São Paulo, sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

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Ministro do "nada a declarar", Armando Falcão morre aos 90

Titular da Justiça nos governos JK e Geisel morreu em sua casa, no Rio de Janeiro, vítima de uma broncopneumonia<

Ele comandou a elaboração do "Pacote de Abril", com alterações eleitorais para tentar frear o avanço da oposição ao regime militar


DA SUCURSAL DO RIO

Criador da lei que limitava a propaganda eleitoral na TV a exibição de foto com narração do currículo do candidato para evitar críticas à ditadura militar, morreu anteontem Armando Ribeiro Severo Falcão, 90, ministro da Justiça nos governos de Juscelino Kubitschek (1956-1961) e de Ernesto Geisel (1974-1979).
Vítima de broncopneumonia, Falcão - que tinha "nada a declarar" como expressão predileta durante o regime de exceção- morreu por volta das 23h30, em sua casa, na zona sul do Rio. Foi enterrado ontem no cemitério São João Batista, em cerimônia restrita a familiares.
Segundo amigos, Falcão gostava de relembrar os tempos em que atuou na política nacional. "Foi um homem público que teve a sua marca. Era um contador de histórias", disse José Armando Bezerra Falcão, um dos seis filhos do ministro.
"Era um homem lúcido, que gostava de fazer recordações. Uma pessoa de agradável convivência", afirmou o general Leônidas Gonçalves, ministro do Exército no governo Sarney, que diz ter passado a ter contato com Falcão só após o afastamento de ambos da política.
Na avaliação da cientista política Maria Celina D'Araújo, Falcão "é um personagem que nos ajuda a refletir o Brasil".
"É uma figura para entender que não tivemos uma ditadura militar. Foi militar com uma vertebração civil muito forte. Nela, ele foi o nervo central, foi a expressão civil mais acabada do golpe e do governo. Ele foi o porta-voz da linha-dura até o final", disse ela.
Armando Falcão era cearense de Fortaleza. Foi um dos articuladores da candidatura de JK à Presidência e depois ministro da Justiça de seu governo entre 1959 e 1961. Voltou ao posto no governo Geisel.

Lei Falcão
A pedido do então presidente, comandou a elaboração do projeto de lei para a fusão dos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro, que passaria a vigorar em 15 de março de 1975, e o conjunto de leis que se tornou conhecido por "Pacote de Abril", de 1977, com alterações eleitorais para tentar frear o avanço dos candidatos de oposição ao regime militar.
Entre elas estava a chamada Lei Falcão, regulamentação da propaganda eleitoral no rádio e na televisão que, para impedir críticas em meios de massa ao governo, limitava os candidatos a exibirem foto e currículo.
Em 1989, publicou um livro de memórias com o título, "Tudo a Declarar" (Nova Fronteira), gracejo com a frase "nada a declarar", que caracterizara sua relação com a imprensa quando ministro de Geisel e se recusava a comentar o que considerasse confidencial ou polêmico.

Democracia e censura
Em entrevistas à época do lançamento, expôs sua visão do poder, na qual dizia-se um democrata a seu modo: "Democrata que não dorme de touca. Democrata que defende a democracia, sem deixar o inimigo dela segurar o cabo da faca."
Tendo comandado a censura a diversos órgãos de imprensa, dizia-se contrário à reimplantação eventual de qualquer restrição desse tipo. "Porque é impossível fazer uma censura política adequada, satisfatória e aceitável. Em segundo lugar, porque a censura impede a fiscalização pela imprensa da administração pública."
Ainda em 1989, instado a comentar a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência na eleição daquele ano, criticou duramente o petista. "Um cidadão inteiramente despreparado para o exercício do posto", afirmou então.


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