São Paulo, quarta, 15 de outubro de 1997.



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MEMÓRIA
Lincoln Gordon, embaixador norte-americano em 1964, escreve um livro sobre o Brasil
Saiba quem foram os personagens da relação entre os EUA e Jango

do colunista da Folha

Conheça os personagens da par ticipação norte-americana no gol pe de 64:

João Goulart: Tinha 45 anos em 1964. Assumiu a Presidência em 1961, depois da renúncia de Jânio Quadros.
Lançado na política por Getúlio Vargas, formou sua base nos sindi catos e na máquina da Previdência Social. Nos últimos meses de 1963, infletiu seu governo para a esquer da. Teve cinco ministros da Fazen da (com uma média de permanên cia no cargo de seis meses) e acele rou a inflação.
Surpreendido pelo golpe, não lhe deu combate e quatro dias de pois se exilou no Uruguai. Era um rico fazendeiro e tentou regressar discretamente ao Brasil em diver sas ocasiões. Os generais avisa ram-no que, se o fizesse, seria pre so. Até 1976 negavam-lhe até mes mo o passaporte.
Era cardíaco e morreu numa de suas fazendas, na Argentina, em 1976. Está enterrado em São Borja (RS), a poucos metros de Vargas.
Lyndon Johnson: Assumiu a Pre sidência dos Estados Unidos em outubro de 1962, depois do assas sinato de John Kennedy.
Herdou de seu antecessor uma política que previa a possibilidade de um golpe militar no Brasil. Sua presidência foi engrandecida pelo esforço para acabar com a discri minação racial e pelas iniciativas que tomou na área social.
Destruiu-se porque aprofundou a intervenção americana no Viet nã. Diante das manifestações po pulares contra a guerra, desistiu da reeleição. Morreu em 1973, achan do que as caixas com gravações de suas conversas telefônicas só se riam abertas em 2.023.
Lincoln Gordon: Professor da Universidade de Harvard, foi man dado por Kennedy para a embaixa da no Rio dentro do mesmo espíri to que levou o economista John Kenneth Galbraith à Índia. Tinha 50 anos e um passado de prodígio.
Entrou na universidade aos 17 anos, graduou-se aos 20 e aos 23 concluiu sua tese de doutorado em Oxford, para onde foi com a mes ma bolsa de estudos que anos de pois beneficiou Bill Clinton.
Chegou ao Brasil quando Jango já estava no governo. Aprendeu a falar fluentemente o português e circulava com absoluta desenvol tura. Depois da queda de Jango, atribuíram-lhe tamanha influência que se tornou perseguido por uma piada: "Chega de intermediários, Gordon para presidente".
Aos 84 anos, é viciado em tênis e capaz de se lembrar o nome do fil me que viu na tarde do dia 28 de março de 1964: "Lawrence da Ará bia", no cinema Vitória. É pesqui sador do Brookings Institution, um renomado centro de pesquisas de Washington, e está escrevendo o sexto capítulo de um livro sobre o Brasil.
Vernon Walters: Alto, desengon çado e fluente em nove idiomas (inclusive português), tinha 45 anos e era o adido militar america no no Rio em 1964. Chegou ao Bra sil em 1963, contra sua vontade.
Tinha sido o oficial de ligação en tre o comando americano e a Força Expedicionária Brasileira na Itália. Era amigo do general Castello Branco e tratava os mais podero sos generais brasileiros de "você" (inclusive os janguistas, cuja ami zade procurou preservar).
Depois que deixou o Brasil, viveu incríveis aventuras. Escondia em seu apartamento de Paris o secre tário de estado Henry Kissinger quando ele negociava secreta mente a paz do Vietnã. Em 1973, como subchefe da CIA (Central In telligence Agency), recusou-se a falsificar uma cobertura que pode ria vir a paralisar as investigações do Caso Watergate. Disso resultou um processo que terminou na de posição de seu amigo Richard Ni xon da Presidência dos EUA.
Teve o supremo prazer do anti comunista: assistiu a queda do Muro de Berlim como embaixador na Alemanha. Vive hoje entre Palm Beach e Washington. Na semana passada, estava na China.
Herbert Okun: Chegou ao consu lado americano em Belo Horizonte com 33 anos, no final de 1963. Um ano antes, vivera em Moscou a cri se dos mísseis soviéticos instala dos em Cuba. Foi o tradutor de to da a correspondência secreta man tida pelo presidente Kennedy com o líder soviético Nikita Kruschev.
Morava na rua Tomé de Souza com a mulher, dois filhos e uma coleção de discos de Vinícius de Moraes e do Quarteto em Cy que guarda até hoje. Em 1965, foi pro movido e chefiou a representação americana em Brasília. Mais tarde, foi o vice-embaixador americano nas Nações Unidas. Está aposenta do, vive em Nova York e mantém sua fluência em português.
Niles Bond: O cônsul americano em São Paulo em 1964 já morreu. Continuou no posto até 1968 e se aposentou anos depois. Era ho mem de maneiras gentis e hábitos elegantes. Dedicou-se a escrever poesias. Seus telegramas tinham um certo estilo.
Na noite de 31 de março, infor mou ao Departamento de Estado: "São Paulo está calma nesta noite, sem qualquer sinal de que a hora da luta pela sobrevivência demo crática do Brasil pode ter chega do".
Robert Dean: Chefiava a repre sentação da embaixada em Brasí lia. Casado com uma sobrinha do deputado Herbert Levy, transitava bem no Congresso e frequentava jornalistas.
A certa altura, chegou a acreditar que o golpe tinha virado pizza. Tornou-se chefe da seção brasilei ra no Departamento de Estado e mais tarde foi nomeado embaixa dor no Chile.
Magalhães Pinto: Governador de Minas Gerais à época do golpe, foi uma das maiores raposas da políti ca mineira. Queria ser presidente da República, chegou a ministro das Relações Exteriores, mas nun ca superou a antipatia que os mili tares nutriam por sua astúcia.
Era dono do Banco Nacional. Vi veu os últimos anos entrevado por um derrame cerebral e morreu em março do ano passado, depois do estouro da empresa.



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