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Tarifa de energia vai ter de subir já, diz especialista
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
As tarifas de energia devem subir já e o governo tem de negociar
com grandes consumidores para
solucionar a crise, diz o professor
de economia da energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro Adilson de Oliveira.
Oliveira, que é engenheiro químico formado pela USP (Universidade de São Paulo) e doutor em
economia pela Universidade de
Grenoble, na França, afirma que a
falta de regras claras para o setor
de energia afastou investidores e
agravou o risco do racionamento.
Para ele, o governo tem de garantir às grandes empresas o poder de vender o direito de consumo de energia no Mercado Atacadista de Energia -espécie de Bolsa onde quem tem energia de sobra vende para quem precisa
comprar para abastecer clientes.
No mercado atacadista, os grandes compradores de energia têm
contratos firmados com as distribuidoras. Neles, está estabelecida
uma quantidade garantida para o
fornecimento.
"O governo tem de começar já
uma negociação com os grandes
consumidores. Com isso, podemos minimizar o racionamento."
Entende-se por grandes consumidores as siderúrgicas, montadoras, fábricas de alumínio e mineradoras.
Oliveira defende autorização
para que distribuidoras repassem
custos adicionais ao consumidor,
pleito antigo das concessionárias.
Segundo ele, o governo só não
optou por essas soluções por temer repiques inflacionários, que
poderiam comprometer as metas
de inflação "muito rígidas".
Oliveira diz que os efeitos dos
cortes programados poderão ser
mais catastróficos para a economia do que o aumento da inflação
gerado pelo reajuste de tarifas.
O professor da UFRJ prevê queda de até 1,5 ponto percentual do
PIB do país neste ano. Leia a seguir a entrevista que Oliveira concedeu à Folha.
Folha - A falta de regras claras para a energia afastou investidores?
Adilson de Oliveira - Concordo
com as empresas [que reclamam
das atuais regras". O fato é que
não estão definidas e há risco elevado para o investidor. Precisamos atrair investimentos agora,
com regras claras.
Folha - Quais seriam as regras?
Oliveira - Defendo o repasse dos
aumentos de custos não controlados para as tarifas, como querem
as distribuidoras. Mas o que mais
preocupa é a desvalorização do
real. Para investidores, é inaceitável assumir o risco cambial. Deveríamos ter mecanismos de proteção para depreciações acima de
10% a 15% no ano, quando o governo passaria a assumir o risco.
Folha - E abaixo desse patamar?
Oliveira - Nesse caso, as empresas ficariam com o risco, usando
instrumentos de proteção cambial. E a diferença acima disso ficaria com o governo. É uma forma de dividir o risco, essencialmente da geração termelétrica,
que tem mais custos em dólar.
Folha - Existe outra alternativa
para dividir o risco cambial?
Oliveira - A outra hipótese [levantada pelo governo", a do consumidor assumir o risco cambial,
com repasse nas tarifas, é difícil.
Geraria inadimplência.
Folha - Existem outras regras a
ser modificadas?
Oliveira - O aumento de tarifa está previsto para janeiro de 2003. O
governo tem de antecipar isso
agora para trabalhar com a tarifa
real [hoje os preços são controlados e dependem de autorização
para serem reajustados". Seria
uma antecipação do livre mercado [no qual preços são livres, regidos pela oferta, e todos compram
e vendem energia no MAE".
Folha - Qual a consequência do
aumento da tarifa? Por que o governo não adota essa sugestão?
Oliveira - Haverá pequena redução do consumo. É do que precisamos.
Folha - Qual a alternativa do sr.
para a proposta do governo de cortes programados?
Oliveira - É a negociação com
grandes consumidores para o
corte voluntário. Se aceitarem,
seu consumo seria reduzido, com
compensação financeira, até do
próprio governo, que, em casos
de emergência, tem a responsabilidade. O corte aleatório desarticula a atividade produtiva.
Folha - Quais seriam essas compensações?
Oliveira - Pode ser uma tarifa
menor para o restante do que a
empresa consome. Mas o principal seria a possibilidade de abrir
mão do consumo e receber em dinheiro por isso. O próprio mercado atacadista pagaria.
Folha - Como se daria essa negociação?
Oliveira - Os grandes consumidores, hoje proibidos de vender o
direito de consumo contratado,
poderiam negociar a energia pelo
preço do mercado spot, bem mais
alto do que o valor que elas pagam
hoje, previsto em contratos.
Folha - E as empresas teriam interesse em aderir?
Oliveira - Sim. As empresas pagam cerca de R$ 55 por MWh às
distribuidoras. No spot, receberiam hoje cerca de R$ 469 por
MWh.
Folha - A previsão de o país crescer até 4,5% neste ano será afetada
pelos cortes?
Oliveira - Com corte de 20%, o
crescimento está comprometido.
O impacto será grande. Se o racionamento começar em junho, o
PIB pode cair de 1 a 1,5 ponto percentual. Em vez dos 4,5% previstos, cairá para menos de 3,5%.
Folha - A nova orientação do governo de premiar quem consumir
menos terá resultado?
Oliveira - Ficamos no pior dos
mundos. Ninguém acredita que
receberá o dinheiro de volta. Mas
a atitude do presidente de recuar
das multas é correta. Evitou uma
enxurrada de ações na Justiça. A
minha sensação é a de que há um
despreparo muito grande. O governo deveria partir já para a negociação com os consumidores.
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