|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTIGO
Pensador inovou escrita
MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA FOLHA
"Uma ilha de literatura cercada de filosofia por todos os lados". Assim, Paulo Arantes definiu Bento Prado Jr. em "Um
Departamento Francês de Ultramar"", estudo sobre a formação do curso de filosofia na USP
(Universidade de São Paulo).
Citada isoladamente, a frase
sugere que Bento Prado Jr. foi
menos rigoroso do que acadêmicos voltados para questões
conceituais puras. Entretanto,
universitários e pesquisadores
são unânimes em reconhecer
que ele inaugurou uma nova
forma de escrever filosofia no
Brasil, associando uma tradição conceitual que ajudou a
consolidar à herança do modernismo, presente em interpretações de escritores como
Drummond e Guimarães Rosa.
Prado Jr. cresceu na convivência com a geração uspiana
que entronizou o método estrutural (disciplina de leitura
dos clássicos que não deve ser
confundida com o estruturalismo dos anos 60). Seu pendor
para a literatura introduziu um
elemento perturbador nesse
ambiente austero.
Isso se devia, em parte, a suas
próprias aptidões de poeta bissexto e ao gosto pela vida boêmia -a ponto de ter participado do grupo dos "Adoradores
de Estátua", como ficaram conhecidos os estudantes que nos
anos 50 transitavam entre a Biblioteca Mário de Andrade e os
bares do centro de São Paulo.
Mas também dizia respeito a
um tipo de intelectual cujo modelo era Sartre. Tal como este
-e na contramão da filosofia
"técnica" -, esteve aberto para
as formas como a consciência
responde a apelos da experiência, algo que a literatura explicita, tornando-se tão importante
quanto o estudo das condições
do conhecimento.
O admirador de Sartre, porém, não era um "discípulo".
Pois se o filósofo existencialista
defendia a idéia de que se deve
"pensar contra si mesmo", no
caso de Bento Prado Jr. isso significou "pensar contra Sartre".
Assim -como explicou em
entrevista no livro "Conversas
com Filósofos Brasileiros" (ed.
34)-, ele se dedicou a um estudo hoje clássico sobre Bergson,
à época lido como antípoda da
linhagem sartriana. Essa independência na escolha das referências (que em determinado
momento passaram a incluir a
psicanálise) nunca o afastaram
de questões mais árduas.
Exemplo disso é um de seus últimos livros "Erro, Ilusão, Loucura", que discute as diferenças
entre "necessidade" e "universalidade" em Wittgenstein.
Texto Anterior: Repercussão Próximo Texto: Toda Mídia - Nelson de Sá Índice
|