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JUSTIÇA CEGA
ONGs quantificam desproporção entre os gêneros no Poder e pedem políticas afirmativas
Judiciário ainda é machista, diz estudo
UIRÁ MACHADO
DA REDAÇÃO
O Judiciário ainda é um poder
machista e, se não forem tomadas
políticas afirmativas para garantir
o espaço da mulher na cúpula, a
situação pode demorar muito
tempo para ser mudada.
Essa é a principal conclusão de
um estudo sobre a participação
da mulher no Judiciário. Organizado pelas ONGs Agende (Ações
em Gênero, Cidadania e Desenvolvimento) e Cladem Brasil (Comitê Latino-Americano e do Caribe para Defesa dos Direitos da
Mulher), o estudo revela que a
participação da mulher na Justiça
é tanto menor quanto maior é a
instância julgadora.
"Conseguimos mostrar com
números o que sempre se soube
empiricamente. Nos órgãos superiores, em que a indicação é política, o número de mulheres é quase
nulo. Na base [1ª instância], onde
o acesso se dá por merecimento, o
número de mulheres é bem
maior", afirma a advogada Letícia
Massula, 33, da ONG Agende.
"O número de mulheres é desproporcional. A discriminação
com relação às mulheres ainda é
bastante forte no Judiciário", diz
Mônica de Melo, 37, procuradora
do Estado de São Paulo e integrante da ONG Cladem Brasil.
De acordo com o estudo, no
único ano em que há dados completos em todos os graus (1999), o
percentual de mulheres em primeira instância era de 31,08%, em
segunda, de 12,89%, e nos tribunais superiores, de 7,23%.
Os dados de 2004 relativos aos
tribunais superiores -a cúpula
do Judiciário-, de acordo com o
estudo, mostra a maior discriminação. O acesso a essas cortes é
feito mediante indicação política.
No STF (Supremo Tribunal Federal), o mais alto órgão julgador, há
apenas uma mulher entre os 11
ministros nomeados. No STJ (Superior Tribunal de Justiça), são
quatro mulheres e 29 homens.
A ministra Eliana Calmon foi a
primeira mulher a ser nomeada
para o STJ, em 1999. Ela afirma
que as mulheres estão se impondo em todos os setores da sociedade, mas reconhece que a participação no Judiciário ainda é pequena e que deve demorar até haver uma igualdade.
Calmon afirma nunca ter sofrido discriminação no ambiente de
trabalho pelo fato de ser mulher e
diz que as restrições ao gênero estão acabando. "Ainda há, é verdade. Mas essa restrição não vem só
dos homens. Vem também das
próprias mulheres, que deixam
de se candidatar aos cargos de comando. Quando me candidatei,
muitas colegas diziam que não
adiantava", afirma.
Políticas afirmativas
Letícia Massula, da ONG Agende, diz que o estudo pode ajudar
na implementação de medidas
que garantam espaço para as mulheres no Judiciário. "Sem essas
medidas, o quadro pode continuar assim por muito tempo."
Ela dá como exemplo a Justiça
Trabalhista. Na primeira instância, quase 50% dos juízes são mulheres; na segunda, quase 40%;
mas, no Tribunal Superior do
Trabalho, há apenas uma mulher
entre os 17 ministros (5,88%).
Para Massula, "seria importante
que a lei assegurasse a igualdade
de homens e mulheres na composição dos tribunais, tal qual é feito
no Tribunal Penal Internacional".
O secretário da Reforma do Judiciário, Sérgio Renault, diz que o
estudo é importante para levantar
a discussão. "Nosso interesse é
que o assunto seja discutido. Precisamos começar a refletir sobre
essa situação", afirma.
"A secretaria quer ter o máximo
de informações sobre o Judiciário. Nossa preocupação é com o
diagnóstico da Justiça no Brasil",
diz Renault. E completa: "Os dados mostram a necessidade de
mudança. Mas isso é uma questão
de política de gênero".
De acordo com Massula, o estudo será enviado à Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres.
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