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CELSO PINTO
O paradoxo dos juros
Existe um paradoxo no esforço de reduzir os juros, reforçado pelo pacote anunciado ontem pelo Banco Central. Hoje
já é mais barato uma empresa
de porte lançar um papel aqui
do que buscar dólares lá fora.
É uma boa notícia, mas significa que as empresas vão rolar menos bônus internacionais que estão vencendo. Isso
aumenta a saída de dólares e
pressiona o câmbio.
Quanto maior a cotação do
dólar, maior o receio de que ela
pressione a inflação. E, quanto
maior esse temor, mais altos
serão os juros de prazos mais
longos, eliminando o efeito da
redução dos juros de curto prazo.
Onde está o erro?
Não existe um equívoco e sim
um dilema. A combinação entre sobrevalorização cambial e
juros internos estratosféricos,
do regime cambial anterior, fez
o Brasil dobrar seu passivo externo nos últimos anos, para
algo em torno de 50% do PIB.
Com a desvalorização e o
câmbio flutuante, o Brasil, a
exemplo do que aconteceu na
Ásia, está fazendo o caminho
de volta. O país está reduzindo
sua vulnerabilidade externa,
melhorando a balança comercial, o déficit em conta corrente
e, em consequência, diminuindo a necessidade de dólares.
Ao contrário da Ásia, contudo, onde o ajuste veio acompanhado por uma fortíssima recessão, no Brasil a recessão foi
suave. Em consequência, o
ajuste das contas externas tem
sido mais lento do que o da
Ásia. É ótimo que uma forte recessão tenha sido evitada, mas
isso quer dizer que o período de
transição até um novo equilíbrio será maior.
Daí surgem as pressões que
têm resultado numa cotação
que teima em ficar em torno de
R$ 1,95 por dólar. Um grande
banco prevê que sairá US$ 1 bilhão este mês em vencimento
de papéis externos. Além disso,
a conta corrente (balança comercial mais serviços) deve ficar negativa em US$ 200 milhões. Quer dizer, a pressão de
saída será de US$ 1,2 bilhão.
A forte entrada de investimentos diretos externos vinha
ajudando a manter uma entrada de dólares razoável. É
natural, contudo, que esse fluxo diminua nos últimos meses
do ano, como já têm sentido alguns grandes bancos.
Se o Banco Central não entra
no mercado oferecendo dólares
ou títulos indexados e a entrada de investimentos diretos é
menor, então o buraco terá
que ser coberto pelos bancos
privados (aumentando a posição vendida), por aumento de
linhas comerciais ou por captação das empresas. Nenhuma
dessas alternativas tem sido
abundante.
Alguns bancos voltaram a
emitir bônus no exterior, basicamente para lucrar com a diferença entre o custo de captação externa e a aplicação em
títulos do governo indexados
ao dólar. A margem de lucro,
contudo, hoje é estreita e só
compensa para bancos maiores.
Para as empresas, é diferente. Se um grande banco consegue captar a algo entre 10% e
10,5% em dólares, para uma
boa empresa o custo vai a
11,5%, lembra um banqueiro.
Somando o custo do Imposto
de Renda, sobe a 13,5%.
O custo final, contudo, dependerá da variação cambial e
esse é um risco alto demais para correr. O custo de fazer um
seguro, um "hedge", para eliminar o risco do câmbio é dado pela diferença entre a remuneração em reais e em dólares aqui. Para seis meses, o
BC vendeu títulos indexados
ao dólar a 12% de juros e internos a 22%.
Essa diferença, o custo do
"hedge", eleva o custo final da
captação da empresa para algo
perto de 24%, calcula. Se essa
empresa preferir emitir aqui
um "commercial paper", vai
pagar cerca de 105% do custo
do CDI ou uns 20%.
Conclusão: vale mais a pena
captar em reais, para capital
de giro, do que em dólares.
Captação em dólares só para
prazos mais longos, para investimentos produtivos.
É ótimo que seja assim. Diminui o volume de dólares instáveis de curto prazo e cai o endividamento externo. Não é
por outra razão que o BC está
projetando que, no próximo
ano, o valor das amortizações
será US$ 25 bilhões menor do
que o deste ano. O pagamento
de juros externos, obviamente,
também cai.
A curto prazo, contudo, aumenta a pressão sobre o câmbio e a incerteza inflacionária
eleva os juros de longo prazo. A
taxa básica, hoje, está em 19%,
mas os juros de um ano vão a
26%.
Pode-se argumentar que,
quando a melhora da balança
comercial se consolidar, a conta corrente melhorar, as amortizações e juros caírem, talvez
daqui a alguns meses, a pressão vai se reverter, o real vai se
valorizar e a pressão inflacionária será dissipada. Tomara,
mas o risco é a pressão da transição virar, de fato, mais inflação, mais juros e piores expectativas. Esse é o dilema do BC:
como administrar a transição.
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