São Paulo, quinta-feira, 16 de maio de 2002

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SOMBRA NO TUCANATO

Relatório de comissão cita operações fraudulentas

Corretora de Ricardo Sérgio lesou fundo, aponta CVM

ANDREA MICHAEL
WLADIMIR GRAMACHO


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em 1996 e 1997, quando ainda pertencia ao economista Ricardo Sérgio de Oliveira, a corretora RMC lesou o fundo de pensão da Embrapa (Ceres), ao assessorá-lo em investimentos feitos na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), segundo relatório da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), obtido pela Folha.
Ricardo Sérgio foi arrecadador de fundos na campanha do presidenciável tucano José Serra, quando ele candidatou-se ao Senado, em 1994. No ano seguinte, contou com o apoio de Serra para tornar-se diretor do Banco do Brasil, cargo que ocupou até 1998.
A investigação da CVM, concluída no dia 31 de janeiro deste ano, descobriu que a RMC e outras cinco corretoras utilizaram "operações fraudulentas" para obter lucro de R$ 17,3 milhões em investimentos da Ceres. O próprio fundo de pensão, que tem 12 mil participantes e patrimônio de R$ 940 milhões, ficou com apenas R$ 5,2 milhões nos investimentos realizados pelas corretoras.
A fraude descoberta pela CVM tem semelhanças com os desvios cometidos no Banpará que resultaram na renúncia do senador Jader Barbalho, em 2001. Nos anos 80, Jader complementou aplicações do Banpará e, depois, apropriou-se dos rendimentos, segundo apurou a fiscalização do Banco Central (BC).

Rendimentos
Nos investimentos da Ceres, as seis corretoras e alguns de seus sócios e funcionários também investiram valores pequenos nas negociações e retiraram altos rendimentos. Uma das 3.533 operações analisadas pela CVM ajuda a entender a fraude.
No dia 9 de janeiro de 1997, a Ceres investiu R$ 3,875 milhões em ações Telebrás ON, utilizando os serviços da RMC. No mês seguinte, em 12 de fevereiro de 1997, as ações foram vendidas. O lucro da Ceres somou R$ 155 mil, ou 4% do valor aplicado.
Dois sócios da RMC e um funcionário, atuando como pessoas físicas, também participaram do negócio. Lucraram muito mais do que o fundo de pensão.
Ricardo Cavalieri, que já deixou a sociedade na corretora, aplicou R$ 66 mil. Recebeu, segundo a CVM, R$ 583,3 mil, um rendimento de 884%.
Henrique Molinari, atual presidente da RMC, investiu R$ 45 mil. Obteve R$ 66,3 mil, com rentabilidade de 147%. O operador José Penna, ainda funcionário da RMC, aplicou R$ 1.500. Retirou R$ 13,4 mil. Rendimento de 893%.
"Evidente está que a operação envolvendo a Ceres foi estruturada visando proporcionar rendimentos, inicialmente, aos diretores da RMC Ricardo Cavalieri e Henrique Molinari, os quais foram suas contrapartes no mercado de opções", diz o relatório da Comissão de Valores Mobiliários.
Segundo o texto, a negociação "proporcionou aos referidos comitentes [RMC, Cavalieri e Molinari" significativos resultados, por ocasião da reversão da operação de tais opções".
As operações de mercado executadas pela RMC, com dinheiro da Ceres, deram à própria corretora, a seus sócios e funcionários lucros que somaram R$ 1,430 milhão, segundo a CVM.
O então sócio e diretor Ricardo Cavalieri foi o que mais ganhou: embolsou R$ 1,040 milhão.
A RMC ficou com R$ 275 mil; Henrique Molinari, com R$ 67 mil; o funcionário José Penna e sua mulher, com R$ 45 mil; e a Agropastoril Ricci, empresa ligada à corretora, com R$ 1 mil.
O relatório da CVM concluiu que a RMC cometeu "operações fraudulentas" e criou "condições artificiais de demanda, oferta e preço de valores mobiliários", ao negociar ações para a Ceres.
E não foi a única vez. No mesmo documento, a comissão de inquérito da CVM fez questão de lembrar que a corretora RMC já havia sido notificada por "irregularidades nas operações com ações de emissão da Telesp e com opções dessas ações, tendo em contraparte o Instituto de Seguridade Social dos Correios e Telégrafos [Postalis], operações estas em tudo semelhantes às descritas neste relatório".



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