São Paulo, domingo, 12 de março de 2000


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Descendentes invadem área que pertencia a ex-escravos

da enviada a Nossa Senhora de Livramento


A Comunidade de Mata Cavalo já foi reconhecida pela Fundação Palmares como remanescente de quilombo, mas ainda não recebeu o título definitivo da terra.
A comunidade está em uma área denominada Sesmaria Boa Vida, próxima ao município de Nossa Senhora do Livramento, a 50 quilômetros de Cuiabá (MT).
A invasão do terreno foi a única solução encontrada pelos descendentes para tentar garantir a posse de uma área que havia sido doada a ex-escravos, em 1883.
De acordo com o Relatório Histórico Antropológico elaborado pelo Departamento de História da Universidade de Cuiabá, a Comunidade de Mata Cavalo começou a ser desestruturada nos anos 40, quando a terra em que viviam os negros foi valorizada e invadida por grileiros e garimpeiros.
Os descendentes foram expulsos ou pressionados a vender as terras. A maioria se mudou para as cidades próximas (Livramento, Várzea Grande e Cuiabá).
Em 1996, os descendentes da geração expulsa de Mata Cavalo invadiram parte da área da sesmaria Boa Vida como forma de pressionar o Estado e garantir a posse da terra.
Em 1998, o então governador do Mato Grosso, Dante de Oliveira, reconheceu a área como remanescente de quilombo. O reconhecimento público, porém, não teve nenhum valor legal. A comunidade espera o título definitivo da terra, que só pode ser concedido pelo governo federal.
Desde que invadiram o local, os habitantes de Mata Cavalo já enfrentaram vários problemas, como ameaças de fazendeiros e de garimpeiros.
Os garimpos se alastraram e invadiram até o cemitério de Mata Cavalo, destruindo parte da memória dos descendentes. Lá estão enterrados, por exemplo, os pais de Antônio Mulato, que eram filhos de escravos.
"Temos de enterrar uma pessoa em cima da outra", conta a neta de Antônio Mulato, Gonçalina Eva de Almeida, 22.
As crianças estudam juntas em uma escola construída pelos próprios habitantes. A professora é Gonçalina, que, além de alfabetizar, ensina aos alunos a história da escravidão sob o ponto de vista dos negros e a história dos fundadores do quilombo.
Neste ano, a comunidade vai lançar um candidato a vereador, Airton Conceição de Arruda. Ele conta que as crianças de Mata Cavalo sofrem preconceito na escola e são chamadas de "sem-terra".
Os fazendeiros ouvidos pela Folha negaram que exista conflito. Crescêncio Maciel Monteiro, 78, disse que, hoje, a maioria dos proprietários aceita sair das terras, desde que receba a indenização do governo federal. (DN)

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