São Paulo, sábado, 13 de janeiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTIGO

Pensador inovou escrita

MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA FOLHA

"Uma ilha de literatura cercada de filosofia por todos os lados". Assim, Paulo Arantes definiu Bento Prado Jr. em "Um Departamento Francês de Ultramar"", estudo sobre a formação do curso de filosofia na USP (Universidade de São Paulo).
Citada isoladamente, a frase sugere que Bento Prado Jr. foi menos rigoroso do que acadêmicos voltados para questões conceituais puras. Entretanto, universitários e pesquisadores são unânimes em reconhecer que ele inaugurou uma nova forma de escrever filosofia no Brasil, associando uma tradição conceitual que ajudou a consolidar à herança do modernismo, presente em interpretações de escritores como Drummond e Guimarães Rosa.
Prado Jr. cresceu na convivência com a geração uspiana que entronizou o método estrutural (disciplina de leitura dos clássicos que não deve ser confundida com o estruturalismo dos anos 60). Seu pendor para a literatura introduziu um elemento perturbador nesse ambiente austero.
Isso se devia, em parte, a suas próprias aptidões de poeta bissexto e ao gosto pela vida boêmia -a ponto de ter participado do grupo dos "Adoradores de Estátua", como ficaram conhecidos os estudantes que nos anos 50 transitavam entre a Biblioteca Mário de Andrade e os bares do centro de São Paulo.
Mas também dizia respeito a um tipo de intelectual cujo modelo era Sartre. Tal como este -e na contramão da filosofia "técnica" -, esteve aberto para as formas como a consciência responde a apelos da experiência, algo que a literatura explicita, tornando-se tão importante quanto o estudo das condições do conhecimento.
O admirador de Sartre, porém, não era um "discípulo". Pois se o filósofo existencialista defendia a idéia de que se deve "pensar contra si mesmo", no caso de Bento Prado Jr. isso significou "pensar contra Sartre".
Assim -como explicou em entrevista no livro "Conversas com Filósofos Brasileiros" (ed. 34)-, ele se dedicou a um estudo hoje clássico sobre Bergson, à época lido como antípoda da linhagem sartriana. Essa independência na escolha das referências (que em determinado momento passaram a incluir a psicanálise) nunca o afastaram de questões mais árduas. Exemplo disso é um de seus últimos livros "Erro, Ilusão, Loucura", que discute as diferenças entre "necessidade" e "universalidade" em Wittgenstein.


Texto Anterior: Repercussão
Próximo Texto: Toda Mídia - Nelson de Sá
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.