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São Paulo, domingo, 16 de novembro de 2003

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NA CORDA BAMBA

Jantar em Brasília reuniu ministros que podem deixar Esplanada

"Ameaçados" já articulam para garantir seus cargos

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Na noite de terça-feira, quatro ministros se reuniram num restaurante em Brasília e ergueram um brinde à ministra Benedita da Silva (Assistência e Promoção Social). Era um gesto de solidariedade, mas não só isso. Ministros ameaçados de perder os cargos na reforma ministerial -que somente virá depois das festas de Ano Novo- se movimentaram nos últimos dias para tentar permanecer na Esplanada.
Benedita da Silva é, até aqui, um dos principais alvos da reforma, destinada não apenas a acomodar dois ministros do PMDB, mas, pelo menos teoricamente, a tratar de dar mais eficiência à equipe de Luiz Inácio Lula da Silva.
As estratégias variaram. O ministro José Graziano (Segurança Alimentar) não acredita que possa ser afastado do governo. Ele aposta na amizade com Lula, com quem trabalha há 20 anos e troca idéias pelo menos duas vezes por semana em Brasília. E está tão certo de que permanecerá na equipe do presidente que prepara o planejamento estratégico do seu ministério para 2004.
"Estamos caminhando para construir uma política de segurança alimentar no Brasil, e o presidente só trabalhará para impulsionar isso", diz ele.
Outro candidato a deixar o posto na bolsa de apostas da reforma ministerial, o ministro dos Transportes, Anderson Adauto, busca o apoio até dos empreiteiros. Aos responsáveis por tocar as obras de recuperação das rodovias -maior vidraça do ministério-, Adauto acenou com a possibilidade de antecipar o pagamento de R$ 300 milhões da dívida deixada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso.
A conta pendente é apontada pela equipe de Adauto como o principal motivo da derrapagem inicial do ministro na pasta. Como a primeira parcela só foi quitada em agosto e setembro, as obras demoraram mais a sair do papel, estimulando as críticas a sua gestão.
A amigos, Adauto afirma que continuará apoiando o governo se tiver de reassumir em breve a cadeira de deputado federal. O suplente, Carlos Mota (PL-MG), diz que, como o ministro, está tranquilo: "Isso poderia acontecer, mais cedo ou mais tarde".

"Não acha nada"
Se Adauto fala abertamente da possibilidade de deixar o cargo, a colega Benedita da Silva evita tratar do assunto.
"A ministra não acha nada, a gente está trabalhando e muito", resumiu a assessora de imprensa.
O lugar reservado à agenda de Benedita no site do ministério manteve reticências no ar durante várias semanas, desde que ela voltou da viagem feita à Argentina para um encontro religioso e com a conta paga pelo contribuinte. "Era só um problema técnico", justificou a assessoria.
No jantar de adesão a R$ 33 por cabeça na noite de terça-feira, a ministra disse que continuaria servindo ao governo Lula, independentemente do cargo que ocupe. Ela insistiu em que não havia cometido nenhum erro, mas resolveu devolver o dinheiro da viagem "por amor ao governo", que não queria ver desgastado.
Nos demais discursos, os amigos disseram, em palavras diferentes, que a ministra não é apenas uma militante do PT, mas um símbolo, que o site do ministério resume assim: "Uma síntese da exclusão social do país: mulher, negra e favelada".
O jantar não foi registrado pelo cinegrafista especialmente contratado para acompanhar as atividades do ministério. Até agora, nenhuma cena foi levada ao ar.

Cacifes
José Fritsch (Pesca) colhe sinais de amizade do presidente para nutrir sua confiança em permanecer na pasta sem perder o status de ministro. "Conversamos muito nos fins de semana", contou.
A participação de Lula na Conferência Nacional de Pesca, no próximo dia 25, confia, será um sinal de prestígio do petista, que ganhou o cargo depois de ter perdido a disputa pelo governo de Santa Catarina.
Ele contabiliza visitas a comunidades pesqueiras e vários encontros estaduais entre seus feitos: "Fizemos tudo sem dinheiro, e o presidente tem elogiado isso", afirmou o Fritsch.
Na mesma linha de que trabalhar com pouco dinheiro é um mérito, o também petista Olívio Dutra (Cidades) considera bom seu desempenho num ano em que a pasta sofreu profundos cortes de verba. Olívio foi o autor da frase de que administrava um orçamento fictício.
Se, em 2003, o ministério já contou com pouco dinheiro, a previsão de gastos em 2004 é ainda mais amarga, quando considerados apenas os projetos contidos no Orçamento da União. Mas a equipe está otimista.
"O ministério vai marcar o governo quando estiver mais maduro", diz a secretária-executiva, Ermínia Maricato.
"Essa conversa de que o ministério não aparece é história de quem quer o cargo", completou.

Relevância
Muita relevância é o que a mais nova do time de ministros, Matilde Ribeiro, vê na secretaria de Promoção da Igualdade Racial. Até aqui, seu trabalho resume-se a duas palavras: debates e viagens.
Nas últimas três semanas, a ministra viajou à África duas vezes. Na primeira, para explorar o continente antes da visita do presidente Lula. Na segunda, para acompanhá-lo.
Foi lá que a Matilde combinou com Emília Fernandes (Políticas para as Mulheres) o jantar que homenageou a colega Benedita. Aconteceu na terça-feira porque, no dia seguinte, Emília pegou o avião para Montevidéu.
(MARTA SALOMON, LUCIANA CONSTANTINO, GABRIELA ATHIAS e IURI DANTAS)


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