursos acabariam nas mãos de políticos corruptos. Caiu no dia seguinte.
Marina Silva obviamente tem
muito mais traquejo político do
que tinha Lutzenberger. O mesmo se pode dizer de José Sarney
Filho, que ocupou o cargo no segundo governo Fernando Henrique Cardoso. Ter um ministro
que se relacione tão bem com políticos quanto com organizações
não-governamentais (ONGs) não
é, porém, garantia de que as questões ambientais terão o devido
peso na ação do governo.
Para que isso ocorra, além de
uma liderança incontestável no
MMA, é preciso que a idéia de
sustentabilidade perpasse todos
os setores do governo, sobretudo
o de planejamento. Pouco adianta
ter lá uma personalidade, se sua
função se reduzir a mitigar efeitos
adversos de políticas de desenvolvimento incompatíveis com a
preservação da Amazônia -ou
do cerrado, do Pantanal, da mata
atlântica- pensadas e decididas
pelos vizinhos da Esplanada, sem
participação real do MMA.
No caso do governo FHC, essa
contradição só não deu em coisa
pior porque a crise econômica
impediu a implementação do plano desenvolvimentista Avança
Brasil. Sua primeira versão passou longe do MMA, até que estudos de pesquisadores brasileiros e
estrangeiros denunciaram o potencial destruidor dos eixos de
crescimento, em particular na
Amazônia. Um deles previa que
levar a cabo a recuperação e a pavimentação de apenas quatro estradas previstas no Avança Brasil
poderia induzir o desmatamento
de 180 mil km2 na Amazônia.
O MMA foi então incorporado à
discussão, e o programa, reformulado. Só que, aí, o estrago à
imagem já estava feito.
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