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INTELLIGENTSIA
BC autônomo seria "prego no caixão de Lula"
Herança pára governo, afirmam intelectuais
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva está "preso" e imobilizado. A causa são as reformas
a que o Estado brasileiro esteve
submetido na última década,
particularmente no governo de
Fernando Henrique Cardoso,
que o teriam transformado em
um "autômato", para o qual os
governantes são irrelevantes.
A análise é comum ao filósofo Paulo Arantes e ao sociólogo
Francisco de Oliveira, professores da USP, que participaram
do debate "O Espírito de Porto
Alegre: Um Balanço do Brasil
de Hoje", no auditório daquela
universidade, anteontem.
Oliveira apontou dois erros
no modo de o PT se relacionar
com essa "prisão": ter subestimado "enormemente a reconfiguração do Estado", acreditando que realizar mudanças
dependeria apenas de vontade
política, e parecer apostar no
aprofundamento das próprias
reformas que o aprisionam.
"O pior de tudo é que Lula
quer cravar o último prego no
seu caixão", disse o sociólogo,
referindo-se à possível autonomia do Banco Central. "É preciso correr para tirar de Lula o
martelo e o prego com os quais
ele pode ferrar-se de vez."
O que imobiliza o governo,
segundo Oliveira, é a série de
compromissos a que os gastos
do governo estão atrelados,
fundamentalmente a obrigação de cumprir um alto superávit fiscal e de realizar o pagamento das dívidas."Se formos
somar todas as restrições impostas ao Estado brasileiro chega-se à conclusão de que ele
move-se como um autômato."
Ele defende que a verdadeira
"luta de classes" atual está na
disputa pelos gastos do governo. "O orçamento público é
hoje o ponto central do conflito
de classe. Pode, quem quiser,
continuar indo a porta de fábrica em São Bernardo... É completamente irrelevante."
O "espírito de Porto Alegre"
do título do debate refere-se ao
livro de mesmo nome, lançado
pela editora Paz e Terra, sobre
o Fórum Social Mundial, que,
em oposição ao encontro de representantes do pensamento
econômico ortodoxo em Davos, na Suíça, aconteceu entre
2001 e 2003 na capital gaúcha.
Em referência a tal espírito
difuso de vontade de mudança,
Arantes afirmou que os participantes do fórum acreditavam
que, com a chegada do PT ao
poder, ele "iria mudar o mundo por meio da nova Moscou,
ou Meca, que seria Brasília".
Para o filósofo, agora "está
vindo a ducha fria": "a encarnação do espírito do fórum
[Lula" está de novo aprisionada
na garrafa".
Contra a ambição de uma espécie de cidadania mundial defendida pelos participantes do
fórum, Arantes afirma que "a
arena" dos conflitos que podem mudar as sociedades ainda é nacional. "Mesmo que o
Lula, num gesto desastrado e
trágico, vá cavando a própria
sepultura nos próximos meses,
o local da disputa ainda é o Estado Nacional", disse ele.
O filósofo lançou finalmente
as perguntas: "Como transformar a prisão em plataforma?
Como impedir que Lula crave o
último prego no seu caixão?".
Disse que são os pobres "aprisionados" no país (as elites, diz,
se "dolarizaram" e escapam ao
"confinamento") que responderão. Quanto à ação do governo, ao menos na noite da última quinta-feira, as perguntas
ficaram sem resposta.
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