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ELIO GASPARI
Ruiu a República Velha de Aécio e Serra
O acordo do PSDB com o governo resultaria numa traição que desmoralizaria o partido e seus senadores
OS GOVERNADORES Aécio Neves e José Serra transformaram um acordo e uma vitória
fechados na madrugada de quarta-feira em confronto e derrota na madrugada seguinte. Desprezaram o
prejuízo alheio e superestimaram a
própria desenvoltura.
Às três da manhã de quinta, o senador Arthur Virgílio saiu da casa do
presidente do PSDB, Sérgio Guerra,
com a disposição de aprovar a prorrogação da CPMF. Acabara de ouvir
do deputado Antonio Palocci o
compromisso do governo de jogar
todos os R$ 40 bilhões do imposto
na caixa da saúde. Esse caminho fora
defendido por Serra e Aécio nos últimos dias.
Sete dos 13 senadores tucanos
aceitavam a proposta do governo.
Eram votos suficientes para aprovar
a prorrogação do imposto. Em novembro, quando essa idéia partiu dos
senadores, o ministro Guido Mantega considerou-a inviável.
Na manhã seguinte, Arthur Virgílio viu passar pela memória as fisionomias dos senadores da base aliada
comprometidos a votar contra a
prorrogação. Tratava-se de levá-los
ao crematório, numa traição fria e
arrogante, das piores já ocorridas no
Congresso. Virgílio mudou de idéia,
ameaçou abandonar a liderança do
partido, e arrastou as fichas.
Outro fator, percebido pelo senador Jarbas Vasconcelos, foi o ostensivo predomínio dos governadores
numa decisão do Senado. Antes do
início da sessão da CPMF, Aécio Neves já comemorava o acordo e corria
para o abraço: "É uma vitória para o
país". Serra, discreto, era festejado
como o pai da fórmula.
Criara-se uma situação absurda.
Os senadores tucanos ficariam no
papel de adesistas que resistiram à
prorrogação do imposto e, na última
hora, roeram a corda, traindo os aliados. Já os governadores subiriam ao
pódio dos estadistas que dobraram
uma bancada de chatos irrelevantes
ou indisciplinados. Aécio, aproveitando em embalo, deu uma entrevista como pré-candidato a presidente.
Faltou combinar esse enredo com
os senadores que fariam o papel de
paspalhos diante de uma opinião pública hostil ao imposto. Arthur Virgílio poderia ameaçar a bancada com
mil renúncias ou mesmo atear fogo
às vestes e isso seria insuficiente para arrastar os votos de sua bancada.
Com um século de atraso, Aécio e
Serra tiveram o seu "Momento República Velha", uma época em que o
presidente mandava no Congresso a
partir de uma política de governadores que resultava numa dieta do café
de São Paulo com o leite de Minas
Gerais. Felizmente, o anacronismo
não ressuscitou.
O ORÇAMENTO PRECISA DE MORENGUEIRA
Dois dias antes do naufrágio da
CPMF, o deputado Giovanni Queiroz
(PDT-PA) obteve na Comissão de Orçamento do Congresso a possibilidade
de um corte de R$ 106,9 milhões nas
despesas previstas para obras de três
tribunais, da Procuradoria Geral do
Trabalho e do Conselho da Justiça Federal. Todas em Brasília.
O Sistema Nacional de Pesquisa de
Custos e Índices da Construção Civil, o
Sinapi, fixou em R$ 624,70 o custo do
metro quadrado construído na cidade.
(Esse valor sai do IBGE, num convênio
com a Caixa Econômica.) A cifra não
considera inúmeros custos, como elevadores, refrigeração e equipamentos
de segurança. Por isso, na sua pesquisa,
Giovanni Queiroz, "de forma exagerada", dobrou o valor, para R$ 1.249,40.
O metro quadrado do Tribunal Regional Federal está estimado em R$
2.967,55. Na sede do Tribunal Superior
Eleitoral, ele sai um pouco mais caro:
R$ 2.967,66. Queiroz sugere que levem
só a metade.
Se o Planalto e a oposição quiserem,
o deputado pode mostrar o caminho
das pedras para um corte que poderá
ultrapassar a casa do bilhão de reais.
Examinando uma amostra de 12 dotações de obras rodoviárias e ferroviárias, cujos custos divergiam bastante
dos valores de referência da Viúva, ele
acredita ter encontrado anomalias que
justificariam uma proposta de abatimento de R$ 610 milhões em despesas
orçadas em cerca de R$ 1 bilhão.
O governo rebate e diz que essa conta se baseia em estimativas rudimentares do custo do quilômetro, esquecendo o preço dos viadutos e de desapropriações. Nessa altura, Nosso Guia deveria invocar o espírito do sambista
Moreira da Silva, convocando parlamentares e sábios do Departamento
Nacional de Infra-Estrutura e Transportes, o Dnit, reencarnação do falecido DNER, para estudar cada uma dessas despesas. Fecharia a porta "enquanto dura o vai-não-vai" e tocaria o
"Piston de Gafieira":
"Quem está fora não entra,
Quem está dentro não sai"
A patuléia sabe que o custo de uma
obra rodoviária é coisa complexa, mas
de dez dotações orçamentárias, por
coincidência, duas estão com o mesmo
preço, redondo, de R$ 100 milhões.
(Uma na divisa da Paraíba com o Rio
Grande do Norte, com 25 km. Outra
entre Santa Catarina e o Rio Grande do
Sul, com 13 km.) Qualquer pessoa que
faz compras pode tentar lembrar
quantas vezes foi ao supermercado e
gastou exatamente R$ 100.
Em 1998, quando Giovanni Queiroz
dizia na Câmara que o juiz Nicolau dos
Santos Neto (Lalau, para os amigos),
estava assaltando a obra do TRT de São
Paulo, achavam que ele era exagerado.
EREMILDO EM BALI
Eremildo é um idiota e gosta
de fazer contas malucas. Ele
soube que a delegação brasileira na Conferência sobre Mudanças Climáticas, realizada
em Bali, teve 188 pessoas. Os
governadores do Amazonas
(Eduardo Braga) e Mato Grosso (Blairo Maggi, o Motosserra
de Ouro) formaram uma comitiva de 18 pessoas. O idiota foi
atrás da relação entre uma ida a
Bali e o desmatamento para o
plantio de soja. A comitiva dos
dois governadores da região
que mais sofre o desmatamento pode ter saído por US$ 225
mil. Segundo a Associação dos
Produtores de Soja de Mato
Grosso, são necessários 16 hectares de soja plantada para se
obter um lucro de US$ 1.000.
Assim, uma viagem como a de
Maggi e Braga pode ser custeada pelo desmatamento de
3.600 hectares de floresta. (Um
hectare equivale à área de um
campo de futebol.)
ÊXITO SOCIAL
O Metrô de São Paulo fechará o ano com uma média mensal de 40 milhões de passageiros/mês. Em 2005, essa marca
estava em 33 milhões. Hoje,
48% dos passageiros do Metrô
têm renda familiar de um a
quatro salários mínimos. É 1,1
milhão de pessoas por dia, contra 517 mil em 2005. Como o
Metrô não inaugurou novas linhas, essa mudança é atribuída
a dois fatores: primeiro, o aumento da renda das famílias.
Gente que fazia percursos a pé
está usando transporte público.
Além disso, desde 2005, o andar de baixo de São Paulo usufrui a integração das tarifas de
trens e metrô com os ônibus.
Falta pouco para a chegada
de 2008. Nele, conforme
promessa do governador Sérgio Cabral Filho, o Rio instituirá o bilhete único, que permite
duas viagens sucessivas com
uma só tarifa.
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