São Paulo, sexta-feira, 15 de setembro de 2006

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Renata Lo Prete

"Forward" para 2010

A CRISTALIZAÇÃO prematura do favoritismo de Lula fez o tempo avançar. Embora o calendário indique duas semanas e seis programas de TV até a eleição, o mundo habitado pelos políticos já vive o dia seguinte, o ano seguinte e, naturalmente, 2010.
Analistas de risco não ouvem mais, de clientes com interesses no Brasil, perguntas sobre o desfecho da disputa. As dúvidas dizem respeito ao que virá no segundo mandato.
O presidente trata apenas do futuro nas conversas com o PMDB. O ministro Tarso Genro faz o mesmo ao propor "concertação", enquanto participa, na condição de postulante, do início da batalha interna pela vaga do PT na primeira cédula presidencial sem Lula em mais de duas décadas.
Também Fernando Henrique Cardoso, com sua carta, mira os próximos quatro anos. Tenta modelar um PSDB de genuína oposição, em resposta à corte de Lula a Aécio Neves e, de maneira mais ampla, ao perigo de desagregação decorrente da perspectiva de derrota.
Até mesmo Geraldo Alckmin, o mais prejudicado pela lógica do dia seguinte, cuja premissa é que o jogo estaria decidido, não descuida totalmente do pós-eleição. Cola em Aécio porque Minas Gerais, pelo tamanho do eleitorado e popularidade do governador, é dos poucos Estados que ainda podem viabilizar um segundo turno. Mas cola também pela necessidade de amparo futuro. À deriva, Alckmin corre o risco de se tornar uma espécie de Fredo Corleone do tucanato, pescando no meio do lago enquanto reza a Ave-Maria final.
Sempre cabe a ressalva de que um movimento combinado de cinco pontos a menos para Lula e o mesmo tanto a mais para o conjunto de seus adversários criaria um cenário em que "pode dar jacaré", nas palavras de um petista experiente e precavido.
O tempo, porém, é curto. E o ganho de Alckmin, até agora, não se deu à custa de perda significativa para Lula. Se não houver alguma transferência direta, adeus segundo turno.
O "fast forward" para 2010 ilustra o descompasso entre a luta política e a disputa eleitoral. A primeira mobiliza os atores acima citados -entre outros-, a imprensa e uma parcela minoritária do eleitorado. A segunda é decidida por uma maioria de eleitores que forma sua decisão por critérios que normalmente passam ao largo da luta política.
De uma perspectiva estritamente eleitoral, o manifesto de FHC veio em péssima hora para Alckmin. Equivaleu a uma admissão prévia de derrota. Mas, do ponto de vista da luta política, o lançamento da carta faz todo o sentido, o que a ira dos petistas só vem confirmar.
Na entrevista à Band, Lula pronunciou duas vezes o nome de Fernando Henrique quando indagado sobre as críticas do antecessor. Quem o conhece sabe que isso não é pouco.


RENATA LO PRETE é editora do Painel

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