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ENTREVISTA DA 2ª
"Não é a arma que mata, é a pessoa", afirma dono da empresa Taurus
DAVID FRIEDLANDER
da Reportagem Local
Depois de Carmen Miranda, a
brasileira com mais aparições nos
filmes de Hollywood talvez seja a
pistola da Taurus, uma das três
maiores indústrias de armas leves
do mundo, com sede no Rio
Grande do Sul.
Os produtos da empresa já fizeram várias pontas, algumas nas
mãos de gente famosa, como John
Travolta e Nicolas Cage, em "A
Outra Face", e Sylvester Stallone e
Sharon Stone, em "O Especialista".
Em parte, isso ocorre porque a
Taurus quase nunca cobra para
emprestar suas armas aos estúdios de cinema. Também conta o
fato de a Taurus ter boa reputação
entre os norte-americanos que
compram armas: é a segunda
marca de revólver mais vendida
nos Estados Unidos, atrás apenas
da Smith & Wesson. No ranking
da venda de pistolas, a Taurus está
em quinto lugar.
A empresa faturou US$ 108,5
milhões no ano passado e exporta
60% de sua produção para 85 países. A maior parte vai para os Estados Unidos, seu maior mercado
depois do Brasil.
O presidente da empresa, Carlos Alberto Murgel, 61, acha que é
possível crescer no mercado externo, apostando em dois produtos desenvolvidos nos últimos
anos: armas com trava de segurança fechadas a chave, lançadas
há um ano e meio, e revólveres e
pistolas feitos de titânio -mais
leves e resistentes à corrosão do
que o produto tradicional.
O problema da Taurus e da indústria de armas como um todo é
que a pressão contra os fabricantes está crescendo em boa parte
do mundo. No Brasil, o governo
quer que o Congresso aprove um
projeto proibindo o comércio de
armas. Nos Estados Unidos, os fabricantes de armas, entre eles a
Taurus, estão sendo processados
por prefeituras de vários Estados.
"O ataque às armas é uma forma que os políticos encontraram
de aparecer na mídia", diz Murgel. A seguir, a entrevista com o
presidente da Taurus:
Folha - O cerco contra a indústria de armas está cada vez mais
agressivo. Não incomoda ser
presidente de uma empresa que
faz um produto considerado politicamente incorreto?
Carlos Alberto Murgel - Essa
história de politicamente incorreto é demagogia das ONGs (organizações não-governamentais) e
de alguns governos. O revólver
que nós fabricamos é o segundo
mais vendido nos Estados Unidos. Portanto tenho muito orgulho do que faço. Agora, é claro que
o ideal seria que as armas nunca
fossem usadas para qualquer outra finalidade que não fosse o esporte.
Folha - Só que armas não são
usadas apenas no tiro ao alvo.
Murgel - Mas também não é o
revólver, a faca ou o porrete que
comete assassinato, que mata,
que agride. São as pessoas que fazem isso. O avião serve para
transportar passageiros. Coloque
bombas dentro dele e o mesmo
avião vai servir para destruir em
massa. O mesmo pode ser dito sobre o automóvel. O número de
mortes no trânsito é assustador,
muito maior do que o de mortes
causadas por armas de fogo. No
entanto seria um absurdo parar
de fabricar carros para evitar
mortes no trânsito.
Folha - Há uma diferença. O
carro é feito para transportar e a
arma...
Murgel - E a arma existe para
dissuadir. Mais uma vez, não é a
arma que mata, é a pessoa que faz
isso. Enquanto isso não ficar claro, haverá gente propondo atitudes simplistas e demagógicas como esse projeto do governo. O
ataque às armas é uma forma que
os políticos encontraram para
aparecer na mídia.
Folha - Seria essa a razão dos
processos movidos por várias
prefeituras norte-americanas
contra os fabricantes de armas,
a Taurus inclusive?
Murgel - Nesse episódio, o que
acontece é um pouco diferente.
Advogados especializados em
ações litigiosas, algo comum nos
Estados Unidos, convenceram as
prefeituras a pedir ressarcimento
pelos gastos com atendimento
médico, com a polícia, com tudo
que possa estar ligado às armas de
fogo. O município aceita porque
não tem custo nenhum com o
processo. E, em caso de vitória, os
advogados ganham de 20% a 30%
daquilo que conseguirem.
Folha - E se as prefeituras ganharem?
Murgel - Difícil. Acho que vai
prevalecer o bom senso. Alguns
Estados norte-americanos já
aprovaram leis que impedem as
prefeituras de mover ações contra
a indústria de armas. Essas coisas
atrapalham a economia do país. A
última parece piada: recentemente entraram com uma ação contra
fabricantes de escovas de dentes.
Estão dizendo que se a escova não
for usada corretamente pode prejudicar a gengiva e os dentes.
Folha - Proibir a venda de armas não seria uma maneira de
mudar a mentalidade das pessoas, o modo como a sociedade
encara a violência?
Murgel - Acho que não. Olhe o
que acontece na Inglaterra, por
exemplo. Há cerca de cinco anos
foi aprovada uma lei que proíbe o
uso de armas. Mesmo assim, nos
últimos cinco anos os assaltos à
mão armada cresceram 117%. Na
Austrália, país que há dois anos
não permite armas, o mesmo delito aumentou 39%. O Japão tem
números estarrecedores. Lá, no
ano passado, mais de 32 mil pessoas cometeram suicídio. E no Japão não se vende armas. Estou
querendo mostrar que não é a livre circulação de armas que estimula a violência.
Folha - Existe um estudo da
ONU (Organização das Nações
Unidas) que mostra o contrário.
Segundo esse trabalho, o índice
de homicídios por arma de fogo
é mais alto nos países em que a
legislação sobre o assunto é
mais liberal.
Murgel - Esse estudo da ONU é
enganoso. Nos Estados Unidos,
país mais liberal em relação às armas, a criminalidade está diminuindo. São dados do Departamento de Estado norte-americano. Esse estudo da ONU não é
meritório, como também não
merecem crédito outras estatísticas que têm sido apresentadas por
aí.
Folha - Quais?
Murgel - Pessoas que apóiam o
projeto de desarmamento do governo têm divulgado uma dessas
estatísticas. Ela diz que 15 em cada
16 pessoas que usam arma de fogo
para se defender morrem ou são
feridas. É um dado completamente falso. Não dá para medir uma
coisa dessas, até porque pessoas
que já usaram revólver para se defender e escaparam dos marginais
nem sempre vão à delegacia avisar o que aconteceu.
Folha - O sr. anda armado?
Murgel - Tenho arma em casa.
Folha - Já teve de usar o revólver para se defender?
Murgel - Nunca usei e espero
nunca ter de usar.
Folha - O sr. recomenda a sua
filha que tenha arma para se
proteger?
Murgel - Ela sabe atirar, aprendeu com 8 anos de idade.
Folha - O sr. acha que as pessoas deveriam andar armadas?
Murgel - Não. Até porque em
um assalto na rua o marginal tem
quase sempre o fator surpresa a
seu favor. Agora, se você está dentro da sua casa, a situação é bem
diferente. Se você percebe alguém
tentando arrombar a porta ou
querendo pular a janela pode dar
um tiro para o alto e afugentar o
marginal. Quem se sente melhor
tendo um revólver em casa deve
ter o direito de tê-lo.
Folha - Não parece justo que o
governo se esforce pela aprovação do projeto de desarmamento no Congresso?
Murgel - O governo estava
acuado por alguns problemas, como o grampo do BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social). O projeto foi
uma tentativa para fazer com que
as pessoas começassem a pensar
em outra coisa. Há também a
pressão das ONGs, brasileiras e de
fora, que é muito grande. Só que
esse pessoal não enxerga que sua
campanha só atinge as pessoas de
bem. Para diminuir a violência é
preciso começar pelos fora-da-lei.
Estão mirando no alvo errado
Folha - Qual é o alvo certo?
Murgel - É preciso desarmar os
bandidos, não o cidadão que
compra sua arma legalmente, tem
nome, endereço e profissão cadastrados na polícia. Esse quer se
defender contra a violência, não
praticá-la. No Rio Grande do Sul
há 40 mil portes de arma legalizados. No ano passado, apenas cinco portes foram cancelados por
algum tipo de problema. No Rio
de Janeiro, só há 103 portes legais.
E eu não preciso dizer o que acontece no Rio. Ou seja: a quantidade
de armas legais, vendidas corretamente nas lojas, e que o governo
quer proibir, não tem nada que
ver com o índice de criminalidade.
Folha - As armas da Taurus
têm aparecido com frequência
em filmes norte-americanos.
Quanto a empresa paga por esse merchandising?
Murgel - Até agora não pagamos nada. São os produtores de
Hollywood que nos procuram. Às
vezes compram as armas, mas geralmente as levam emprestadas.
Não esqueça que, nos Estados
Unidos, a Taurus é uma marca
popular entre as pessoas que têm
ou gostam de armas.
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