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Lula quer acordo moderado com Vaticano
Governo defende tratado diplomático, mas fez contraproposta a pontos enviados antes da visita do papa Bento 16 ao país
Se for fechado, tratado é a institucionalização jurídica das relações do Brasil com o Vaticano, algo que acontece hoje com cerca de 70 países
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende assinar
acordo diplomático com o papa
Bento 16. Para tanto, desidratou a proposta enviada pela
Santa Sé antes da visita do papa
ao Brasil em maio passado e negocia novo documento.
Em maio, como antecipou a
Folha, Lula disse a Bento 16 o
que o Itamaraty já havia deixado claro aos negociadores do
Vaticano: o texto original não
seria aceito, mas talvez um outro, à época já em negociação.
Lula apresentou contraposta
enxuta por avaliar que alguns
pedidos do Vaticano contrariavam a separação entre Estado e
igreja. Também considerou
que dar privilégios aos católicos
desagradaria a outras religiões.
Na negociação, foram aceitos
pontos sem polêmica: reconhecimento da personalidade jurídica da Igreja Católica; isenção
fiscal e benefícios tributários já
previstos na lei brasileira; empenho para o planejamento urbano ter espaços para fins religiosos, e cooperação para preservar "patrimônio histórico,
artístico e cultural" da igreja.
Por recomendação do Itamaraty e de ministérios, a contraproposta rejeitou acabar com
eventual vínculo empregatício
da Igreja com padres e fiéis que
fazem trabalho voluntário. Recusou regras para doações serem abatidas do Imposto de
Renda. Negou livre acesso de
missionários a áreas indígenas
e ensino religioso católico facultativo nas escolas públicas.
Algumas reivindicações foram atendidas parcialmente.
Exemplos: estudar regras para
anular casamentos religiosos,
dar visto a estrangeiros em
missão pastoral e reconhecer
"títulos e qualificações acadêmicas de estudo universitário"
do Brasil e do Vaticano.
No atual estágio das negociações, falta a resposta do Vaticano à contraproposta, intitulada
"Acordo Brasil-Santa Sé sobre
o Estatuto da Igreja Católica no
Brasil". Essa resposta deve ser
dada em breve. Se for positiva,
Lula assinará o acordo em visita ao papa nos próximos meses.
Do contrário, o petista tentará
acerto até o fim do mandato.
Nos 24 artigos da proposta
do Vaticano, reduzidos a 21 na
contraproposta brasileira, não
há menção ao aborto, apesar de
o tema ter despertado polêmica
na visita do papa.
O acordo é institucionalização jurídica das relações Brasil-Santa Sé, o que não existe atualmente. O Vaticano, estado reconhecido pela ONU, tem tratados semelhantes com cerca
de 70 países, como Venezuela e
Israel. Para Lula, concessão política moderada é conveniente.
Em sua proposta, o Vaticano
quis fixar a regra para os fiéis
com um adendo: assinar "espontaneamente" um "contrato
regular de voluntariado" no
qual renunciariam "a qualquer
direito por serviço às instituições eclesiásticas". Na contraproposta, o Brasil diz que o vínculo dos padres e fiéis é de "caráter religioso, observado o disposto na legislação trabalhista
brasileira". Ou seja, se um sacerdote ou fiel recorrer à Justiça do Trabalho e tiver ganho de
causa, paciência. Em relação ao
"contrato regular de voluntariado", o Brasil o recusou por
inteiro, seguindo recomendação do Ministério do Trabalho.
O Vaticano reivindicou que
"donativos feitos à Igreja Católica e às demais pessoas jurídicas eclesiásticas para suas atividades pastorais, caritativas, sociais, culturais e educativas poderiam constar como doações a
serem deduzidas do Imposto
de Renda devido". Propunha
que negociação à parte estabelecesse "limites de tais donativos e as formas de se fazer prova delas". O Ministério da Fazenda recomendou negativa.
O Brasil não acatou pedido
para "ministros e agentes pastorais credenciados pela autoridade eclesiástica" terem "livre acesso às áreas reservadas
aos indígenas". A Constituição
proíbe. E religiosos entram
nessas áreas por conta e risco.
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