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JANIO DE FREITAS
Os silêncios em
volta de Collor
Os dez anos decorridos desde a
posse de Collor, a se completarem
amanhã, não mereceram, em
tempo algum, nem ao menos um
livro, um que fosse, dissecando as
entranhas verdadeiras daquele
período sórdido. Não é preciso dizer mais sobre a indigência mental e cultural da "elite" brasileira,
com tudo o que isso significa sobre
o presente da vida nacional e o futuro do país.
Pelos mesmos motivos, e ainda
por outros, também está sob silêncio a verdadeira história da operação -foi isso mesmo, uma operação no sentido militar ou tático
da palavra- que criou condições
para o afastamento de Collor. Os
chefes militares estavam alarmados com os indícios de que cocaína e outras drogas poderiam influir em atitudes e decisões da
Presidência, e a corrupção organizada por PC Farias deu o motivo
público para o cerco a Collor.
Militares, no caso, quer dizer,
sobretudo, Marinha. A começar
do ministro Mário Cesar Flores,
um almirante altamente qualificado, e da presença predominante
de oficiais de Marinha na assessoria do gabinete presidencial, onde
o motorista Eriberto foi imbuído
do papel supostamente sherlockiano que permitiu reativar, na
CPI e na mídia tergiversante, as
investigações encalhadas.
A grande habilidade da operação consistiu em manter distância
saudável entre os militares, mesmo os mais próximos dos acontecimentos, e os políticos, mesmo os
envolvidos nas atividades da CPI.
Nessas, a ação decisiva foi encabeçada por José Paulo Bisol e Aloizio
Mercadante, mas dois desempenhos inesperados mostraram que
a força dos fatos, quando se libera
das amarras convencionais, sobrepõe-se à força dos políticos na
construção da política.
Pacato, com desempenho muito
discreto no Senado, Amir Lando
mostrou-se, como relator da CPI,
competente, ativo e acima das
pressões e das tentativas de conduzi-lo, inclusive as do seu
PMDB. Benito Gama, indicado
para a presidência da CPI por sua
esperável submissão às conveniências do PFL tão collorista,
sentiu o vigor do momento nacional e exasperou os seus companheiros pefelistas com a isenção
inesperada.
Um dos outros motivos para
tanto silêncio em torno do que se
passou, de fato, nos anos de Collor
está nesta boa notícia: os que ascenderam aos diferentes níveis da
administração, com a posse do
novo governo, estão todos em esplêndida situação econômica. Alguns, muito, muito ricos. Nenhum
foi punido, por maior que haja sido o envolvimento em transgressões, das inumeráveis e de todos
os gêneros havidas em todas as
partes do governo. Com exceção,
talvez, do ex-porta-voz Cláudio
Humberto, que hoje faz uma coluna de notas em geral agressivas,
os demais desfrutam da melhor
simpatia do governo atual. E muitos o integram, até em postos de
relevância que os incluem nos gabinetes da Presidência.
Para compensar o êxito dessas
pessoas, a população foi vítima do
maior assalto praticado no sempre assaltado Brasil. Todas comprometeram-se com o confisco
das contas bancárias e das poupanças, cujos montantes, quando
devolvidos, equivaliam à metade
do confiscado. Os que não perderam nas economias, perderam na
desvalorização do salário e no
empobrecimento do país, que logo
no primeiro ano de Collor andou
para trás o equivalente a 4% do
PIB. Só o roubo cresceu. Com tantos envolvidos de dentro e de fora
do governo, que aí está mais um
dos muitos silêncios em torno dos
anos sórdidos e inconfessáveis de
Collor.
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