São Paulo, Terça-feira, 15 de Junho de 1999
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GOVERNO
Para ex-militar, há mentiras no inquérito que apurou supostas atividades subversivas do ex-padre Monteiro
Campelo inventou provas, diz ex-coronel


PAULO MOTA
da Agência Folha, em Fortaleza

O coronel reformado do Exército Eduardo D'Almeida Campos Pereira Mota, 74, disse ontem que o novo diretor-geral da Polícia Federal, João Batista Campelo, inventou provas contra o professor e ex-padre José Antônio Magalhães Monteiro no inquérito que presidiu em 1970, em São Luís.
O inquérito foi aberto após a prisão de Monteiro, em 3 de agosto de 1970, em Urbano Santos (MA). Para acusá-lo, Campelo baseou-se no depoimento prestado pelo ex-padre nas dependências da PF.
No depoimento, Monteiro teria confessado que era militante da AP (Ação Popular), organização de esquerda que atuou nos anos 60 e 70.
O ex-padre afirma que foi torturado enquanto era interrogado por Campelo -que nega a acusação.
Um dia após a prisão de Monteiro, Campelo prendeu o padre Xavier Gilles, atual bispo de Viana (MA). No inquérito, Gilles foi indiciado junto com Monteiro sob a acusação de atentarem contra a Lei de Segurança Nacional.
Para comprovar a ligação de Gilles e Monteiro com a Ação Popular, Campelo citou livros ""subversivos" supostamente encontrados nas casas dos dois acusados.
Mota disse que a citação dos livros ""foi uma invenção" de Campelo. ""A maior parte dos livros que foram achados nas casas dos padres foi dada por mim e não tinha nada de subversiva. Eram da coleção da Biblioteca do Exército Editora, que na época tinha um programa de doação de livros", diz.
Na época em que foi preso, Monteiro era padre e diretor de uma escola em Urbano Santos. Gilles era vigário da vizinha cidade de São Benedito do Rio Preto. Os dois eram amigos e participavam de Comunidades Eclesiais de Base.
Mota era tenente-coronel do Exército e servia no 24º Batalhão, em São Luís (MA). Ele diz que conhecia os dois religiosos porque sua mulher é de Urbano Santos e viajavam constantemente para lá.
""Esse inquérito foi uma barbaridade, de tão malfeito. Os padres não exerciam atividades subversivas", afirma Mota, que diz não saber se Monteiro foi torturado.
Hoje na reserva, Mota foi uma das quatro testemunhas arroladas no processo que a Justiça Militar montou com base na acusação feita por Campelo. Monteiro e Gilles foram absolvidos porque Campelo não apresentou provas e porque as testemunhas disseram que foram coagidas durante o inquérito.
""As acusações eram tão levianas,que os juízes militares julgaram o caso rapidamente e mandaram o Ministério da Justiça investigar as denúncias das testemunhas", declara Mota.
A tabeliã Rosalina Costa Araújo, 66, arrolada por Campelo como testemunha, disse à Agência Folha que não sabe por que foi escolhida para acusar os padres. ""Fui presa pela PF junto com Monteiro porque diziam que eu era secretária da paróquia. Fui acusada de ser subversiva sem nem saber o que era isso e depois fui escolhida como testemunha de acusação", disse.
Outro ponto observado por Mota é a acusação de que Gilles teria apoiado guerrilheiros da Argélia contra o domínio colonial francês.
""O homem era oficial do Exército francês e foi ferido combatendo os guerrilheiros", afirma.

CNBB
O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, d. Raymundo Damasceno, disse que "uma pessoa que participou de uma sessão de tortura, ou a presenciou e foi conivente, não deve ocupar cargo de responsabilidade num regime democrático". Segundo ele, o assunto só vai ser discutido pela CNBB na semana que vem, durante reunião ordinária.


Colaborou a Sucursal de Brasília

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