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Manifestações mostram racha na esquerda
EDUARDO SCOLESE
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em busca de apoio para sair da
crise, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já poderá ter uma boa
idéia nesta semana sobre se poderá ou não contar com os movimentos sociais.
Duas manifestações rivais em
Brasília, ambas centradas na figura do presidente Lula, evidenciam
o racha na esquerda brasileira no
momento em que um de seus líderes históricos luta pela sobrevivência política.
Na terça-feira, um ato pró-Lula,
liderado por CUT (Central Única
dos Trabalhadores), UNE (União
Nacional dos Estudantes) e MST
(Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra), pretende levar
30 mil pessoas à Esplanada dos
Ministérios.
No dia seguinte, é a vez da esquerda não-lulista -PSTU,
PSOL, PDT, PPS- tentar dar a
resposta, assumindo para valer o
slogan "Fora Lula" -eco do "Fora FHC" que parte do PT encampou em 1999.
As legendas de esquerda de
oposição ao presidente já conversam reservadamente sobre uma
possível candidatura única de legendas com graus variados de radicalismo (leia texto ao lado).
O contraste entre as manifestações mostra que há uma "disputa
de mercado" na esquerda.
A ala oposicionista busca crescer tirando da CUT e do PT o controle sobre os movimentos sociais
e o eleitorado ideológico de esquerda; os responsáveis pela manifestação favorável ao presidente
apostam na superação da crise e
nas benesses, inclusive financeiras, proporcionadas pela relação
estreita com o Planalto.
"Vestimos a camisa"
"[O evento de oposição] é inconseqüente, não tem preocupação com o futuro. O nosso é construtivo. Com todos os defeitos, este é um governo que nós vestimos
a camisa para eleger", diz Antônio
Carlos Spis, secretário de Comunicação da CUT.
Lula não ficará totalmente imune na manifestação de seus aliados. Alguns movimentos denunciarão a política econômica. Mas
no essencial, a corrupção, as críticas serão feitas de forma genérica.
Em consonância com a linha predileta de Lula, sobrarão críticas à
"direita golpista".
Qualquer coisa mais contundente é impossível para a CUT,
nascida sob a inspiração do sindicalismo de Lula e que acaba de
emplacar seu presidente, Luiz
Marinho, no Ministério do Trabalho. Ela pediu e deve conseguir
uma audiência com o presidente.
Em situação parecida está o
MST, que nos anos de Fernando
Henrique Cardoso (1995-2002)
tornou-se sinônimo de movimento social bem-sucedido. Relutantemente, o movimento mantém a solidariedade ao presidente
Lula, como ficou evidente na
"Carta ao Povo Brasileiro", lançada há dois meses.
"Os movimentos sociais [que
organizam a manifestação pró-presidente] têm, em tese, uma
certa autonomia em relação ao
governo Lula. [...] A manifestação
preserva a imagem do presidente,
mas bate pesado no pedido de
mudança da política econômica",
afirma João Paulo Rodrigues, da
coordenação nacional do MST.
"Neste momento o "Fora Lula"
não acumula força."
Manoel dos Santos, da Contag,
diz que os movimentos não podem "entrar no desespero de acabar com o governo". "Não se pode aproveitar o momento para fazer barganha, pedir mudanças na
economia e fazer outras reivindicações", diz, em crítica a seus rivais históricos no MST.
Os oposicionistas não têm restrições. Romperam com a linha
dominante na central, mas ainda
são pequenos. Querem aproveitar
a crise para crescer.
"A CUT está colocando um
freio no movimento social. Bloquear essa trava é o nosso maior
desafio hoje para crescer", diz José Maria de Almeida, presidente
do PSTU e da Conlutas, uma dissidência da CUT.
Se para os governistas falar na
queda de Lula é golpismo, para os
demais a saída do primeiro presidente metalúrgico da América Latina não é mais tabu.
"A responsabilidade do presidente ficou evidente, mesmo antes do depoimento de Duda Mendonça. Queremos a cabeça de Lula", diz o deputado paraense João
Batista Araújo, o Babá, do PSOL,
que está na linha de frente da manifestação de quarta-feira.
A dúvida é como decapitar o governo e isso, ironicamente, acaba
indiretamente o ajudando. A opção pelo impeachment, hoje a
maior ameaça contra Lula, é rejeitada por PSTU e PSOL. Não por
alguma recaída de militantes que
se criaram no PT e depois romperam (ou foram expulsos) da legenda, mas porque o afastamento
teria de ser aprovado por um
Congresso sob suspeição.
"Para nós, a saída de Lula não
pode ser constitucional, mas fruto
de um movimento de massas",
diz Almeida.
Atitudes como essa alienam setores que não se sentem bem
apoiando o governo, mas também têm calafrios com a possibilidade de ficarem a reboque da esquerda radical.
Enquadram-se nessa categoria a
oposição interna no PT e na CUT,
além de direções regionais do
MST, que não têm tanta dependência dos financiamentos oficiais para programas de reforma
agrária.
"Fico numa situação extremamente desconfortável. Acho que
não vou a nenhuma delas", diz o
deputado Ivan Valente (PT-SP).
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