São Paulo, terça-feira, 12 de julho de 2005

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MALAS SUSPEITAS

Total detido em aeroporto com deputado pefelista, bispo da Universal, chega a R$ 10,2 milhões

PF apreende 7 malas de dinheiro com deputado

SILVIO NAVARRO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Polícia Federal apreendeu ontem, em Brasília, sete malas de dinheiro com mais de R$ 10,2 milhões que estavam em poder do deputado federal João Batista Ramos (PFL-SP), bispo da Igreja Universal do Reino de Deus. Ele estava em avião particular, no hangar da TAM, e se preparava para decolar rumo a São Paulo.
Depois de passar dez horas e meia contando o dinheiro, às 21h30 a PF divulgou o total apreendido: R$ 10.202.690.
O deputado João Batista passou o dia na Superintendência da Polícia Federal em Brasília, onde prestaria esclarecimentos, juntamente com outras seis pessoas que o acompanhavam na viagem.
O transporte do dinheiro, que, segundo o deputado, é fruto do dízimo recolhido dos fiéis, foi abortado por causa de uma denúncia anônima.
Na noite de ontem, o delegado David Sérvulo Campos, chefe da Delegacia de Crimes Financeiros, disse que encaminharia o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) por envolver um deputado federal. Caberá ao tribunal avaliar se instaura inquérito para apurar se foram praticados os crimes de lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, crime contra a ordem tributária e contra o sistema financeiro.
A base da suspeita é que o único documento apresentado pelo deputado para justificar a origem e a legalidade do dinheiro é uma declaração da igreja, assinada pelo próprio deputado, que é o presidente da instituição. O documento diz que o dinheiro resulta do dízimo, mas não faz referência ao valor transportado. Nem o parlamentar soube dizê-lo de pronto.
Segundo o delegado, as explicações dadas pelos acompanhantes do deputado são "insuficientes": "Não recebemos nenhuma comprovação veemente de que o dinheiro seja da Universal".
As malas de viagem estavam lotadas de cédulas de diversos valores - variavam de R$ 5 a R$ 100. O volume de dinheiro era tão grande que foram requisitadas do Banco do Brasil cinco máquinas para contagem de cédulas, duas das quais tiveram problemas.
O advogado Sebastião da Costa Val, que acompanhava o deputado, disse que "não existe nenhuma ilegalidade", que "o dinheiro não é dele [do deputado]" e seria encaminhado para São Paulo. À noite chegaram à PF quatro advogados da Igreja Universal que vieram de São Paulo à Brasília tentar a liberação do dinheiro.

Vigias de dinheiro
No final da tarde, a PF deteve onze homens armados -oito pistolas e dois revólveres- na área externa das instalações da Superintendência. São policiais militares -dez do Distrito Federal e um de Goiás- que, à paisana, prestavam serviço de segurança para a Rede Record (braço de comunicação da igreja). Disseram que escoltavam o deputado e vigiavam o dinheiro apreendido.
Os documentos dos dois carros nos quais estavam os supostos seguranças estão em nome da Igreja Universal. A jornada dupla de policiais militares é irregular e eles deverão ser alvo de processo administrativo na corporação.
A Folha tentou contatar a Universal no início da noite de ontem, mas ninguém atendeu às chamadas. Sobre as malas, eles divulgaram uma nota na qual afirmam que a origem de dinheiro foi a coleta de doações dos fiéis por ocasião de cerimônias celebradas no dia 9 de julho, em comemoração aos 28 de fundação da Universal.

Primeiro mandato
Antes de chegar ao Congresso, em 2002, Ramos foi diretor-presidente da Rede Mulher de Televisão e da Rede Record. Economista, exerce seu primeiro mandato.
De acordo com a PF, Ramos e o grupo viajariam para Goiânia e, na sequência, seguiriam para São Paulo num jatinho arrendado pela igreja por US$ 90 mil mensais. Antes de pousar em Brasília, o avião passou por Manaus (AM) e Belém (PA). O contrato com a TAM é somente para atendimento e abastecimento da aeronave em solo, o que aconteceu uma hora antes da batida policial.
Todas as sete malas possuíam papéis indicando diferentes cidades, mas a PF não informou se os nomes indicariam a origem e o destino do dinheiro.
Segundo informaram a assessoria de imprensa da PF e o assessor jurídico da Câmara dos Deputados, Marcos Vasconcelos, o parlamentar teria permanecido na superintendência por sua livre e espontânea vontade. O dinheiro será depositado em uma conta judicial, segundo disse a PF.

PFL
Em reação para conter os danos à imagem do partido, o PFL convocou para hoje uma reunião extraordinária da Executiva para analisar o afastamento ou até a desfiliação de João Batista.
Após os esclarecimentos feitos pelo senador Marcelo Crivella (PL-RJ), em nome da Igreja Universal, sobre a origem e o destino do dinheiro, a principal preocupação do partido era se desvincular ao suposto "mensalão", denúncia de pagamento de mesadas, em malas de dinheiro, a deputados da base aliada.
Para isso, os membros do partido querem pedir que o deputado se licencie do PFL durante as investigações.
Segundo o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), a Executiva irá analisar tecnicamente se o deputado está envolvido em algum ilícito e já pediram à PF cópia do auto de apreensão do dinheiro. Se houver ato criminal, será feita uma expulsão sumária.
"Lamentamos o estrago político. Mas não vamos ser transigentes. Manteremos a atitude de oposição fiscalizadora e responsável", disse Bornhausen, que interrompeu uma viagem por causa do incidente.


Colaboraram LEILA SUWWAN e RANIER BRAGON


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