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LAR, DOCE LAR
Casa paga R$ 3.000 de auxílio-moradia para 316 deputados; 236 apartamentos funcionais ficam vazios
Câmara desperdiça dinheiro com moradias
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A concessão pela Câmara dos
Deputados de auxílio-moradia
para os parlamentares em Brasília
vem se transformando em uma
fonte de desperdício de recursos
públicos. A Casa paga auxílio-moradia de R$ 3.000 ao mês para
316 dos 513 deputados, apesar de
manter, hoje, 236 apartamentos
funcionais vazios, o que resulta
em um gasto duplo: um com a
ajuda em dinheiro e outro com a
manutenção dos apartamentos
-estimado em cerca de R$ 1.500
mensais com cada um.
O desperdício ocorre da seguinte forma. Ao ser eleito, o deputado
escolhe entre as três opções de auxílio: 1) habitar um dos 432 apartamentos funcionais da Câmara;
2) alugar uma moradia por conta
própria e ser reembolsado em até
R$ 3.000; 3) receber o valor sem a
necessidade de comprovação
(descontado o Imposto de Renda,
dá R$ 2.175 líquidos).
Com isso, apenas 45%, ou 196
dos 432 apartamentos funcionais,
foram ocupados. Os outros 316
deputados optaram pelos R$
3.000 de auxílio. Ao ano, a Câmara gasta R$ 11,4 milhões com o repasse em dinheiro e mais R$ 4,2
milhões só com a manutenção
dos apartamentos desocupados.
Salário bruto
Vale ressaltar que o salário bruto dos parlamentares é de R$
12.720 ao mês, além de outras verbas relativas ao mandato, mais os
salários extras das convocações
extraordinárias. A média de aluguel de um apartamento de três
quartos no Plano Piloto de Brasília gira em torno de R$ 1.500.
Além do gasto duplo, a prática
de conceder auxílio moradia em
dinheiro dá margem para que
parlamentares usem a verba para
fins que não o de alugar uma casa,
apartamento ou de se hospedar
em um hotel.
Uma dessas práticas era comum
nas legislaturas passadas, principalmente entre petistas.
Ela consistia no fato de um ou
mais deputados morarem no
mesmo apartamento funcional
-o que se costuma designar pelo
nome "república". O titular não
recebia o auxílio, mas os colegas
não perdiam o direito à ajuda. O
presidente Luiz Inácio Lula da Silva dividiu o apartamento com o
hoje ministro Olívio Dutra (Cidades). O presidente da Câmara,
João Paulo Cunha (PT-SP), e pelo
menos dois outros ex-deputados
que hoje são ministros (leia texto
nesta página) utilizaram-se do
mesmo expediente.
Grandes demais
Vários são os argumentos apresentados pelos que optam pela
ajuda em dinheiro. O principal
deles é que os funcionais são
grandes demais e, por serem antigos, estariam com problemas de
infra-estrutura. Além disso, argumentam que eles foram pensados
em uma época em que os deputados se mudavam com as famílias
para Brasília, o que não ocorreria
com tanta frequência hoje.
"O funcional tem uma metragem que me faria sentir no deserto. Eles foram feitos em uma época em que as famílias vinham para
cá, é uma coisa ultrapassada",
afirma o deputado Walter Feldman (PSDB-SP), que optou por
morar em um flat.
Cada apartamento tem 225 metros quadrados, três quartos, e faz
parte de blocos que foram construídos há mais de 30 anos. Além
disso, ao morar em um flat ou hotel, por exemplo, o deputado usufrui por conta da Câmara de serviços -como café da manhã, lavanderia e faxineira- que teria
que pagar do próprio bolso se optasse em morar nos funcionais.
João Paulo estuda uma forma
de reformar os imóveis e tornar a
ocupação de todos obrigatória,
diminuindo o gasto com o auxílio
em dinheiro. Não há, porém, previsão para que isso ocorra.
Na legislatura passada, estudou-se a idéia de vender os apartamentos. De acordo com o deputado Ciro Nogueira (PFL-PI), responsável na Mesa da Casa pela
administração dos imóveis, a
idéia agora é manter os apartamentos e reformar pelo menos
uma parte deles. Segundo ele, o
valor de venda cresceria 100% (de
R$ 400 mil por unidade para cerca
de R$ 800 mil, reformados).
O próprio deputado não mora
em um funcional. Ele argumenta
que está na fila esperando a reforma em um deles.
Caso todos os imóveis precisem
passar pela reforma, o custo estimado pela Câmara chega a R$ 68
milhões (cerca de R$ 160 mil por
apartamento, mais a recuperação
dos prédios como um todo). "Se a
gente conseguir transmitir para a
sociedade que isso é uma coisa
boa, tudo bem. Mas, se chegar
amanhã e tiver a imagem de que é
uma questão de mordomia, não
dá", afirmou Nogueira.
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