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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"
Em reunião com 40 deputados, em 2004, Roberto Jefferson consultou a bancada sobre suposta oferta em troca de apoio ao governo
PTB se reuniu para discutir "mensalão"
RUBENS VALENTE
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O "mensalão", denunciado pelo
deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) em entrevista publicada pela Folha na última segunda-feira chegou a ser avaliado e
recusado pela bancada do PTB na
Câmara em 2004.
A assessoria de imprensa de Jefferson informou, após ouvir o deputado, que ele "pôs a voto na
bancada" dos petebistas, em fevereiro de 2004, a proposta que lhe
chegou: permitir que deputados
do seu partido recebessem uma
quantia fixa mensal em troca de
apoio ao governo federal. "Se tivessem aceito o "mensalão", ele teria renunciado à presidência do
partido", informou a assessoria.
Três deputados do PTB ouvidos
pela reportagem confirmaram
que Jefferson, há mais de um ano,
fala aberta e criticamente sobre o
"mensalão" com seus colegas na
sigla. Um deles, o deputado federal Pedro Fernandes (MA), disse
que Jefferson "pôs em discussão"
a possibilidade na bancada, mas
houve uma recusa "unânime".
"Não foi propriamente uma votação. Foi uma decisão. [Jefferson] disse o seguinte: "Eu não
aceitei. O que que vocês acham?" E
ninguém concordou", disse Fernandes.
A reunião teria sido feita com
mais de 40 deputados federais do
PTB. Segundo o deputado, Jefferson não chegou a dizer claramente quem seria o autor da oferta do
"mensalão", mas ela surgiu num
momento em que o partido enfrentava problemas para nomear
indicados nos Estados devido à
oposição que o próprio PT fazia,
regionalmente, aos nomes sugeridos pelo PTB.
Loteamento
A estratégia de lotear os cargos
nos Estados teria sido lançada pelo Palácio do Planalto, mas no ano
passado se "tornou ruim", segundo Pedro Fernandes, porque muitas nomeações acabaram não se
efetivando: "Cada deputado podia indicar um ou dois cargos".
Com o insucesso do loteamento, na versão do deputado, Roberto Jefferson reuniu os petebistas
para apresentar uma nova proposta governamental. "Ele disse:
"Olha, o que eles estão fazendo
não é isso. O que eles estão querendo dar é um salário, um "mensalão", para os deputados. Com isso aí eu não concordo. Vocês concordam?" Ninguém concordou",
disse o deputado Fernandes.
Além dessa reunião em que o
debate se tornou mais aberto, Jefferson fez referências ao "mensalão" em outras oportunidades no
partido. Era contrário e deixava,
nas entrelinhas, a possibilidade de
denunciar a prática.
"Em pelo menos duas reuniões
ele disse que nunca aceitaria
"mensalão'", disse o deputado federal Osmânio Pereira (PTB-MG). "Ele sempre dizia isso, "olha,
não levarei o partido para o "mensalão". Nisso ele sempre foi bem
claro", contou o deputado Pedro
Fernandes.
Cooptação
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que há um mês deixou o PTB,
tem uma versão mais incisiva sobre essas advertências de Roberto
Jefferson. "Ele ameaçou denunciar o "mensalão". Disse assim, "se
tentarem cooptar deputado meu
em cima de mesadas, eu vou denunciar'", afirmou o deputado.
O ex-petebista disse que, no ano
passado, foi procurado por petistas, cujos nomes preferiu não revelar, com a proposta de integrar
a base aliada em troca de poder
indicar um cargo para a administração do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. O deputado disse ter recusado a oferta.
Campanha
Sobre o "mensalão", Bolsonaro
afirmou que, desde o ano passado
correm boatos do gênero nos corredores do Congresso Nacional:
"Desde que Lula assumiu, tem esse boato aqui dentro. Mas eu não
vou ser o "bocão" para denunciar
quem está recebendo".
De acordo com Osmânio Pereira e Bolsonaro, os avisos de Jefferson de que não aceitaria o "mensalão" teriam ocorrido logo após
a revista "Veja" ter divulgado, em
setembro de 2004, que o PTB e o
PT fecharam um acordo pelo qual
os petistas dariam R$ 10 milhões
ao partido de Jefferson em troca
de apoio nas eleições municipais.
Na época, Jefferson afirmou que o
pedido de ajuda financeira foi feito apenas para a campanha de Recife (PE), no valor de R$ 1,5 milhão. O PT não teria cumprido a
suposta promessa.
Origem do dinheiro
Ao falar em público sobre o
"mensalão", Roberto Jefferson
deixou de esclarecer qual seria a
origem do dinheiro para os pagamentos aos congressistas.
Nos bastidores do Congresso,
várias explicações surgiram. Uma
delas, ressaltada por Jefferson em
sua entrevista à Folha na última
segunda-feira, é sobre a participação do tesoureiro do PT, Delúbio
Soares -que foi procurado para
se manifestar a respeito desse tema, mas recusou-se a comentar.
Contato
No início do governo Lula, em
2003, vários empresários que tinham negócios com a administração federal passaram a procurar o Palácio do Planalto e os ministérios. Queriam saber como
deveriam proceder a respeito dos
contratos em andamento e dos
que poderiam surgir.
Muitos desses homens de negócios eram encaminhados a Delúbio Soares. Os encontros eram em
hotéis paulistanos, notadamente
no Sofitel próximo ao parque Ibirapuera. O tesoureiro do PT tinha
o hábito de marcar as reuniões
para o horário do café da manhã.
Um desses empresários, que pediu para não ter seu nome revelado, compareceu ao hotel determinado. Logo apareceu Delúbio
Soares. Falaram objetivamente
por cerca de 15 minutos.
Rodízio
O tesoureiro do PT então se levantou e o convidado se espantou: o petista dirigiu-se a uma mesa próxima para conversar com o
que parecia ser outro empresário.
E, 15 minutos depois, seguiu para
a terceira mesa.
Nada foi pago nem pedido nesse encontro, até onde a Folha pôde apurar. O empresário só contou a história até esse ponto. Delúbio falava que o governo petista
trataria de maneira equânime todas as empresas com demandas
dentro do governo federal. Mas ficava sempre um certo clima de
cobrança, pelo fato de a conversa
ser com o tesoureiro petista, e não
com alguém do Poder Executivo.
Esses encontros no atacado de
Delúbio com empresários durante o café da manhã em hotéis paulistanos foram freqüentes ao longo de 2003.
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