São Paulo, segunda-feira, 13 de maio de 2002

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ENTREVISTA DA 2ª

Para Eugênio Staub, denúncias contra políticos são positivas e fazem parte de "processo de depuração"

Empresário propõe fundo único eleitoral

Flávio Florido/Folha Imagem
O empresário Eugênio Staub, presidente da Gradiente, que defende novas regras para o financiamento das campanhas eleitorais


GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

O empresário Eugênio Staub, 60, presidente da Gradiente e ex-presidente do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), vê com bons olhos as recentes denúncias envolvendo os pré-candidatos à Presidência. Ele acha que se trata de mais um passo no processo de depuração na política que o Brasil tem vivido desde o impeachment de Fernando Collor de Mello.
Para avançar nesse processo, Staub acha que deveria haver novas regras para o financiamento de campanhas eleitorais. "O poder econômico dos candidatos faz uma grande diferença na campanha e isso distorce a democracia. (...) Os candidatos devem ser eleitos pelas suas idéias e não pelo poder de fogo de suas campanhas."
Para ele, o ideal é que os empresários contribuam para um fundo especial de campanha, e o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) distribua esse dinheiro entre os candidatos, a partir de certos critérios. Um critério pode ser a bancada dos partidos no Congresso.
Entre as propostas de que já tomou conhecimento a respeito desse tema, Staub acha que a melhor é a do pré-candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, que impõe limites às contribuições. "A proposta de Lula é uma verdadeira revolução nessa área", diz.
Staub não disfarça sua empolgação com a propaganda do petista. Ele acha que o sucesso da campanha se deve a dois fatores: ao marqueteiro Duda Mendonça e ao próprio Lula. Leia a seguir a entrevista concedida por ele.

Folha - Como o sr. analisa essas recentes denúncias envolvendo contribuição de empresários às campanhas eleitorais?
Eugênio Staub
- O que está acontecendo agora na política brasileira é um processo de depuração dos métodos usados na política. Eu encaro isso como um aperfeiçoamento do processo democrático. A mídia e os procuradores têm sido fundamental para isso. O próprio presidente Fernando Henrique Cardoso também tem sido importante ao não procurar restringir a divulgação dessas denúncias. Esse processo de depuração, é bom que se diga, não vem de agora. O povo já tirou um presidente [Collor, em 92", um senador foi cassado pela primeira vez na história do país [Luiz Estevão" e dois senadores [Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho" foram forçados a renunciar. Tudo isso sem se quebrar uma vidraça.
O que acontece no Brasil é muito animador. Na medida em que se abrem sigilos bancários, empresas "offshore" estão sob suspeita e sendo investigadas e a Suíça está disposta a abrir conta de brasileiros sob suspeita, aqueles que não agiam corretamente vão passar a agir com mais cuidado. Até há pouco tempo, ninguém se preocupava muito com essas questões. Era mais ou menos como um médico quando pergunta se o preço do atendimento é com recibo ou sem recibo. Na política também era assim.

Folha - O sem recibo seria o caixa dois das campanhas?
Staub
- Eu nunca entendi porque existe esse dinheiro "por fora" nas campanhas, se a contribuição é legal. Talvez para economizar tributo. Essa é uma boa pergunta.

Folha - Alguém já pediu dinheiro "por fora" ao senhor?
Staub
- Já, mas eu só contribuo "por dentro". A Gradiente tem uma resolução do Conselho de Administração determinando que a empresa não faça contribuição para campanhas, mesmo por dentro. Nos Estados Unidos, não existe essa contribuição "por fora". Lá, todas as contribuições são registradas no Imposto de Renda.

Folha - Até onde podem chegar essas denúncias?
Staub
- O "denuncismo" é uma fase passageira, que ocorre naturalmente, independentemente do fato de as denúncias terem ou não procedência. Quero deixar claro que não sou capaz de avaliar se as denúncias são ou não procedentes. O que eu acho é que elas existem porque há espaço para isso. Essa denúncia, por exemplo, de um pedido de dinheiro de R$ 15 milhões, caso tenha mesma ocorrido, só existe porque não há regras para a atuação do poder econômico nas campanhas eleitorais.

Folha - Por que o sr. acha que essa fase de denúncias é passageira?
Staub
- Porque, com o tempo, não vai haver mais esse tipo de denúncia. Pelo menos denúncias dessa natureza. Nos Estados Unidos, por exemplo, as denúncias são de contabilidade fajuta da Enron e de outras companhias. Agora mesmo, por exemplo, surgem notícias de a Boeing ter feito alguma química no seu balanço. É da vida democrática ter esse tipo de denúncia, mas, no caso das campanhas políticas, eu acredito em mudanças. Eu acho que as pessoas vão se corrigir.

Folha - O que faz o sr. acreditar em mudanças?
Staub
- De um lado, há o processo de fiscalização da mídia. De outro, há a CPMF [Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira", que, além do efeito arrecadador perverso, provoca um efeito estatístico que capta toda a movimentação financeira da sociedade. Por esses dois fatores, e à medida que a sociedade avança, eu acredito que as denúncias não acabem, mas vão ser de outra natureza. Eu vejo esse processo com bons olhos. Os jornalistas podem até se divertir com essas denúncias, mas prestam um serviço à sociedade.

Folha - Como o poder econômico deve agir nas campanhas?
Staub
-Eu acho que a atuação do poder econômico deve ser limitada nas campanhas eleitorais. O poder econômico não pode influenciar os resultados das eleições. O país deve discutir novas regras para o financiamento da campanha. O assunto está inclusive sendo debatido agora nos Estados Unidos. Eu acho que o Brasil tem a chance e as condições de fazer uma reforma mais completa e abrangente do que a dos Estados Unidos.

Folha - O sr. teria alguma sugestão?
Staub
- O que acho que deve ser feito no Brasil é uma reforma política para aperfeiçoar a legislação que já existe sobre financiamento de campanha. Sobre isso, a proposta do Lula a respeito desse tema me parece muito boa. Eu não conheço as propostas dos outros candidatos, mas o que o Lula falou sobre isso durante reunião do Iedi no ano passado me agradou bastante.

Folha - Como evitar a influência do poder econômico nas eleições?
Staub
- Assim como há o horário gratuito de TV e de rádio para os candidatos apresentarem suas propostas, o dinheiro também deve ser distribuído a partir de critérios a serem determinados pelo TSE. O tamanho das bancadas dos partidos no Congresso, por exemplo, poderia ser um critério para o TSE distribuir o dinheiro.

Folha - Mas como se dariam as contribuições?
Staub
- As contribuições de campanhas, a meu ver, deveriam ser depositadas num fundo partidário e caberia ao TSE definir a distribuição do dinheiro. Isso diminuiria bastante a contribuição direta dos empresários aos candidatos. O poder econômico dos candidatos faz uma grande diferença na campanha, e isso distorce a democracia. As grandes empresas que quiserem contribuir devem repartir o dinheiro para financiamento das campanhas. O poder econômico não pode influenciar o poder político. Esse processo de depuração que vive o Brasil irá dar mais transparência aos financiamentos de campanha.

Folha - O sr. acha que essas denúncias recentes podem ser decisivas para o resultado das eleições?
Staub
- O que as pesquisas mostram é que as prioridades dos eleitores são segurança, emprego e saúde, mas certamente essas denúncias recentes terão um peso importante nas eleições.

Folha - Pelo menos já fez uma vítima, a ex-pré-candidata do PFL, Roseana Sarney.
Staub
- O eleitor se assusta com essas denúncias. E você viu a resposta da Roseana Sarney? Ela disse que todo mundo faz o que ela fez e citou o exemplo da campanha de Fernando Henrique Cardoso, que foi muito mais cara. Uma campanha presidencial, se eu não me engano, deve estar na faixa dos R$ 50 milhões. Na medida em que a verba seja dividida entre os candidatos, o custo vai cair. Nós temos que atacar tanto o custo como a fonte do financiamento.

Folha - O que o sr. acha das denúncias pela mídia?
Staub
- Denúncia é bom e precisa ser apurada. O que a mídia está fazendo é lubrificando esse desejo da sociedade. No passado, os grandes contribuidores às campanhas eram as empreiteiras, que ganharam muito dinheiro. Agora, são os bancos. Curiosamente, a indústria nunca foi um grande contribuinte. Não tenho nada contra os bancos, mas o poder econômico não pode ser tão decisivo para as eleições. Os candidatos devem ser eleitos pelas suas idéias e não pelo poder de fogo de suas campanhas.

Folha - E o sr. acha que essas denúncias envolvendo o pré-candidato do PSDB, José Serra, podem prejudicá-lo?
Staub
- Nessa matéria financeira, os tucanos sempre foram muito meticulosos. Eu conheço o José Serra há 20 anos e ele sempre foi correto.

Folha - O sr. acredita que outros candidatos, como Lula, também possam ser vítimas?
Staub
- Eu acho difícil encontrarem alguma coisa contra o Lula. Já é a sua quarta campanha presidencial, e a única coisa que descobriram foi uma filha anterior ao casamento, o que não é relevante. Aliás, o programa dele na TV tem sido da maior competência.

Folha - O sr. acha que o Duda Mendonça é o grande responsável pela subida dele nas pesquisas?
Staub
- Não existe marqueteiro capaz de fazer um bom programa quando o produto é ruim. O produto tem que ser bom para o marqueteiro ter sucesso. O marketing ajuda, mas não é tudo.



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