São Paulo, segunda-feira, 12 de setembro de 2005

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SEM CONSENSO
60º encontro de países-membros tende ao fiasco por pressões norte-americanas para diminuir papel do órgão
Agenda dos EUA domina assembléia da ONU

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL
A 60ª Assembléia Geral que as Nações Unidas promovem esta semana em Nova York tem tudo para se tornar um grande fiasco do ponto de vista dos países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, e um grande sucesso nas intenções norte-americanas de reduzir ainda mais a atual importância do organismo mundial.
Depois de recomendarem há 15 dias nada menos que 700 modificações em um texto de apenas 36 páginas que os 191 países-membros vinham negociando em conjunto, os EUA chegam ao encontro nesta semana com uma única ênfase: reformar a ONU para deixá-la mais enxuta e eficiente.
Para muitos países-membros, a reforma proposta pelos EUA é a senha para que seja minimizado o papel do organismo, deixando os norte-americanos mais livres para agir e exercer sem constrangimentos o seu poderio militar.

Novo fôlego


Os EUA ganharam novo fôlego para seus propósitos na semana passada, quando um relatório final mostrou uma série de irregularidades e desvios em um dos principais programas humanitários da ONU dos últimos anos, o Petróleo por Alimentos, destinado ao Iraque.
Na sexta-feira, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, afirmou que o relatório sobre as irregularidades deveria ser visto como uma ""oportunidade para que sejam feitas reformas (na ONU) capazes de impedir que isso jamais aconteça de novo".
Embora o relatório tenha inocentado o secretário-geral do órgão, Kofi Annan, ele recebeu fortes críticas por ter permitido que Saddam Hussein obtivesse mais de US$ 10 bilhões ilegalmente por meio do programa.
Do ponto de vista global, os dois principais assuntos que os países esperavam discutir -formas efetivas de financiar o combate à pobreza e a reforma do Conselho de Segurança- têm sido sistematicamente rechaçados pelos EUA.
O embaixador norte-americano na ONU, John Bolton, fez um protesto direto contra incluir no texto da reunião o percentual de 0,7% do PIB (Produto Interno Bruto) com o qual os países ricos se comprometeriam em financiamentos para atingir as chamadas Metas do Milênio -uma série de objetivos para melhorar os indicadores dos países pobres até 2015.

John Wayne

Bolton, já apelidado de John Wayne por parte da mídia norte-americana, também tem se posicionado contra a ampliação do número de países que fazem parte permanentemente do Conselho de Segurança (EUA, Reino Unido, França, China e Rússia).
Do ponto de vista brasileiro, a reforma do conselho é o principal ponto de interesse. Um dos articuladores do G-4, que reúne ainda Japão, Alemanha e Índia, o Brasil vem insistindo na ampliação do conselho e tentando cooptar países africanos para obter os 128 votos necessários para levar a reforma adiante.
Em entrevista à Folha, Edward Mortimer, membro do comitê executivo do secretariado-geral da ONU, afirmou que dificilmente o encontro dessa semana terá conseqüências no sentido do que espera o Brasil.
Do ponto de vista dos EUA, que já encontra oposição no conselho da França e considera Rússia e China instáveis, a entrada de novos países somente dificultaria, em termos práticos e políticos, tomar decisões unilaterais, como a invasão do Iraque em 2003.
Nos eventos dessa semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participará apenas de reuniões na quarta e quinta-feira próximas. Ao contrário dos dois primeiros anos de seu mandato, ele não fará o tradicional discurso brasileiro na abertura do debate geral da assembléia, no sábado.
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que substituirá Lula na ocasião, negou que a ausência do chefe tenha relação com um possível constrangimento por causa das denúncias de corrupção que o presidente enfrenta em casa.


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