São Paulo, quarta-feira, 16 de outubro de 2002

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FOLCLORE POLÍTICO

O caso Moreira Alves - 2

RAPHAEL DE ALMEIDA MAGALHÃES

Íamos por meados de novembro de 1968. O presidente Costa e Silva recebe no Palácio Laranjeiras o deputado pela Arena Djalma Marinho, que lhe dá conta, lealmente, ser contra a concessão da licença para processar o deputado Marcio Moreira Alves -uma aberração constitucional. E, acrescenta, que sua posição é compartilhada por quase todos os deputados da Arena membros da Comissão de Justiça, por ele presidida -prenúncio de uma desmoralizante derrota do governo.
O presidente, com a franqueza que lhe era própria, declara ao deputado que não convocaria o Congresso Nacional, que entraria em recesso em 1º de dezembro, para votar o pedido de licença. A matéria, embora importante, não tinha densidade para justificar a convocação. Sua preocupação era recompor o diálogo Arena/governo. Pede, sem rodeios, a Djalma Marinho que colabore na tarefa de reintegrar o senador Daniel Krieger no comando da articulação. A conversa soou como música para o deputado. Djalma Marinho comunicou aos líderes a decisão do presidente.
Parecia desarmada uma bomba-relógio que tinha hora marcada para explodir -o momento da recusa do pedido de licença. O recesso jogava água na fervura.
O alívio foi geral. Menos para a corrente arenista mais governista que se comprometera com a concessão da licença e que não suportava ter sido vencida pela ala liberal do partido. Garantiram ao presidente ampla vitória do governo na votação da matéria, convencidos de que, na hora final, a ameaça do fechamento do Congresso intimidaria os mais rebeldes e a licença seria concedida.
O presidente Costa e Silva recuou e mandou avisar ao deputado Djalma Marinho que se vira forçado a convocar o Congresso com um único item em pauta -a votação do pedido de licença. Deu no que deu. A Arena substituiu toda a sua representação na Comissão de Justiça e ganhou a votação. Mas não pôde afastar o deputado Djalma Marinho, seu presidente e relator do processo de licença. Bastou a eloquência do deputado para derrotar o governo. A maioria da Arena em plenário, em votação secreta, negou o pedido de licença, sob a inspiração de Djalma Marinho, em cujo final, na apertada sala da comissão, elevou-se a voz tonitruante do deputado Britto Velho: "De pé para aplaudir o homem".


RAPHAEL DE ALMEIDA MAGALHÃES, 71, ex-governador da Guanabara e ex-ministro da Previdência do governo Sarney, escreve às quartas nesta seção


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