São Paulo, domingo, 15 de julho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Lula quer acordo moderado com Vaticano

Governo defende tratado diplomático, mas fez contraproposta a pontos enviados antes da visita do papa Bento 16 ao país

Se for fechado, tratado é a institucionalização jurídica das relações do Brasil com o Vaticano, algo que acontece hoje com cerca de 70 países

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende assinar acordo diplomático com o papa Bento 16. Para tanto, desidratou a proposta enviada pela Santa Sé antes da visita do papa ao Brasil em maio passado e negocia novo documento.
Em maio, como antecipou a Folha, Lula disse a Bento 16 o que o Itamaraty já havia deixado claro aos negociadores do Vaticano: o texto original não seria aceito, mas talvez um outro, à época já em negociação.
Lula apresentou contraposta enxuta por avaliar que alguns pedidos do Vaticano contrariavam a separação entre Estado e igreja. Também considerou que dar privilégios aos católicos desagradaria a outras religiões.
Na negociação, foram aceitos pontos sem polêmica: reconhecimento da personalidade jurídica da Igreja Católica; isenção fiscal e benefícios tributários já previstos na lei brasileira; empenho para o planejamento urbano ter espaços para fins religiosos, e cooperação para preservar "patrimônio histórico, artístico e cultural" da igreja.
Por recomendação do Itamaraty e de ministérios, a contraproposta rejeitou acabar com eventual vínculo empregatício da Igreja com padres e fiéis que fazem trabalho voluntário. Recusou regras para doações serem abatidas do Imposto de Renda. Negou livre acesso de missionários a áreas indígenas e ensino religioso católico facultativo nas escolas públicas.
Algumas reivindicações foram atendidas parcialmente. Exemplos: estudar regras para anular casamentos religiosos, dar visto a estrangeiros em missão pastoral e reconhecer "títulos e qualificações acadêmicas de estudo universitário" do Brasil e do Vaticano.
No atual estágio das negociações, falta a resposta do Vaticano à contraproposta, intitulada "Acordo Brasil-Santa Sé sobre o Estatuto da Igreja Católica no Brasil". Essa resposta deve ser dada em breve. Se for positiva, Lula assinará o acordo em visita ao papa nos próximos meses. Do contrário, o petista tentará acerto até o fim do mandato.
Nos 24 artigos da proposta do Vaticano, reduzidos a 21 na contraproposta brasileira, não há menção ao aborto, apesar de o tema ter despertado polêmica na visita do papa.
O acordo é institucionalização jurídica das relações Brasil-Santa Sé, o que não existe atualmente. O Vaticano, estado reconhecido pela ONU, tem tratados semelhantes com cerca de 70 países, como Venezuela e Israel. Para Lula, concessão política moderada é conveniente.
Em sua proposta, o Vaticano quis fixar a regra para os fiéis com um adendo: assinar "espontaneamente" um "contrato regular de voluntariado" no qual renunciariam "a qualquer direito por serviço às instituições eclesiásticas". Na contraproposta, o Brasil diz que o vínculo dos padres e fiéis é de "caráter religioso, observado o disposto na legislação trabalhista brasileira". Ou seja, se um sacerdote ou fiel recorrer à Justiça do Trabalho e tiver ganho de causa, paciência. Em relação ao "contrato regular de voluntariado", o Brasil o recusou por inteiro, seguindo recomendação do Ministério do Trabalho.
O Vaticano reivindicou que "donativos feitos à Igreja Católica e às demais pessoas jurídicas eclesiásticas para suas atividades pastorais, caritativas, sociais, culturais e educativas poderiam constar como doações a serem deduzidas do Imposto de Renda devido". Propunha que negociação à parte estabelecesse "limites de tais donativos e as formas de se fazer prova delas". O Ministério da Fazenda recomendou negativa.
O Brasil não acatou pedido para "ministros e agentes pastorais credenciados pela autoridade eclesiástica" terem "livre acesso às áreas reservadas aos indígenas". A Constituição proíbe. E religiosos entram nessas áreas por conta e risco.


Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Janio de Freitas: O monumento
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.