São Paulo, quarta-feira, 14 de agosto de 2002

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TRANSIÇÃO

Lula diz que não aceita dividir ônus da crise; em nota, partido afirma que acordo põe país "contra a parede"

PT endurece discurso e rejeita "jogo de cena"

EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA, EM UMUARAMA

FÁBIO ZANINI
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma semana após aceitar, de forma inédita, um acordo com o Fundo Monetário Internacional, o PT voltou a endurecer o discurso ontem, dia em que ficaram mais claras as limitações do pacote para conter a alta do dólar.
Ao comentar o convite do presidente Fernando Henrique Cardoso para um diálogo, Luiz Inácio Lula da Silva disse, em Umuarama (PR), que o PT não está interessado em dividir o ônus da crise. "O presidente da República tem de assumir a responsabilidade e reconhecer que nem sequer o acordo do FMI resolveu o problema da fuga de capitais."
Em nota à tarde, o presidente do PT, José Dirceu, procurou, com uma sucessão de frases fortes, deixar claro que não se deve esperar do partido trégua na crítica à política econômica, muito menos um pacto formal de transição.
No máximo, poderia haver consenso quanto a medidas para estimular exportações e uma minirreforma tributária emergencial.
"Não contem conosco para um jogo de cena que oculte do povo brasileiro a necessidade de mudanças fundamentais no rumo do Brasil", diz Dirceu, na nota.
No mesmo documento, o partido também volta suas baterias com mais força contra o FMI, a mesma instituição que mereceu crítica branda na semana passada, quando Lula aceitou o pacote.
"Encaramos o referido acordo com o FMI como inevitável. (...) No entanto, o país não pode ser posto contra a parede por aqueles que desejam impedir o povo brasileiro de tomar decisões soberanas a respeito de seu futuro", diz o partido no documento.
Mais à frente, o mesmo texto retoma verbalização que parecia esquecida pelo partido, ao falar em "defender a independência do Brasil" e "não abdicar da soberania para atender aos que pretendem fazer do país um cassino".
O tom duro da nota de ontem foi pensado para se contrapor às manifestações da semana passada. Avalia-se internamente que o partido não pode se dar ao luxo de parecer suave demais em comparação com Ciro Gomes (PPS).
Lula, que foi informado antecipadamente do teor da nota, disse, no Paraná, que o PT não tem mais nada a ceder durante o período de transição do Palácio do Planalto.
Para o presidenciável, a palavra do PT sobre o cumprimento de todos os contratos e a manutenção do superávit primário (receitas menos despesas, excluídos os gastos com juros) de pelo menos 3,75% do PIB nos próximos três anos já é "mais do que suficiente".
"O PT não tem mais nada a falar sobre o assunto. Se o governo quiser seguir o PT, nós já demos nossas orientações, como fazer uma reforma tributária e uma pressão aos banqueiros internacionais para não cortar a linha de crédito dos exportadores brasileiros. Mais do que isso o governo não não pode exigir do PT."

Encontro
A proposta de um encontro de Lula com o presidente FHC foi primeiro aventada pelo próprio partido, na chamada "Carta ao Povo Brasileiro", espécie de pronunciamento que o presidenciável fez em 22 de junho.
Questionado se a reunião poderia manchar seu rótulo de oposição, fazendo com que sua eventual gestão fosse encarada como uma espécie de "continuísmo", Lula disse que essa questão não será polemizada.
"Não tem o problema da imagem. Acho que ninguém no mundo recusa um convite de um presidente da República no momento de uma crise profunda. Só um irresponsável é que não estaria disposto a discutir esse assunto."
Em Curitiba, Lula afirmou que o governo está "inoperante" diante da crise. "Vamos discutir se levamos uma nova proposta para ver se ele [governo] sai do marasmo em que se encontra."
"Venderam [FHC e equipe econômica" uma estabilidade econômica que não existe hoje], disse. O resultado, segundo o presidenciável petista, "é o Brasil entregue à agiotagem internacional".
No final da tarde, quando voltava para o hotel, após participar de caminhada, o candidato do PT se deparou com a taça da conquista do penta pela seleção brasileira. A Federação Paranaense de Futebol exibe o troféu desde o dia 10, em Curitiba. Lula pegou a taça, foi para a portaria e a ergueu na frente dos militantes que o seguiram até o hotel, simbolizando um gesto de vitória. Foi muito aplaudido.


Colaborou a Agência Folha, em Curitiba



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