São Paulo, domingo, 12 de maio de 2002

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SOMBRA NO TUCANATO
Não dá para ser tão cordato assim com Lula, avalia presidente
Para FHC, Serra enfrenta o pior momento da campanha

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso avalia que o pré-candidato tucano ao Palácio do Planalto, o senador José Serra, enfrenta o pior momento da campanha. Para FHC, esse período crítico, no qual há hipótese remota de Serra ser substituído, durará até 15 de junho, dia das convenções do PSDB e do PMDB para oficializá-lo como candidato da aliança.
A Folha apurou que, pela primeira vez em muito tempo, FHC está "soturno", "preocupado" e "abatido", segundo descrição de políticos com os quais se encontrou nesta semana. O presidente acha que Serra tem errado muito.
A um interlocutor, FHC disse: "A diferença entre mim e o Serra é que sou estratégico e ele é tático". Ou seja, o presidente prefere perder uma batalha se isso for importante para a guerra. Já Serra pensaria mais no curto prazo, comprando brigas menos importantes para chegar ao objetivo de longo prazo, como querer impor o nome do vice ao PMDB em vez de aceitar logo a indicação do partido para segurá-lo de vez.
Para FHC, Serra e auxiliares são de uma inabilidade ímpar, esvaziando o efeito das articulações do presidente para proteger o final de mandato e ajudar o pré-candidato a evitar que o fogo amigo se transforme na ruína de ambos.

Guerra suja
Na quarta-feira, o presidente ficou contrariado ao saber que serristas ameaçaram dinamitar os tucanos Tasso Jereissati, ex-governador do Ceará, e Aécio Neves, presidente da Câmara, em menos de 15 dias de campanha caso um dos dois venha a substituir Serra como candidato.
FHC disse a Serra que ele e auxiliares estavam dando um sinal de insegurança e de inabilidade política ao disparar tiros para dentro do PSDB no momento em que ambos estão acuados pelas suspeitas que pairam em torno da relação do tucanato com Ricardo Sérgio de Oliveira, ex-diretor do Banco do Brasil.
Ricardo Sérgio arrecadou recursos para campanhas eleitorais de FHC (1994 e 1998) e de Serra (1990, 1994 e 1996).
Para FHC, é dificílimo e inconveniente trocar Serra porque a leitura seria de derrota pessoal sua. Desde que o ministro Pedro Malan (Fazenda) saiu do páreo presidencial, recusando-se a se filiar ao PSDB em tempo hábil para eventualmente ser candidato, FHC jogou todas as fichas em Serra.
O presidente insistiu tanto para Malan se colocar à disposição porque já avaliava que os atritos que Serra sempre criou em sua carreira política recomendavam uma saída de emergência.
Agora, sem poder recorrer a Malan, FHC não moverá uma palha para derrubar Serra. Muito pelo contrário. Quer viabilizá-lo. No entanto, o presidente já começa a manifestar dúvida em relação à chance de seu preferido.
Um sinal é a avaliação presidencial de que não dá mais para ser tão cordato assim com Luiz Inácio Lula da Silva, presidenciável do PT que disparou nas pesquisas. No governo e no PSDB, há quem tema uma vitória petista no primeiro turno.
Os tucanos Tasso e Aécio são um exemplo. Em almoço na quarta, concluíram que, no atual ritmo de campanha, Lula pode conquistar a Presidência na primeira fase.
Aécio e Tasso também julgaram que o clima de guerra suja é estimulado por serristas e que, nesse cenário, o PSDB tende mais a perder por ser governo federal.
O ex-governador do Ceará chamou de "aliados da onça" os serristas que espalharam que ele havia estimulado o irmão, Carlos Jereissati, a declarar à revista "Veja" que dera R$ 2 milhões para a campanha de Serra em 1994. À Folha, Carlos Jereissati disse que o valor era de R$ 700 mil. Serra, porém, disse que recebeu apenas R$ 95 mil, montante registrado na prestação de contas à Justiça Eleitoral.
A queixa de Tasso chegou a FHC, bem como uma manifestação de Aécio, outro tucano que entrou na mira dos serristas por ser uma alternativa presidencial.
Em relação a Aécio, serristas disseram que ele estimulara Paulo Renato Souza, ministro da Educação, a confirmar o suposto pedido de propina de R$ 15 milhões feito por Ricardo Sérgio para ajudar o empresário Benjamin Steinbruch a formar o consórcio que arrematou a Companhia Vale do Rio Doce, privatizada em 1997.
Detalhe: Aécio, que se encontrou com Paulo Renato dias antes de a reportagem ser publicada, só soube do caso no sábado, quando a revista já estava nas bancas.
"Esse clima de briga é muito ruim. O Serra precisa agregar politicamente", diz Tasso. Apesar de dizer que "o PSDB tem vários nomes" que poderiam substituir Serra, o ex-governador do Ceará diz que não acredita nessa possibilidade. "A candidatura é irreversível e, mesmo que não fosse, eu não seria candidato", diz.

Escudo
O presidente FHC também acionou um "escudo humano" para encampar a indicação de Ricardo Sérgio, tentando afastá-lo dos verdadeiros patronos de sua ida para a diretoria da área internacional do Banco do Brasil: Serra e Sérgio Motta, ministro das Comunicações que morreu em 1998.
Atribui-se a Carvalho, ex-chefe da Casa Civil, a indicação de Ricardo Sérgio para o BB, mas essa versão cai por terra em conversas reservadas com o tucanato.
Atualmente, é Carvalho, cumprindo missão para proteger Serra e FHC, que tem estabelecido canais de comunicação com Ricardo Sérgio, acalmando-o e garantindo que não será abandonado pelo Palácio do Planalto.
Quem conversa com Ricardo Sérgio sempre escuta a seguinte expressão para definir sua participação no processo de privatização: "missão de governo".
Ricardo Sérgio nunca privou da intimidade de FHC, mas sempre teve a confiança de Motta e Serra.
Também foram acionadas pessoas próximas a Benjamin Steinbruch a fim de obter do empresário um compromisso, o de que ele não poria lenha na fogueira.
O governo teme que Steinbruch, como fizeram Paulo Renato e o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, confirme a história da suposta propina pedida por Ricardo Sérgio. Até sexta ele continuava se negando a dar entrevistas.



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