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EXUBERÂNCIA ELEITORAL
Uma revolução para o PT e Lula da Silva
VINICIUS TORRES FREIRE
Quando começou a mandar
no país, em 1993, o então ministro da Fazenda Fernando
Henrique Cardoso inventou um
remendo para diminuir os gastos
do governo. Tratava-se do Fundo
Social de Emergência.
"O social foi posto ali por acaso,
porque se imaginara que era
mais fácil que o Congresso cedesse
se fosse um fundo social, e que
não era nem fundo" diria em
1996 o já presidente FHC.
Desde 93, o tal fundo ganhou
outros nomes, mas a idéia sempre
foi desobrigar o governo federal a
fazer uma parte dos seus gastos, a
maior parte (de 85% a 90%) engessada por leis e pela Constituição, o que impede qualquer reforma social séria no país. Mas o
fundo era só remendo para fazer
ajuste fiscal e a iniquidade nos
gastos públicos permaneceu.
FHC não foi capaz de reforma
séria da Previdência, por exemplo, porque jamais apresentou
programa social de verdade, por
meio do qual fosse possível obter
apoio político para o corte de certos benefícios e privilégios sociais.
Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
se propõe a fazer um governo menos conservador que o de FHC, do
que o país desesperadamente necessita. Não é impossível fazê-lo,
embora seja difícil implementar
medidas contra a indecência social já em 2003. Mas o PT terá de
abandonar a desconversa de seu
programa a respeito de Previdência, salário mínimo e gastos públicos se quiser amenizar o conservadorismo brasileiro.
Crescimento ajuda a diminuir o
déficit da Previdência, diz o PT.
Ok. Mas, aumentar o número de
pessoas com carteira assinada
(que contribuem para a Previdência) exigiria menos encargos
trabalhistas, o que pode diminuir
a arrecadação. Confiar que mais
fiscais vão reduzir a sonegação e
resolver o problema é ingenuidade idiota. Aumentar o salário mínimo, ponto forte do programa
do PT, estoura a Previdência. Assim não vai dar.
Para fazer uma ironia com a
história, Lula também teria de
criar o seu Fundo Social. O ideal
seria que Lula apresentasse um
programa extenso de reformas sério, não os remendos de FHC.
Lula apresentou a idéia interessante de acabar com a sobreposição das dezenas de programas de
benefícios e renda mínima, a fim
de dar cabo de burocracias desnecessárias. Teria de fazer uma negociação nacional para coordenar os programas federais e locais. Poderia aproveitar a ocasião
para reformar todo o sistema nacional de gastos sociais.
Melhor seria o PT abandonar
seus próprios clichês e paliativos
ineficazes na área social: ser mais
ambicioso que seu programa e fazer uma "devassa real" dos fundos públicos sociais. Nessa devassa estaria embutida a desvinculação de todos os gastos sociais, a
redução de direitos adquiridos
(essa idéia absurda num país onde a maioria não pode adquirir
direito algum), a unificação de
programas sociais e até a revogação da existência de municípios
inventados só para que "elites da
pobreza" (prefeitos, vereança e
barnabés de regiões miseráveis)
capturem recursos públicos.
O objetivo seria criar um Fundo
Social de verdade, uma rediscussão política do que fazer dos fundos públicos. Uma parte dos recursos desvinculados e economizados iria, sim (oh!), para diminuir o déficit público (o que permitiria reduzir gastos com juros,
que vão para bancos e para a
classe média privilegiada). Outra
parte do Fundo engordaria o cofre do combate à miséria inaceitável e primitiva. Mas, para tanto, o PT teria de se revolucionar e
ser menos conservador do que
pensa que é. Vão encarar?
VINICIUS TORRES FREIRE, editor de Dinheiro, escreve às sextas-feiras
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