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JANIO DE FREITAS
Lula sem jabuticabas
O aparente bom humor
de Luiz Inácio Lula da Silva não conseguiu esconder seu
desejo de desabafo, na instalação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, em
relação a dois aspectos de um
mesmo tema: a perplexidade
com a crescente adesão do governo à política de Malan/FMI e
as críticas. Não as críticas no PT,
já caladas a muque. As de jornalistas, sejam à política econômica ou à composição do Conselho.
A impropriedade das críticas
ao aumento de juros e ao corte
nas recursos para investimento
e até para fins sociais, a ponto
de transgredir a Constituição,
coube em pequena frase de Lula: "Recebemos o país em situação gravíssima". Não há dúvida. Mas, se o país estivesse maravilhoso, o povão, em vez de
eleger Lula, pediria um terceiro
mandato para Fernando Henrique Cardoso. Logo, a frase faz
sentido, mas explica o resultado
eleitoral e o próprio Lula, não a
sua política econômica.
Parece haver um grande mal-entendido. A rigor, o acréscimo
de 0,5% a juros já nos 25%, ato
sinalizador da política econômica, foi, por si mesmo, tão inútil como administração, quanto
o foi como fundamento para a
crítica. Seu valor simbólico, porém, foi muito forte. E o que o
governo não entendeu antes,
nem percebeu ainda, é a razão
do valor simbólico de seu ato.
O estado de espírito subjacente à montagem da equipe econômica foi transmitido e percebido, mesmo que não racionalizado, com muita clareza: o governo vinha atemorizado ante a
tarefa de governar. A percepção
ficou igualmente nítida no alívio dos que temiam um governo
Lula e no pasmo dos que esperavam mudança. De lá para cá, as
palavras e atos só confirmaram
a intuição oferecida.
O próprio Lula, passado o primeiro mês em silêncio sobre esses assuntos constrangedores,
aborda-os de modo que não deixa dúvida: "Se tivéssemos escolhido um petista para o Banco
Central, talvez o mercado reagisse mal e o dólar explodisse,
para cinco, seis reais".
Não podia ser mais claro, na
confirmação de que o presidente
e o seu governo assumiam sem
olhar "o mercado" nos olhos, reverentes diante dele. Antecipadamente. Como se um governo
não dispusesse de instrumentos
para prevenir ou deter ataque
especulativo e intimidador. O
fato de que o governo anterior
tenha consentido em tantos ataques, criados aqui ou vindos de
fora, não significa impotência
governamental, mas escolha de
política econômica.
O contraste que se observa é
interessante, triste embora. De
uma parte, a felicidade transbordante de ser governo, os braços do povão estendidos em carinho, a festa que não acaba no
tempo nem no espaço. De outra,
a insegurança de ser governo, o
encolhimento, o recuo, o temor
do risco, o medo de ser.
Ainda na instalação do Conselho, que é a primeira inovação
verdadeira do seu governo, Lula
fez sucesso com a história de
dois pés de jabuticaba. O que
plantou devidamente em um
terreno, sem obter jabuticabas
em 15 anos, e o que sua mulher
plantou em um vaso dentro do
apartamento, contrariando o
convencional e o marido, que ficou, "como muitos ficam, resmungando e dizendo que era
impossível". Mas, "como ela
acreditou mais, irrigou mais,
cuidou mais do que eu, o pezinho de jabuticaba do apartamento dá frutos quatro ou cinco
vezes por ano".
Mais do que a pretendida convocação às disposições dos conselheiros, a fábula de Lula se
volta contra o autor, e o adverte
de que continua preferindo
plantar segundo as regras encontradas. E "resmungando e
dizendo que é impossível" fazer
diferente.
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