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QUESTÃO INDÍGENA
Acordo entre índios e fazendeiros é afiançado por decisão de Thomaz Bastos; indigenistas criticam
Ministro autoriza redução de reserva de índios no Pará
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
O ministro da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos, assinou portaria
pela qual reduziu em 317 mil hectares (17,2% do total) uma área indígena do sul do Pará.
Sob alegação de que houve um
acordo entre líderes dos 130 índios caiapós que vivem na área,
fazendeiros, posseiros e uma prefeitura da região, Bastos tornou
sem efeito a portaria número
826/98, assinada pelo então ministro Renan Calheiros, contrariou outra portaria, a de número
645/91, do então ministro Jarbas
Passarinho (governo Collor), que
determinavam a extensão de 1,85
milhão de hectares para a Terra
Indígena Baú, no município de
Altamira (PA), e ainda desconsiderou um despacho de agosto de
2000 pelo qual o ministro José
Gregori determinava a imediata
demarcação física da área.
O Cimi (Conselho Indigenista
Missionário) divulgou nota pela
qual condenou a decisão do governo, publicada no "Diário Oficial" da União no último dia 9: "O
ato do ministro Márcio Thomaz
Bastos é de extrema gravidade,
tornando temeroso todo e qualquer procedimento de demarcação de terra indígena no país".
Em 1997, o então ministro da
Justiça, Nelson Jobim, tentou reduzir em 350 mil hectares a área
Baú, assinando um despacho que
depois foi desconsiderado pelo
seu sucessor, Renan Calheiros.
Pelo acordo, assinado em 23 de
setembro último na presença do
procurador da República Nilo
Marcelo de Almeida Camargo, os
fazendeiros se comprometeram a
pagar R$ 120 mil anuais por um
período de dez anos à prefeitura
de Novo Progresso (PA), que prometeu investir o dinheiro "na forma exclusiva de benefícios" para a
aldeia. A área já estava na fase da
demarcação física.
"Não se pode negociar terra indígena, nem os índios podem. A
terra pertence à União. O governo
cedeu às pressões dos produtores
rurais e usou uma terra da União
como moeda de troca", afirmou o
vice-presidente do Cimi, Saulo
Ferreira Feitosa, 40.
O administrador regional da
Funai (Fundação Nacional do Índio) em Colíder (MT), Megaron
Txucarramãe, 53, que intermediou o acordo, disse que líderes
caiapós de Baú estavam sendo
ameaçados de morte e isso precipitou a assinatura do termo. "A
população [da cidade de Novo de
Progresso] estava contra a demarcação. Um homem ameaçou matar [índios], ameaçaram fazer coisa feia. Então eles [líderes caiapós]
decidiram assinar o acordo."
Segundo Megaron, que é sobrinho do cacique Raoni, desde o
início do governo de Luiz Inácio
Lula da Silva os fazendeiros da região organizaram, com apoio de
deputados federais, duas visitas
ao Ministério da Justiça e à Funai,
em Brasília. Eles pressionavam
contra a demarcação da terra.
Pedido dos índios
O presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), Mércio
Pereira Gomes, 53, disse ontem
que a decisão de reduzir em 317
mil hectares a Terra Indígena Baú
(sul do Pará) partiu dos índios.
Segundo Gomes, a promessa
dos fazendeiros de pagarem R$
1,2 milhão aos índios, ao longo de
dez anos, não se trata de "indenização". "A Funai não reconhece a
indenização", alegou.
Indagado se, então, teria havido
um erro nos levantamentos fundiários anteriores, Gomes disse
que não. "Houve avaliações diferentes [sobre o tamanho da
área]". Gomes afirmou que não
vê risco de o caso de Baú estimular produtores rurais a tentar convencer líderes indígenas a assinar
acordos em outras áreas de conflito no país. A assessoria do ministro Thomaz Bastos, que não foi
localizado, informou que a opinião de Gomes "ficava valendo"
como posição oficial do governo.
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