São Paulo, domingo, 12 de agosto de 2001

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MILITARES

Concorrência para novos caças sai por US$ 700 mi; empresas norte-americanas e sueca também estão no páreo

Rússia ameaça França na licitação da FAB

IGOR GIELOW
COORDENADOR DA AGÊNCIA FOLHA

Uma batalha aérea, envolvendo europeus, russos e norte-americanos, começou na quarta-feira passada sobre o Brasil. Envolvendo US$ 700 milhões, a concorrência para a escolha dos novos aviões de combate da FAB (Força Aérea Brasileira) é um dos principais negócios do gênero em curso no mundo.
Os franceses da Dassault e seu Mirage 2000 pareciam ser os favoritos para ganhar o negócio, especialmente pelo fato de prometerem construir o avião no Brasil, em parceria com a Embraer.
Mas o jogo pode sofrer uma reviravolta. A fabricante russa Sukhoi revelou à Agência Folha que está pronta para negociar um acordo de transferência tecnológica total para vender seu avião, o Su-27 Flanker -um produto militarmente mais tentador que o Mirage, por ter desempenho considerado superior.
""Estamos prontos para entregar ao Brasil não só o avião, mas também transferir as tecnologias para construção e reparo para a aeronave e os sistemas de combate", afirmou o diretor-geral adjunto do Complexo de Aviação Militar Sukhoi, Alexander Klementiev.
Transferência tecnológica é a palavra mágica. ""As empresas deverão apresentar propostas de compensação comercial, garantindo que os valores a serem pagos pelo Brasil na compra das aeronaves serão reinvestidos, por aquelas empresas, na transferência de tecnologia que permita à FAB manter os softwares da aeronave de forma autônoma", diz o Comando da Aeronáutica.
Fabricar avião no país não é garantia de transferência. ""Restaria, à Embraer, a tecnologia de dobrar algumas latas e apertar alguns parafusos na "linha de montagem"", escreveu sobre a eventual produção do Mirage no Brasil, em dezembro de 1999, o major-brigadeiro-do-ar Aluízio Weber.

Probabilidade
O relatório, que era reservado, mas vazou, condenava a venda de 20% da Embraer aos franceses -e lhe custou o assento no conselho da empresa. A Dassault divide com outros três grupos franceses o controle dessa fatia da fabricante paulista.
""Ainda assim, o negócio mais provável é com os franceses", analisa Terence Taylor, diretor do escritório norte-americano do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (Londres). ""O Brasil deverá se preocupar, e com razão, sobre peças e manutenção, que não são exatamente um ponto forte dos russos", completa.
Já para Ruslan Pukhov, diretor do Centro de Análise de Estratégias e Tecnologias em Moscou, a Sukhoi está numa nova fase, e os acordos com a China e com a Índia, que produzem Su-27 em seu próprio território, são prova disso. ""Além disso, um negócio desses precisa de aprovação presidencial, o que está garantido, uma vez que o Brasil não é inimigo."

EUA
Silenciosamente na disputa estão os EUA. Duas empresas se apresentaram na retirada da proposta de compra, em Brasília. A Boeing deve oferecer o F/A-18, e a Lockheed, o popular F-16.
A estratégia dos norte-americanos, segundo a Agência Folha apurou, é a de esperar a concorrência. O maior problema é a indisposição do governo dos EUA em ceder material com tecnologia de ponta para outros países que não aqueles que possam ter alguma utilidade estratégica -caso de Israel e Taiwan.
Exemplo recente disso é a concorrência chilena Caza-2000, muito semelhante à brasileira. Os F-16 ganharam, mas o fato de os norte-americanos terem apresentado uma versão antiquada do caça levou o processo a um impasse.
O problema não é só com os EUA. Uma eventual vitória francesa levanta insinuações sem comprovação, entre analistas, de uma compensação pela perda para os norte-americanos da concorrência do Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia).
O Brasil está trocando sua frota de 18 Mirage F-103, que vai caducar em 2005. A idéia é comprar entre 12 e 24 aviões com capacidade de interceptação supersônica de longo alcance.
O orçamento para o programa F-X, como é chamada a compra, se estende por oito anos e faz parte de um plano maior de modernização, de US$ 3 bilhões -parte já está sendo gasta na troca do recheio eletrônico dos caças táticos F-5, que, com a reforma, devem durar até 2015 no ar.

Suecos
Além dos franceses e russos, devem apresentar um programa de transferência de tecnologia os suecos da Saab, que querem vender seu jato Gripen. A venda é feita por meio da BAe (British Aerospace) e pode ter moldes semelhantes à concorrência ganha pelo Gripen na África do Sul, onde empresas locais produzem peças para o avião.
Segundo John Neilson, chefe de comunicação da BAe, a empresa ainda não irá se pronunciar. Pesa contra o Gripen o fato de ser uma aeronave menor e de raio de combate limitado, mais adequada ao céu sueco do que ao brasileiro.
A FAB fará uma pré-seleção até novembro. As propostas podem ser entregues até outubro. Entre novembro e dezembro, sairá o vencedor. O contrato final, informa a Aeronáutica, só será assinado em junho de 2002, permitindo negociações sobre transferência de tecnologia e financiamentos.
Completam a lista de empresas interessadas o consórcio europeu que fabrica o Eurofighter Typhoon e a russa RAC, que vende os famosos MiG-29 ao exterior. O problema do primeiro é o custo da aeronave, mais de US$ 50 milhões. Já o MiG-29, um avião considerado um dos melhores de sua geração, sofre com o envelhecimento do projeto e a péssima experiência de governos como o do Peru, que comprou os aviões e enfrentou depois a falta de peças.


Colaboraram LEONARDO CRUZ, de Londres, e MARTA SALOMON, da Sucursal de Brasília


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