São Paulo, sábado, 17 de abril de 2004

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CAMPO MINADO

Declaração foi feita por Gilmar Mauro durante evento em São Paulo; no Sul, Stedile atacou o presidente Lula

"Ainda somos pacíficos", diz líder do MST

VIRGILIO ABRANCHES
DA REDAÇÃO

O coordenador nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) Gilmar Mauro afirmou ontem que acredita que o movimento, apesar da onda de invasões que tem promovido desde o mês passado, ainda é muito "pacífico" e "lento". Ontem, o MST completou 81 invasões no país desde 10 de março.
"Diante de tamanhas injustiças sociais que nós temos no país, nós ainda somos muito pacatos, lentos, até tranqüilos", disse Mauro em evento promovido por cinco deputados estaduais do PT paulista na Assembléia Legislativa do Estado. O encontro fez parte das comemorações do aniversário de 20 anos do MST, que foi fundado em janeiro de 1984.
"Outros países já viveram situação muito semelhante à nossa e chegaram até a viver guerras civis. O que nós queremos é fazer um alerta: ou se avança numa perspectiva de resolver os problemas sociais, ou o caos se estabelece. E nesse sentido eu acho que ainda somos pacíficos", disse Mauro.
O evento teve a participação de cerca de 250 pessoas, a maioria integrantes de acampamentos e assentamentos do MST.
Representando o governo, estavam o ex-ministro da Segurança Alimentar e atual assessor especial da Presidência, José Graziano, e o superintendente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) de São Paulo, Raimundo da Silva.
Durante o evento, o líder do MST evitou ataques ao governo e fez questão de frisar: "A "jornada de luta" não é contra o governo Lula. A "jornada de luta" é contra o latifúndio. Não temos a intenção de desestabilizar o governo".
No entanto, houve um ponto em que Graziano e Mauro entraram em choque. Foi quando foi abordado o papel do agronegócio no país, defendido pelo assessor do presidente Lula e atacado pelo líder do movimento.
"O setor exportador tem interesse em aumentar o mercado interno, em aumentar salários e postos de trabalho. Esse setor não é inimigo da reforma agrária. É um erro político e estratégico classificá-lo assim. Há espaço para a convivência", disse Graziano.
"O que aconteceria se aplicássemos o modelo do agronegócio de forma cega? (...) Vamos ampliar as favelas e os problemas sociais dos grandes centros urbanos. Esse modelo não comporta povo", retrucou Mauro.
Ao final, Graziano amenizou o problema: "Não creio que o MST veja o agronegócio como inimigo. Tenho certeza de que irá rever essas invasões indiscriminadas".
O assessor da Presidência também admitiu que o governo Lula enfrenta problemas para fazer a reforma agrária. E culpou o governo anterior. "O Incra não tem, hoje, as condições necessárias para fazer a reforma agrária. Foram dez anos de sucateamento do Incra. É o que está impedindo a reforma agrária que o presidente Lula gostaria de fazer." Depois, Graziano afirmou que o governo irá cumprir a meta de assentar 115 mil famílias neste ano.

Stedile ataca governo
Ao contrário de seu colega Gilmar Mauro, que evitou atacar a gestão Lula durante evento do MST, o coordenador nacional do movimento João Pedro Stedile, que no início do mês previu um "abril vermelho" no país, reforçou o tom crítico ao governo federal e ao presidente.
"Elegemos o Lula para mudar o país, e não para puxar o saco dos banqueiros", disse, para vibração de cerca de 300 integrantes e simpatizantes do MST que acompanhavam o discurso na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul.
De acordo com Stedile, "só um idiota não pede para mudar a política econômica". Ele ainda definiu a elite brasileira como "estúpida e nojenta". "Milhões de desempregados neste país pedem para ser explorados e nem isso eles [a elite] sabem fazer."


Colaborou LÉO GERCHMANN, da Agência Folha em Porto Alegre

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