São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 1998

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RELIGIÃO
Secretário-geral afirma que é positivo atrair mais fiéis, mas critica excesso de emocionalismo nas celebrações
CNBB faz "ressalvas" à atuação de padre

PATRICIA ZORZAN
da Reportagem Local

O secretário-geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom Raymundo Damasceno, define como "positivo" o fato de padre Marcelo Rossi estar atraindo fiéis à igreja, mas ressalta a importância de um compromisso social do catolicismo e critica o excesso de emoção durante as celebrações. "Agora parece que a sociedade, não é só a igreja, está dando importância demasiada aos sentimentos, à emoção. A TV vive um pouco disso, de despertar a emoção, o sentimento das pessoas."
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
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Folha - Como o sr. avalia a atuação do padre Marcelo Rossi?
Raymundo Damasceno
- É importante entender essa atuação do padre Marcelo dentro do Movimento da Renovação Carismática Católica. Algumas características desse movimento são a valorização da oração comunitária, a expressão corporal e a ação missionária dos leigos. Outra característica é esse esforço de utilizar os meios de comunicação para a ação da igreja. Creio que também o movimento tem resgatado e recuperado certas devoções tradicionais como a reza do terço e a adoração ao santíssimo sacramento. Mas é importante que todos exerçam sua atividade dentro de uma pastoral de conjunto, inserida na diocese, na igreja local onde eles atuam.
Em relação à atuação do padre Marcelo, o que a gente tem visto é que ele tem conseguido reunir uma grande massa de gente para rezar e cantar.
Folha - Mas o fato de ele fazer uso de elementos como a dança e o canto, que são semelhantes aos dos evangélicos...
Damasceno
- Isso não é exclusivo das igrejas evangélicas. O Movimento da Renovação Carismática Católica tem suas origens no pentecostalismo evangélico. Evidentemente ele assumiu certas atitudes e certos comportamentos próprios desses grupos.
Não só o padre Marcelo, mas outros também têm se caracterizado por essa capacidade de reunir muita gente para rezar, para louvar a Deus, para cantar. Isso é positivo, evidentemente. Mas eu diria que não é o único caminho que a igreja tem para evangelizar.
Folha - A opção dele conquista mais adeptos?
Damasceno
- Não sei. Vamos ver no futuro. Você mede o resultado pela aglomeração de pessoas ou pelos frutos que perduram e permanecem? A televisão, o rádio e o jornal não são a única maneira de evangelizar. A igreja usa? Usa. São ótimos? São. Mas não são únicos.
Folha - Hoje esses novos métodos têm melhores resultados?
Damasceno
- Não se pode dizer. Cada um tem uma metodologia diferente. Ele (padre Marcelo) está procurando atingir uma massa. Esse talvez seja um objetivo. Alcançar pessoas que, por meio de outros caminhos, talvez não fossem atingidos e que são alcançados pela TV, pelo rádio e pela imprensa. Talvez não sejam alcançados, por exemplo, em um ambiente mais restrito da igreja, da celebração litúrgica em um templo.
Tem de ter isso claro porque senão daqui a pouco parece que o padre Marcelo é que resolveu todo o problema da igreja. O padre Marcelo tem um talento, mas não é modelo para todos os padres. Isso depende de talento, de carisma, de dom e da realidade do trabalho de cada um.
Folha - O que o sr. acha do fato de fiéis atribuírem curas a ele?
Damasceno
- Quem faz o milagre é Deus. Nós não fazemos milagres. Além do milagre físico há o milagre, muito mais importante, que é o espiritual, de conversão das pessoas para o evangelho, para Cristo. Isso é fundamental. É o dom da fé.
Folha - Mas há pessoas que dão testemunhos de curas físicas.
Damasceno
- Não estou negando também que haja possibilidade de milagre. Nós acreditamos em milagre. Mas digo que quem faz é Deus. E tem de verificar se o que está acontecendo é milagre mesmo, se ele está fazendo milagre ou não. Não é simplesmente dizer que aconteceu milagre para todo o lado. Não é que eu negue o milagre. O milagre pode existir.
Folha - A igreja se preocupa com a transformação de padre Marcelo em um homem de espetáculo?
Damasceno
- Nas celebrações litúrgicas, é importante distinguir a celebração eucarística da missa, que tem normas que orientam a cerimônia em toda a igreja e em todo o mundo, de encontros de oração em que não há regras para expressar a religiosidade, como são essas assembléias grandes de massa. Isso é diferente.
Folha - Mas mesmo nas missas são praticados cantos e danças.
Damasceno
- Não sei se ele está fazendo isso porque não estou acompanhando. Quem acompanha é o bispo dele. Mas faço essa distinção. O sacerdote que preside essas celebrações e que está inserido na igreja está inserido em um presbitério, sob a direção de um bispo da igreja local. Isso supõe que ele tenha critérios e discernimento para saber até onde pode ir a sua atuação. Também é importante dizer que a nossa fé tem de ser traduzida em um compromisso social para que não seja uma religião intimista, subjetivista, encerrada dentro de um templo e que seja apenas a expressão emocional, sentimental, superficial de um momento. Agora parece que a sociedade, não é só a igreja, está dando importância demasiada aos sentimentos, à emoção. A TV vive um pouco disso, de despertar a emoção, o sentimento das pessoas.
Folha - O que padre Marcelo faz está dentro dos padrões da igreja?
Damasceno
- Contanto que você coloque tudo o que disse anteriormente. Fiz uma série de ressalvas.



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