São Paulo, domingo, 15 de maio de 2005

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GOVERNO SOB PRESSÃO

O ministro José Dirceu (Casa Civil) poderá retomar atribuições; intenção é conter descontrole da base aliada

Lula estuda extinguir pasta da Coordenação Política e realojar Aldo

KENNEDY ALENCAR
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse a auxiliares que tomaria no fim de semana decisão a respeito do comando da articulação política, numa tentativa de pôr fim ou amenizar o já crônico descontrole sobre sua base de sustentação no Congresso.
A Folha apurou que a tendência de Lula é devolver à Casa Civil de José Dirceu as atribuições do ministério de Aldo Rebelo (Coordenação Política), que seria extinto. Aldo poderia ocupar um outro ministério, provavelmente uma pasta chefiada por um petista.
É pequena a possibilidade de Lula manter Aldo na Coordenação Política, apesar de o presidente gostar dele e querer segurá-lo no primeiro escalão.
Um outro petista que não Dirceu para assumir a função é também menos provável. Se isso acontecer, Dirceu prefere o ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha (SP).
Apesar de menores, essas possibilidades não podem ser descartadas, pois Lula está contrariado com pressões que recebeu para demitir Aldo e poderia até mantê-lo, o que membros do governo consideram que seria erro grave.
Apesar de negar, Aldo já pediu demissão. A instabilidade também afetou sua equipe: há duas semanas, o assessor especial Fredo Ebling disse a Aldo que deixaria o ministério porque pretende concorrer à Câmara nas próximas eleições. Um mês antes, outro assessor entregou o cargo para assumir a chefia de gabinete do ministro Humberto Costa (Saúde).
O formato da eventual devolução da articulação política à Casa Civil é uma preocupação do presidente. Quando retirou as atribuições políticas da Casa Civil na reforma ministerial de janeiro de 2004, as subchefias de Assuntos Parlamentares e de Assuntos Federativos foram levadas para a pasta criada para Aldo.
No início do ano passado, Lula avaliava que Dirceu estava sobrecarregado por ser o gerente do governo e o articulador político. Agora, uma possibilidade é criar uma secretaria especial de Acompanhamento Governamental, nos moldes de estrutura já existente na Casa Civil.
A outra possibilidade é dar ao Ministério do Planejamento parte das funções de gerenciamento. Isso aliviaria a Casa Civil, que continuaria com a estrutura jurídica e reincorporaria a política.

"Fundo do poço"
Na avaliação de Lula, a articulação chegou ao "fundo do poço", expressão que usou em conversas reservadas. Ele avalia que precisa começar a próxima semana dando sinal de força na área política.
Os defensores da opção Dirceu argumentam que ele tem o perfil para a hora na qual há desordem na base governista e o embate com a oposição se acirra. O próprio Dirceu, porém, sabe que é difícil. Pergunta em conversas reservadas se já não seria tarde demais para seu retorno.
Independentemente do desfecho para a articulação política, Lula avalia que precisará se dedicar a um corpo-a-corpo. Marcou para quarta-feira encontro com a Mesa Diretora da Câmara, incluído o presidente Severino Cavalcanti (PP-PE), e todos os líderes partidários da Casa.
Em conversas reservadas na última sexta-feira, o presidente Lula afirmou que pretende propor a definição de uma agenda comum para ser votada.
"Não precisa ter compromisso de votar a favor do governo, mas o de decidir o que será analisado", disse o presidente, segundo relato obtido pela Folha.

Congresso
Com o Senado, o clima terminou ruim na semana passada. O presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), atacou o veto de Lula ao reajuste de 15% para funcionários do Congresso e do TCU (Tribunal de Contas da União).
Do outro lado do Congresso, Severino Cavalcanti, que apoiou o veto, deve reagir duramente por não ter conseguido emplacar um indicado na Petrobras. Severino ora afaga governo, ora ataca.
Lula e seus principais ministros avaliam que Renan, que recebeu apoio do PT para presidir o Senado, foi desleal ao dizer que o governo provoca crises entre os Poderes da República uma semana depois de o presidente ter convencido os petistas a derrubar a verticalização (regra eleitoral que induz os partidos nos Estados a repetir a aliança federal).
Dentro do PT voltaram a aparecer focos de resistência à derrubada da verticalização. É improvável que essa tese prospere, pois Lula já prometeu ao PMDB que ajudaria a derrubar a regra, mas a falta de consenso entre petistas pode indicar mais turbulências.
Segundo a Folha apurou, é raro um interlocutor do presidente dizer ter visto em Lula algum sinal de reconhecimento de erros dele próprio nas últimas crises políticas. O presidente sempre aponta outro como responsável.
Lula tende a achar que os problemas não são causados pela sua forma de exercer o poder, muitas vezes ambígua e solitária. Poucos assessores se arriscam a apresentar ao presidente esse diagnóstico que, na avaliação de muitos, seria a gênese do péssimo momento que enfrenta no Congresso.


Colaborou CATIA SEABRA, da Reportagem Local

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